As recentes eleições de meio de mandato nos EUA levantam diversas questões sobre problemas que ameaçam a integridade do nosso sistema eleitoral.
Por que estados como a Califórnia não contam os votos tão rapidamente quanto a Flórida? Por que a maior parte da votação não pode acontecer no dia das eleições, como em outras épocas? Será que sistemas novos, como a votação por ordem de preferência, prejudicam o processo democrático?
Nosso sistema eleitoral já está falido em vários estados. Dias depois das eleições, ainda não se sabia o resultado de muitas contendas cruciais, não porque estivessem acirradas, mas porque o processo de contagem era – e é – interminável. A Califórnia é o pior caso, mas outros estados, como Oregon, também são letárgicos.
Para um processo eleitoral justo e altamente eficiente, a Flórida é o modelo, o padrão-ouro de gestão eleitoral. É o terceiro estado mais populoso do país e, juntamente com o Texas, um dos que mais crescem. Mesmo assim, as cédulas estavam todas contadas horas após o encerramento das urnas. Sem alvoroço, sem grandes contestações nos tribunais.
A Flórida promulgou reformas importantes após o fiasco das eleições presidenciais de 2000, quando seus procedimentos desleixados e suas cédulas mal projetadas levaram a longos litígios e aos notórios problemas nos cartões perfurados. Depois disso, o estado alterou suas práticas, aprovando vários projetos de reforma.
Na Flórida, por exemplo, uma cédula de votação por correspondência deve ser recebida até as 19h do dia da eleição, ponto-final. Não há controvérsias com relação aos carimbos postais. A contagem dos votos por correspondência começa 22 dias antes e deve ser publicada dentro de 30 minutos após o encerramento das urnas. Alguns estados só iniciam a contagem no próprio dia da votação.
Além da contagem indesculpavelmente lenta na Califórnia e no Arizona, outro aspecto que se destaca, sobretudo desde a pandemia, é como o processo de votação se alongou e, impulsionado por medidas “temporárias” da pandemia, vem se estendendo ainda mais. Na verdade, a expressão “dia das eleições” é enganosa. Em alguns estados, a votação começa um mês ou mais antes desse dia e, dadas as regras específicas da votação por correspondência, só termina bem depois.
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Embora a votação antecipada por meio de votos por correspondência esteja arraigada em muitos estados, sua duração deveria ser reduzida para duas ou três semanas antes do dia das eleições. Além disso, os estados não deveriam enviar cédulas a todo mundo, como faz Nevada, porque isso é um convite para a fraude. As cédulas para votar por correspondência devem ser solicitadas de maneira específica.
Há uma outra tendência que escarnece da ideia de um candidato vencer por ter recebido mais votos do que seus oponentes: a votação por ordem de preferência. Nevada acabou de aprová-la. O Alasca e o Maine já a utilizam, assim como várias cidades. Nesse esquema esquisito, os eleitores não se restringem a votar em candidatos individuais; eles também classificam os outros candidatos de uma determinada disputa em ordem de preferência – segunda opção, terceira opção, e assim por diante.
Se ninguém recebe mais de 50% dos votos de primeira opção, o candidato com o menor número de votos é eliminado, e as escolhas de segunda opção nos votos dados ao candidato eliminado são redistribuídas. O processo continua até um candidato receber mais de 50%.
Isso fica bastante complicado para os eleitores quando há várias disputas na cédula.
No mundo real, o sistema de votação por ordem de preferência é muito antidemocrático. O Alasca, fortemente republicano, elegeu uma democrata para a Câmara dos Representantes, sendo que essa candidata teria levado uma surra em uma disputa direta.
Todas essas mudanças corroem o processo democrático.
Steve Forbes é presidente e editor-chefe da Forbes norte-americana. Escreve editoriais para todas as edições da versão impressa da Forbes, com reprodução na edição brasileira da revista, com o mote “Fato e Comentário”. Amplamente respeitado por seus prognósticos econômicos, ele é o único escritor a ganhar o prestigioso prêmio Crystal Owl Award quatro vezes.
Artigo publicado na edição 104 da revista Forbes, em dezembro de 2022.