A economia brasileira permaneceu em território positivo no terceiro trimestre e frustrou expectativas de retração, mas ainda assim marcou o resultado mais fraco desde o final de 2022, em meio a condições financeiras restritivas e pressionada pelo setor agrícola e pela queda dos investimentos, após mostrar forte resiliência na primeira metade do ano.
A perda de força da atividade no segundo semestre já era esperada diante dos efeitos defasados dos juros altos e da dissipação do choque positivo da agricultura, que foi limitado ao primeiro trimestre e início do segundo.
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O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil registrou expansão de 0,1% no terceiro trimestre na comparação com os três meses anteriores, marcando o terceiro trimestre seguido de expansão depois de queda de 0,1% nos últimos três meses do ano passado.
A taxa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta terça-feira contrariou a expectativa em pesquisa de Reuters de uma queda de 0,2%.
No primeiro trimestre, a economia teve avanço de 1,4%, enfraquecendo a 1,0%% no segundo, em dados revisados pelo IBGE de altas de 1,8% e 0,9% informadas antes, respectivamente.
Na comparação com o terceiro trimestre de 2022, o PIB teve alta de 2,0%, contra expectativa de 1,9% nessa base de comparação.
O PIB opera agora 7,2% acima do nível pré-pandemia, no quarto trimestre de 2019.
No terceiro trimestre, os dados do PIB mostram que a maior retração frente aos três meses anteriores foi registrada pela agropecuária, de 3,3%, setor que havia crescido 12,5% e 0,5% nos primeiro e segundo trimestres. É a maior queda trimestral desde os três primeiros meses de 2022 (-10,8%).
Ainda do lado da produção, tanto indústria quanto serviços — setor que responde por cerca de 67% da economia do país — cresceram 0,6%.
Quatro trimestres negativos
Do lado das despesas, os gastos das famílias aumentaram 1,1% em relação ao segundo trimestre, em meio à resiliência do mercado de trabalho. Já as despesas do governo cresceram 0,5%.
Já a Formação Bruta de Capital Fixo, uma medida de investimento, apresentou retração de 2,5% no terceiro trimestre, marcando quatro trimestres seguidos no vermelho.
Em relação ao setor externo, as exportações de bens e serviços tiveram desempenho positivo de 3,0%, enquanto as importações recuaram 2,1%.
Depois de resultados fortes nos dois primeiros trimestres do ano, a economia brasileira sofreu entre julho e setembro o peso dos juros em patamar restritivo, que influencia tanto o ímpeto de crescimento da economia quanto a oferta de crédito e o ritmo da inflação, ainda que o Banco Central tenha dado início a um ciclo de afrouxamento monetário.
Desde agosto, o BC reduziu a Selic em um total de 1,5 ponto percentual, para os atuais 12,25%, e deve promover novo corte de 0,5 ponto em sua última reunião do ano, em 12 e 13 de dezembro, mas já indicou que a intenção é manter a taxa em nível restritivo.
Incertezas no ambiente externo também pesam, principalmente com a perspectiva de manutenção dos juros norte-americanos em patamar alto por mais tempo e conflitos geopolíticos. Por outro lado, a inflação vem sendo considerada sob controle no Brasil, e o mercado de trabalho ainda se mantém forte, mas sem pressões salariais importantes.
No mês passado o governo revisou para baixo sua projeção para o crescimento econômico do Brasil em 2023 a 3,0%, de 3,2% previsto antes. Ao mesmo tempo, piorou ligeiramente a perspectiva de expansão para 2024, a 2,2%.
Repercussão
William Jackson, economista-chefe para mercados emergentes da Capital Economics
“A economia do Brasil teve um desempenho melhor do que o esperado no terceiro trimestre, mas o panorama geral é de que o forte crescimento observado no primeiro semestre do ano chegou ao fim. Do lado da produção, a agricultura foi um obstáculo ao crescimento no terceiro trimestre, uma vez que a colheita abundante do início do ano foi parcialmente revertida. É difícil prever o que acontecerá no quarto trimestre, dada a volatilidade da produção no sector agrícola. Mas… pensamos que a economia está entrando numa fase de crescimento mais fraco –mais semelhante às taxas de crescimento registradas nos anos anteriores à pandemia, de 1,0-1,5%.”
Gabriel Couto, Economista do Santander
“A nossa previsão de crescimento de 2,5% para 2023 está atualmente sob revisão, com riscos inclinados para cima. As condições financeiras continuam em níveis criticamente restritivos, o que se reflete no contínuo enfraquecimento dos investimentos fixos. Contudo, o consumo das famílias continuou a demonstrar uma elevada resiliência, em meio a um mercado de trabalho ainda apertado. Do lado da oferta, apesar da confirmação de uma desaceleração ampla, todos os setores superaram as nossas expectativas, indicando resiliência generalizada da economia brasileira.”
Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica do Goldman Sachs para a América Latina
“A atividade real durante o terceiro trimestre foi apoiada pelos setores industrial e de serviços e arrastada pelo declínio considerável, mas menor do que o esperado, na atividade agropecuária. À frente, esperamos que a atividade continue a se beneficiar de estímulos fiscais significativos e de perspectivas positivas para a produção de petróleo e gás, mas seja pressionada por condições monetárias e financeiras internas restritivas, níveis ainda elevados de endividamento das famílias, baixos níveis de margem disponível na economia, indicadores de confiança fracos e a inversão do ciclo de crédito.”
Nicolas Borsoi, economista-chefe da Nova Futura
“PIB melhor que o esperado pelo consenso (-0,3%) e por nós (-0,2%). Apesar da surpresa, não estou convencido que os números alteram o cenário de atividade fraca. Acho que o consumo, de fato, surpreendeu positivamente. Mas olhando os dados de oferta de forma desagregada, o recuo dos investimentos e das importações, pela ótica da demanda, me fazem crer que os dados são mais condizentes com um cenário de PIB fraco.”