“Ir ao mercado era uma loucura. Os preços mudavam todos os dias”, relembra Roberto Bispo, de 67 anos, sobre fazer compras há trinta anos. No início dos anos 90, os brasileiros sentiram na pele as consequências da hiperinflação. Mas, em meio a uma economia em crise, o Plano Real surgiu como um bote salva-vidas.
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A crise econômica da década de 1990 era resultado das gestões do período da Ditadura Militar. Os impactos do regime foram severos, e o país sofria com endividamento externo e uma inflação elevada, que aumentava drasticamente o custo de vida dos trabalhadores.
Antes do Plano Real, outros cinco planos fracassaram no combate à inflação. O congelamento de preços era uma medida comum em alguns desses projetos, mas se mostrou ineficaz. “Quando ia ao mercado, já pegava o suficiente para a semana toda. Não conseguia fazer a compra do mês, porque os preços aumentavam muito”, relembra Roberto Bispo. Ele conta que muitas vezes foi necessário escolher quais itens permaneceriam no carrinho.
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“A inflação é um fenômeno no qual os preços sobem de elevador e o salário vai pela escada. O salário real se deteriora”, explica Simão Silber, professor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo (FEAUSP). “Toda vez que um governo é leniente com a inflação, quem sofre mais é a população menos favorecida.”
Em junho de 1994, um mês antes do lançamento do Plano Real, a inflação acumulada em 12 meses era de quase 5.000%. Embora tenha encerrado 1994 com 916%, a inflação caiu para 22% no ano seguinte. A economia enfrentava recessão, alto desemprego, rápida desvalorização dos salários e um aperto monetário que interferia em todos os aspectos da vida cotidiana dos brasileiros.
“O Plano Real foi o maior projeto de organização da economia brasileira desde a proclamação da República”, afirma Vinícius Müller, doutor em História Econômica e professor do Insper. Em maio de 1993, Fernando Henrique Cardoso foi nomeado Ministro da Fazenda pelo Presidente Itamar Franco, assumindo o compromisso de combater a hiperinflação.
O plano envolvia fatores macroeconômicos, monetários e psicológicos, com a criação da URV (Unidade Real de Valor). Segundo Müller, o plano focou na reorganização econômica por meio de ajuste fiscal, continuidade da abertura econômica e diminuição do papel empresarial do governo.
Os benefícios do Plano Real foram diversos. Ele estabilizou a economia, facilitou o acesso ao crédito para os mais vulneráveis, promoveu crescimento econômico regular, aumentou o salário mínimo em termos reais e, o mais importante, reduziu a pobreza absoluta, melhorando as condições de vida da população mais carente no Brasil.
As mudanças foram visíveis. Durante a hiperinflação, estocar alimentos era um padrão de consumo comum. Era normal ver geladeiras e freezers nos lares brasileiros, com pessoas estocando alimentos por medo dos preços futuros. “O brasileiro tentava transformar dinheiro em estoques. Quem podia acumulava água mineral, feijão, arroz, fazia a poupança nas mercadorias”, afirma o professor Silber.
Entretanto, uma consequência negativa do Plano Real foi a manutenção da taxa básica de juros (Selic) elevada ao longo dos últimos 30 anos para controlar a inflação. “Apesar de a taxa média ter caído ao longo dos anos, ainda é uma das mais altas do mundo”, afirma Rodolfo Olivo, professor de administração da FIA Business School.
Segundo o ranking da consultoria MoneYou, o último corte de 0,50 ponto percentual (p.p.) feito pelo Banco Central manteve o Brasil em segundo lugar com o maior juro real do mundo. A taxa Selic, de 10,75%, coloca o país atrás apenas do México.