A recente eleição de Javier Milei como presidente na Argentina levanta questões sobre as futuras relações econômicas entre Brasil e Argentina e seu impacto potencial na economia brasileira.
Durante sua campanha, o presidente eleito propôs medidas pouco convencionais, como a dolarização da economia, o fechamento do Banco Central Argentino e a saída do Mercosul. Essas propostas geraram preocupações entre investidores devido à interdependência econômica entre os dois países.
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Eu vou usar um jargão do esporte e tenho certeza de que você vai me entender: treino é treino, jogo é jogo! A situação econômica da Argentina é muito delicada, e uma coisa é discurso de campanha, outra é planejar um governo e equilibrar contas para não quebrar o país.
Quem é mais relevante para quem?
A Argentina é o principal parceiro econômico do Brasil na América do Sul. O Brasil é o principal comprador de produtos argentinos, enquanto a Argentina é o terceiro maior destino para as exportações brasileiras.
Apesar da parceria comercial estabelecida com o Mercosul em 1991, as relações entre os dois países têm enfrentado desafios devido a divergências ideológicas e a mudanças no cenário macroeconômico global, que fizeram com que outros players ganhassem maior protagonismo na balança comercial brasileira.
Impactos possíveis na economia brasileira
Ainda é cedo para saber até onde as promessas de campanha de Milei podem se reverter em ações concretas, já que é necessário apoio do Congresso argentino – onde o presidente eleito não tem maioria – para as mudanças estruturais defendidas. Inclusive, o discurso do Milei após a vitória já é mais ameno do que o utilizado durante a campanha, pois ele sabe que terá que negociar apoios para seguir com seu programa e, especialmente, com os pilares macroeconômicos deste.
Além disso, as condições objetivas do país, que hoje não conta com reservas cambiais, enfrenta uma inflação de mais de 140% e um índice de pobreza superior a 40%, não favorecem medidas extremas que, dado o cenário, podem se tornar um remédio com efeitos colaterais mais graves do que a própria doença.
Ainda assim, se as relações diplomáticas entre os governos brasileiro e argentino não chegarem a um bom termo, isso pode afetar os resultados de setores da nossa economia que exportam para a Argentina, como o automotivo, o de máquinas e equipamentos, o têxtil e o de alimentos. Esse risco, inclusive, se faz mais presente na hipótese de uma ruptura da Argentina com o Mercosul, como defende Milei.
A Argentina é oportunidade para investidores estrangeiros?
Apesar da reação positiva dos mercados ao resultado das eleições argentinas, eu não creio que isso se reverta, no curto e médio prazo, na migração do dinheiro dos grandes investidores institucionais.
É fato que os mercados reagiram positivamente, e o interesse por títulos públicos argentinos, bem como por ações de empresas argentinas listadas em Wall Street subiram bastante. No entanto, esse tipo de reação era esperado em função do discurso de Milei, quanto a honrar compromissos financeiros, organizar as questões fiscais, reduzir impostos e diminuir o tamanho do Estado com privatizações.
As promessas estão em linha com a expectativa dos mercados, contudo, a estabilidade econômica dependerá da forma como ocorrer a transição, da composição da equipe econômica e da habilidade de Javier Milei em negociar acordos políticos. Essa combinação de fatores será determinante para sustentar a euforia inicial dos mercados e garantir a continuidade do cenário otimista.
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Os títulos públicos argentinos já vinham com taxas atrativas há um bom tempo, assim como as ações de muitas empresas do país também vinham descontadas. No entanto, o risco-país ainda é muito alto. Com as taxas de juros nos Estados Unidos ainda elevadas, por que os investidores se lançariam no mar de incertezas e instabilidade argentinas em detrimento de ativos de alta qualidade, de economias consideradas sólidas?
Acredito que o mercado vai observar de perto a economia argentina. Muitos investidores grandes seguirão fazendo trades tanto da renda variável quanto na renda fixa do país, mas não vejo, por hora, a Argentina como um concorrente de peso para o Brasil na atração de recursos vindos de investimentos estrangeiros.
O que muda para o investidor brasileiro?
Para o investidor brasileiro, especialmente pessoas físicas, não muda absolutamente nada, a menos que você invista em ativos argentinos. Se este for o seu caso, sugiro que acompanhe de perto a economia do país e, sobretudo, que destine a esse tipo de investimento, aquele percentual de seu patrimônio destinado ao alto risco.
Porém, se você faz parte da maioria dos investidores pessoa física brasileiros, cujos recursos estão nos ativos dentro do Brasil, a mudança de poder na Argentina não traz nesse momento nenhum efeito colateral direto ao seu portfólio.
Mesmo que você invista em empresas que exportam para a Argentina, suponho que sua carteira seja diversificada e com balanceamento para mitigar riscos. Sendo assim, pequenas volatilidades em setores específicos não têm potencial para produzir danos.
No mais, quero apenas reforçar algo que já mencionei várias vezes: cenários geopolíticos mudam o tempo todo. São eleições, golpes, mudanças nas políticas monetárias, guerras, epidemias, secas ou inundações interferindo na agricultura, na pecuária e na produção industrial dos países e tantos outros eventos que tornam os mercados voláteis.
Essa é a natureza dos mercados e, independentemente dos eventos, o que deve pautar suas decisões de investimento são as suas metas, capacidade de aporte e prazo. Os acontecimentos ao longo dessa trajetória são coisas que eu, você ou quaisquer outros pequenos investidores não temos nenhum controle.
Eduardo Mira é formado em telecomunicações, com pós-graduação em pedagogia empresarial e MBA em gestão de investimento. É analista CNPI, certificado CPA10 e CPA20, ex-gerente do Banco do Brasil e da corretora Modal.
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