Os argentinos são famosos pelas churrascarias, extensas fazendas de gado e churrascos. Porém, eles nunca consumiram tão pouca carne bovina: têm sido forçados a apertar os cintos devido à inflação de três dígitos e à recessão. O consumo de carne bovina caiu quase 16% neste ano em comparação com 2023.
Na Argentina, a carne sempre foi uma parte essencial do tecido social, junto com o futebol e o chá mate. Muitas casas possuem churrasqueiras onde as famílias se reúnem. Churrascarias estão espalhadas pelas esquinas de Buenos Aires e as pessoas se aglomeram em torno de churrascos improvisados até durante protestos.
“A carne bovina é parte integrante da dieta argentina, é como se as massas tivessem sido eliminadas para os italianos”, diz a aposentada Claudia San Martin, 66 anos, enquanto esperava na fila do açougue.
Ela diz que estava disposta a cortar outras compras, como produtos de limpeza, mas a carne era sagrada. “Acredito que os argentinos podem eliminar qualquer coisa em tempos difíceis como este. Mas não podemos viver sem carne”, diz ela.
Os dados mais recentes mostram outra imagem. O consumo de carne por ano caiu para cerca de 44 quilos por pessoa, uma queda acentuada ante os mais de 52 quilos de 2023 e muito longe dos 100 quilos por ano na década de 1950.
Parte do declínio deve-se a uma mudança que elevou o consumo de outras fontes de proteína, como carne de porco e de frango, além da escolha de alimentos mais baratos, como as massas. Mas a queda deste ano foi impulsionada por uma inflação de quase 300% e por uma economia estagnada, juntamente com duras medidas de austeridade do presidente libertário Javier Milei.
A pobreza aumentou, mais pessoas estão desabrigadas nas grandes cidades e as filas cresceram nos refeitórios sociais. Muitas famílias reduziram o consumo de alimentos básicos como carne, leite e legumes. Eles dizem que ainda não sentiram os benefícios da desaceleração da inflação mensal.
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“A situação neste momento é crítica. Os consumidores estão tomando decisões pensando apenas nas suas carteiras”, diz Miguel Schiariti, presidente da câmara local de carnes CICCRA, que espera que o consumo de carne continue baixo. “O poder de compra das pessoas está enfraquecendo mês a mês.”
“A queda no consumo é preocupante”, diz Luis Marchi, engenheiro agrônomo de 4 anos e e terceira geração a dirigir a fazenda familiar que produz grãos e gado. Ele culpa a inflação e a crise económica. “Os consumidores tentam substituir a carne bovina por alimentos mais baratos, outros tipos de carne ou massas”.
Outro fazendeiro, Guillermo Tramontini, diz que os custos dos insumos aumentaram, enquanto a seca do ano passado atingiu muitos rebanhos. “A carne não é tão cara, mas o poder de compra das pessoas foi terrivelmente reduzido”, diz ele, acrescentando que os agricultores estão sendo cuidadosos com as despesas de capital para evitar demitir trabalhadores.
À medida que o consumo local diminuiu, as exportações aumentaram, mas os preços globais mais fracos atenuaram o impulso para os agricultores. De longe, o maior comprador de carne argentina é a China, embora importe cortes mais baratos, não utilizados internamente.
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“O setor exportador passa por um momento muito difícil, embora continue exportando grandes volumes. Os preços no mercado internacional caíram muito”, diz Schiariti.
Cortes mais baratos
Em seu açougue em Buenos Aires, onde trabalha há 40 anos, Gerardo Tomsin, 61, diz que os clientes agora só buscam ofertas. “As pessoas continuam vindo, a questão é que consomem menos. Tem gente que recorre a outros produtos. É uma busca permanente por preços”, afirmou.
Outro açougueiro, Dario Barrandeguy, 76 anos, diz que as pessoas estavam comprando os cortes mais baratos de carne bovina ou outras carnes mais baratas. “O consumo de frango e carne suína aumentou muito”, diz ele.
Milei, um economista de mercado livre que se autodenomina anarcocapitalista, pôs fim ao congelamento dos preços da carne bovina do governo peronista anterior. “As coisas ficaram muito caras e quando estão tão caras simplesmente não compramos”, diz Facundo Reinal, um professor de 41 anos, acrescentando que isso significa gastar menos tempo socializando perto da churrasqueira. “Estamos vendo pessoas fazendo menos churrascos, o que é uma parte fundamental da cultura aqui na Argentina”.