O Banco Central sinalizou nesta terça-feira (27) que a maioria dos membros do Comitê de Política Monetária vê a possibilidade de iniciar um afrouxamento monetário “parcimonioso” na próxima reunião, em agosto, desde que um cenário de inflação mais benigno se consolide, enquanto uma minoria adotou uma postura mais cautelosa.
Segundo a ata do último encontro, divulgada nesta terça, houve uma divergência de opiniões em relação à sinalização dos próximos passos.
“A avaliação predominante foi de que a continuação do processo desinflacionário em curso, com consequente impacto sobre as expectativas, pode permitir acumular a confiança necessária para iniciar um processo parcimonioso de inflexão na próxima reunião”, apontou a ata.
De acordo com o BC, outro grupo mostrou-se mais cauteloso, enfatizando que a dinâmica desinflacionária ainda reflete o recuo de componentes mais voláteis e que a incerteza sobre o hiato do produto gera dúvida sobre o impacto do aperto monetário até então implementado.
“Para esse grupo, é necessário observar maior reancoragem das expectativas longas e acumular mais evidências de desinflação nos componentes mais sensíveis ao ciclo”, completou a ata.
A ata reafirmou ainda que os membros do Comitê foram unânimes em concordar que os passos futuros dependerão da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica; das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo; de suas projeções de inflação; do hiato do produto e do balanço de riscos.
Questionado por jornalistas sobre ata, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, respondeu que ainda precisa avaliar melhor o documento e, ao ser informado da indicação do BC sobre a reunião de agosto, respondeu apenas: “que bom”.
O BC decidiu deixar inalterada a Selic em 13,75% ao ano em reunião na semana passada, e manteve um tom duro ao avaliar o processo de desinflação no Brasil, frustrando o mercado ao não indicar intenção de cortar juros em agosto e provocando novas críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Mas, para Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, a “ata foi mais ‘dovish’ e indica que a visão ‘predominante’ do Copom é do início do corte na próxima reunião, considerando o cenário atual de queda da inflação e queda das expectativas”.
Leonardo Costa, economista da ASA Investments, concorda que o documento indicou que há consenso para o início do ciclo de queda de juros na próxima reunião, apostando em um início bastante gradual, com corte de 0,25 ponto percentual.
Mas o BC alertou ainda que flexibilizações do grau de aperto monetário exigem confiança na trajetória do processo de desinflação, afirmando que flexibilizações prematuras podem provocar reacelerações do processo inflacionário e, consequentemente, levar a uma reversão do próprio processo de afrouxamento monetário.
“A materialização desse tipo de cenário pode impactar negativamente não apenas a credibilidade da política monetária, mas também as condições financeiras”, disse.
A ata ainda repetiu que a conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento e por expectativas de inflação desancoradas, segue demandando cautela e parcimônia.
Nesta terça, o IBGE informou que o IPCA-15 ficou praticamente estável em junho graças à queda dos preços de combustíveis, e a taxa em 12 meses foi ao menor nível em quase três anos, o que deve intensificar os argumentos para o início do ciclo de corte de juros.
O BC também debateu a resiliência da atividade econômica no primeiro trimestre, mas segue com a visão de que o crescimento foi puxado pelo setor agropecuário e que os demais setores devem apresentar crescimento modesto ao longo do ano.
Metas
O BC voltará aos holofotes na quinta-feira, quando divulgará seu Relatório Trimestral de Inflação com novas projeções sobre a economia, mesmo dia em que o Conselho Monetário Nacional (CMN) se reúne para estabelecer a meta de inflação para 2026.
O mercado especula ainda sobre a possibilidade de o CMN determinar que o BC siga objetivo de inflação sem um prazo determinado. Atualmente, a autarquia trabalha com a meta por ano-calendário.
Segundo o BC, o questionamento sobre uma possível alteração das metas de inflação futuras são parte do motivo pelo qual as expectativas de inflação apresentaram algum recuo, mas seguem desancoradas. “O Comitê avalia que decisões que reancorem as expectativas podem levar a uma desinflação mais célere”, disse a ata.
O BC ressaltou ainda que o Copom discutiu também os impactos do cenário fiscal sobre a inflação e avalia que a apresentação e a tramitação do arcabouço fiscal reduziram substancialmente a incerteza em torno do risco fiscal.
Na semana passada, o plenário do Senado concluiu a votação do projeto do novo arcabouço fiscal, que terá de passar por uma nova análise da Câmara dos Deputados após ser alterada pelos senadores, atrasando em alguns dias a conclusão da tramitação da prioritária proposta do governo.
Mas o Copom voltou a enfatizar que não há relação mecânica entre a convergência de inflação e a aprovação do arcabouço fiscal, uma vez que a trajetória de inflação segue condicional à reação das expectativas de inflação e das condições financeiras.