A sexta-feira (11) foi atípica na maior cidade da América Latina. Em boa parte de São Paulo, as tradicionais cenas do fim de semana, com bares e restaurantes lotados, deram lugar à escuridão e a prejuízos que se multiplicaram ao longo dos dias.
A forte chuva que atingiu a região durou cerca de 20 minutos, mas foi o suficiente para deixar mais de 2 milhões de consumidores sem energia elétrica. Até o início da tarde desta segunda-feira (14), 400 mil ainda estavam no escuro, segundo a Enel, empresa responsável pelo fornecimento de energia.
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O apagão em São Paulo causou transtornos em residências, indústrias, comércios, bares e restaurantes. De acordo com especialistas consultados, ainda é cedo para calcular o impacto econômico total, mas algumas projeções já estão sendo feitas.
A Federação de Hotéis, Restaurantes e Bares do Estado de São Paulo (Fhoresp) estima um prejuízo de R$ 100 milhões para o setor. A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes de São Paulo (Abrasel SP) calcula que cerca de 50% dos 155 mil estabelecimentos da cidade foram afetados, com uma perda mínima de R$ 10 mil por local.
Segundo o economista Ulisses Ruiz de Gamboa, da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), a dificuldade em estimar os prejuízos decorre da distribuição desigual dos danos pela cidade e da continuidade dos problemas de fornecimento.
Com base nos dados do Instituto de Economia Gastão Vidigal da ACSP (IEGV/ACSP), a estimativa é que o comércio paulistano tenha perdido cerca de R$ 98,5 milhões.
Procurada, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) afirmou não ter uma estimativa precisa das perdas no setor industrial, já que muitas empresas possuem geradores próprios. A Prefeitura de São Paulo também informou que ainda é cedo para uma avaliação completa.
Conta que não fecha
O setor de bares e restaurantes foi um dos mais afetados pelo apagão, pois o sábado e o domingo frequentemente representam grande parte do faturamento semanal.
Segundo Leonel Paim, vice-presidente da Abrasel SP, o impacto da falta de energia vai além da perda de receitas. “Muitos insumos se perdem, eventos são cancelados, mas as despesas fixas permanecem as mesmas, o que gera um estresse financeiro para os estabelecimentos.”
“É desesperadora a situação. Não abrimos na sexta à noite, no almoço e nem no jantar de sábado, nossos melhores dias de faturamento”, relata Luiz Filipe Souza, chef do Evvai, restaurante com duas estrelas Michelin, e do Trattoria.
Em um único fim de semana, o Evvai perdeu cerca de R$ 200 mil em faturamento e, junto com o Trattoria, teve um prejuízo de R$ 55 mil em insumos. Algumas mercadorias puderam ser preservadas com a ajuda de 50 quilos de gelo.
Benny Goldenberg, sócio do Arturito, restaurante da chef Paola Carosella, estima que o prejuízo de 72 horas sem energia tenha sido de R$ 250 mil, entre perda de receita e alimentos que precisaram ser descartados.
Helena Mil Homens, chef e sócia da padaria St Chico, explica que o fim de semana responde por 70% do faturamento semanal. Com a interrupção de energia, duas lojas ficaram fechadas no sábado e quatro no domingo.
“Além de não vender, perdemos boa parte do estoque e tivemos que contratar carros refrigerados para remanejar insumos”, explica. O prejuízo estimado foi de R$ 35 mil, com o descarte de 50 quilos de pães, frutas, sucos e queijos.
No especializado em frutos do mar Le Bulô, o chef Ricardo Lapeyre teve que ser criativo para mitigar o prejuízo. No domingo, depois de perder o jantar de sexta e o sábado inteiro, resolveu fazer um churrasco do mar na calçada do restaurante com o pouco dos insumos que ainda tinha conseguido preservar no gelo, quase tudo a preço de custo.
“Perdemos algo em torno de R$ 60 mil a R$ 80 mil”, calcula ele. “Quem saiu muito prejudicado também foram os funcionários, sem a taxa de serviço dos dias mais movimentados da semana”.
Indo atrás do prejuízo
Até o fechamento desta matéria, duas entidades já haviam anunciado ações na Justiça contra a Enel: a Fhoresp e a Abrasel SP.
A Fhoresp, que representa 502 mil estabelecimentos do setor, lembra que um apagão semelhante causou prejuízos de R$ 500 milhões no final de 2023. A entidade colocou seu departamento jurídico à disposição dos associados e vai mediar ações individuais na Justiça.
Édson Pinto, diretor-executivo da Fhoresp, destacou a necessidade de investigar o que impede a Enel de executar seu serviço com eficiência. “Não é aceitável que, em menos de um ano, a distribuidora repita esse tipo de falha com o setor e os consumidores. Os restaurantes precisam de uma reparação real por parte da empresa, além de apoio do Estado e da Prefeitura”, afirma.
Já a Abrasel SP pretende entrar com uma ação coletiva contra a Enel. Segundo Percival Maricato, advogado especialista no setor e diretor institucional da entidade, a ação coletiva pedirá reparação por danos financeiros e morais, com um valor de R$ 20 mil por danos morais e até R$ 50 mil de reparação financeira para cada associado.
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Benny Goldenberg, do Arturito, afirmou à Forbes que também pretende protocolar uma ação judicial contra a distribuidora. “Em um setor com regras tão rígidas, é revoltante ver uma empresa agir como bem entender, deixando o cidadão completamente à mercê.”