Pode até parecer notícia repetida, mas não é. Já deu para perder as contas de quantas vezes a moeda americana renovou o seu patamar recorde nas últimas semanas. Hoje (18) o dólar avançou quase 3% e bateu um novo recorde nominal de fechamento, a R$ 6,26, se aproximando de um novo marco psicológico: os R$ 6,30.
Três fantasmas assombraram a moeda americana nesta tarde. Dois deles locais.
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O primeiro foi o bom e velho risco fiscal — mas de forma um tanto confusa, já que houve avanços claros na tramitação do projeto de contenção de gastos apresentado pelo governo.
A Câmara dos Deputados aprovou ontem à noite o texto-base das iniciativas que irão travar os gastos públicos pelos próximos anos e que, segundo o governo, deve trazer uma economia de R$ 70 bilhões nos próximos dois anos. Além disso, o presidente da Casa, Arthur Lira, prometeu que os outros dois textos serão analisados hoje.
Ou seja, com tempo suficiente para aprovação antes do recesso parlamentar. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também se mostrou otimista com o encaminhamento do projeto.
Ainda assim, o dólar não cedeu em nenhum momento ao longo do dia e o risco fiscal foi o motivo mais citado pelos analistas do mercado.
O que nos leva ao segundo motivo de pressão no dólar: um leilão fracassado do Tesouro Nacional.
Mesmo com a taxa de juros dos títulos públicos batendo máximas históricas seguidas vezes, o leilão especial realizado para suprir a demanda acabou sendo um fracasso: não houve nenhuma venda.
“Não vendeu nada, recomprou apenas 10% do que propôs nas maiores taxas do ano, reflete muito que o problema é estrutural e não é só mais dívida. A necessidade de recuperar a credibilidade de forma concreta está cada vez mais necessária”, aponta Victor Furtado, Chefe de Alocação da W1 Capital.
Segundo Furtado, os investidores já não vêem o retorno atual como atrativo devido à deterioração do cenário. “A solução para uma falta de demanda seria a emissão de mais moeda, e entraríamos em um cenário muito inflacionário que puxaria juros mais para cima e levaria o real a maiores desvalorizações, muito parecido com o que a Turquia viveu”.
Resultado: mais pressão no dólar.
Efeito Fed
A terceira razão veio do exterior e além de pressionar o mercado brasileiro também levou as bolsas americanas ao pior resultado em dois anos — a decisão de juros do Federal Reserve.
A decisão em si não trouxe uma surpresa e já estava precificada pelo mercado: o Federal Open Market Committee (Fomc), o Copom americano cortou os juros referenciais (FED Funds) para uma faixa entre 4,25% e 4,50% ao ano.
O “problema” do mercado veio no tom do comunicado. Com a inflação americana ainda em patamar considerado alto e acima da meta de 2%, o Fed adotou um tom duro que aponta apenas mais duas reduções em 2025, bem aquém do patamar desejado pelos investidores.
No radar do BC americano está a condução da política econômica sob o novo governo Trump. Se as promessas de campanha se confirmarem, há uma tendência de pressões inflacionárias adicionais.
Na prática, juros mais baixos nos Estados Unidos tendem a favorecer o câmbio brasileiro por conta da atratividade da renda fixa. Mas a sinalização de que os Fed Funds ficarão em patamar mais alto do que o esperado anula esse efeito, uma vez que os títulos da dívida americana são considerados os ativos mais seguros do mundo — justo em um momento em que o cenário fiscal brasileiro passa por forte crise de credibilidade.
Sem bombeiro
Apesar da forte movimentação do dólar hoje, o BC não entrou em campo para conter a disparada. Apenas o leilão tradicional ocorreu.
Mas amanhã a história será outra. Após o fechamento do mercado, a autarquia anunciou um leilão de venda no mercado à vista de até US$ 3 bilhões.
Contando a única intervenção extraordinária e os demais leilões tradicionais de fim de ano, o BC já injetou US$ 12,75 bilhões no sistema sem o resultado esperado.
E a bolsa?
A mesma conjuntura adversa que afetou o dólar também derrubou a bolsa. O movimento, aliás, acelerou com a forte queda dos índices americanos.
Na B3, o Ibovespa encerrou o dia com um recuo de 3,15%, aos 120.771 pontos.