Depois de meses de atraso e expectativa do mercado, a espera pelo tão aguardado pacote fiscal deve chegar ao fim ainda nesta quarta-feira (27). O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, devem entregar o texto ao Congresso.
O que poderia ser um dia de alívio para o mercado financeiro, no entanto, virou um dia de forte aversão ao risco. O dólar à vista chegou a disparar acima da casa dos R$ 5,92, enquanto o Ibovespa acelerou a queda.
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A alta desacelerou, mas ainda assim o dólar fechou o dia em seu maior patamar nominal da série histórica — a R$ 5,9141, em alta de 1,80%. O Ibovespa encerrou em queda de 1,73%, aos 127.668 pontos.
Se tão aguardado, por que a reação extrema do mercado? A resposta está nos pacotes adicionais que devem ser anunciados em conjunto com a contenção de gastos — o teor completo ainda é desconhecido, mas o que se sabe é que Haddad deve anunciar uma isenção de imposto de renda para aqueles que ganham até R$ 5 mil e uma taxação extra para super-ricos.
Logo de cara, a reação do mercado pode ser descrita quase como perplexidade.
“O mercado perdeu a paciência com a espera e a diluição das medidas positivas aventadas anteriormente. A inserção da isenção do IR em paralelo às medidas de gastos mostra a falta de vontade do governo de se comprometer com a pauta necessária”, aponta Filippe Santa Fé, head de multimercados do ASA.
Segundo ele, a movimentação do mercado indica a busca por um prêmio de risco correspondente ao novo equilíbrio fiscal, “ainda com esperança de que esta trajetória sirva de sinalização ao Congresso”.
Marcos Moreira, CFA e sócio da WMS Capital, aponta que além da pressão no dólar e na bolsa, o vazamento da informação, a curva de juros passou a precificar uma Selic próxima dos 14%. “Isso será necessário para conter o avanço do dólar e da inflação neste cenário”, explica.
A WMS Capital acredita que, caso a isenção de IR avance, o impacto negativo na arrecadação de R$ 40 bilhões — apagando parte relevante do que o mercado espera que seja economizado com o pacote fiscal.
“Se já havia dúvidas sobre a efetividade do pacote de corte de gastos em segurar a trajetória da dívida pública, agora com o possível anúncio de receita menor devido à isenção de IR o cenário tende a piorar bastante”, aponta Felipe Reis, estrategista da EQI Research.
A novela do fiscal
Para Matheus Pizzani, economista da CM Capital, o governo apostar na isenção do imposto de renda até R$ 5 mil não é nenhuma novidade, uma vez que essa é uma proposta de campanha do governo Lula. Se hoje o mercado consegue precificar essa medida de forma efetiva é porque, em outros momentos, a possibilidade já havia sido ventilada.
O economista lembra que fazer a isenção pura e simplesmente, sem uma contrapartida, vai gerar uma perda muito significativa de arrecadação porque não tem como pensar em um cenário que essa isenção beneficie o consumo das famílias em um nível suficiente para compensar o que seria ganho com o IR.
“Não é um montante suficiente para compensar a arrecadação ou gerar um saldo positivo para o governo.Ela tem que vir acompanhada de mudanças e adaptações em outros pontos”, explica Pizzani.
“A reação do mercado em antecipação ao anúncio reforça a importância de uma comunicação clara e estratégica ao longo do processo de revisão das contas públicas. A falta de alinhamento entre intenção e narrativa tem um custo significativo, tanto em termos de percepção quanto de volatilidade no mercado”, conclui José Cassiolato, sócio da RGW Investimentos.