DeepSeek. Você provavelmente nunca havia lido essa palavra antes desta segunda-feira (27). No entanto, esse termo deverá frequentar as conversas por várias semanas. Um pouco conhecido laboratório chinês de Inteligência Artificial (IA), a DeepSeek viralizou ao longo do fim de semana e está provocando fortes baixas nos índices de ações americanos na manhã desta segunda-feira (27).
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Pouco antes da abertura dos negócios no mercado a vista, os contratos futuros do índice americano Nasdaq, que concentra as ações de empresas de tecnologia, estavam em queda de 4%. Os contratos do índice S&P, mais geral, estavam em baixa de 2%.
A queda ocorreu porque as ações das empresas de tecnologia dos Estados Unidos despencaram no pré-mercado. A DeepSeek está provocando preocupações entre os investidores sobre a competitividade e a liderança americanas no setor na IA.
A DeepSeek lançou, no fim de dezembro, um modelo de linguagem de código aberto e gratuito, afirmando que foi desenvolvido em apenas dois meses a um custo inferior a US$ 6 milhões (R$ 35,4 milhões). Na semana passada, a empresa revelou um modelo de raciocínio que supostamente superou o mais recente da OpenAI em vários testes independentes.
Nesta segunda-feira, os downloads da DeepSeek na App Store já haviam ultrapassado os da concorrente ChatGPT. Isso levanta questões sobre a sustentabilidade do nível de gastos e investimentos em IA por empresas ocidentais, incluindo Apple e Microsoft.
“Ainda não sabemos os detalhes e nada foi 100% confirmado em relação às alegações, mas se realmente houve um avanço no custo para treinar modelos de mais de US$ 100 milhões (R$ 590 milhões) para esse suposto número de US$ 6 milhões, isso é realmente muito positivo para a produtividade e para os usuários finais de IA”, afirmou Jon Withaar, gerente sênior de portfólio da Pictet Asset Management.
Barreiras de entrada
O entusiasmo em torno da IA impulsionou um enorme fluxo de capital para os mercados de ações nos últimos 18 meses à medida que os investidores compraram papéis de tecnologia, inflacionando as avaliações das empresas e fazendo com que os mercados atingissem máximas recordes.
Mais do que um concorrente para as empresas já estabelecidas, o produto da DeepSeek coloca em questão um ponto fundamental: será que é preciso investir centenas de bilhões de dólares em data centers, processadores e desenvolvimento para ter soluções de IA? Ou é possível fazer isso com muito menos dinheiro e recursos tecnológicos, reduzindo drasticamente as barreiras de entrada à concorrência?
“É evidente que a DeepSeek não tem acesso à mesma capacidade computacional dos gigantes americanos, mas, de alguma forma, conseguiu desenvolver um modelo que parece altamente competitivo,” afirmou Srini Pajjuri, analista de semicondutores da Raymond James, em uma nota publicada nesta segunda-feira (27).
Processadores baratos
Pouco se sabe sobre a pequena startup de Hangzhou por trás da DeepSeek. Seus pesquisadores escreveram em um artigo no mês passado que o modelo DeepSeek-V3, lançado em 10 de janeiro, usou os chips H800 da Nvidia para treinamento. Os chips H800 não são os melhores do mercado. Inicialmente desenvolvidos como um produto de capacidade reduzida para contornar as restrições de vendas para a China, eles foram posteriormente banidos pelas sanções dos Estados Unidos.
Por outro lado, Pajjuri observou que a DeepSeek poderia “aumentar ainda mais a urgência entre os gigantes americanos,” como Amazon e Microsoft, que possuem uma infraestrutura computacional robusta, para aproveitar sua vantagem no acesso a unidades de processamento gráfico (GPUs) e se diferenciar de opções mais baratas. As GPUs são uma peça-chave na infraestrutura necessária para treinar grandes modelos de IA, e a Nvidia é líder de mercado nesse segmento.
Analistas do Citi afirmaram que o modelo de linguagem da DeepSeek “provocou questionamentos de investidores sobre o custo de computação.” Eles ressaltaram que, “embora o domínio das empresas americanas nos modelos de IA mais avançados possa ser potencialmente desafiado,” o acesso dessas empresas a chips de última geração é uma vantagem significativa. “Portanto, não esperamos que as principais empresas de IA deixem de usar GPUs mais avançadas.”
Temores exagerados?
O recente anúncio do projeto Stargate AI, de US$ 500 bilhões (R$ 2,95 trilhões), liderado pelo presidente Donald Trump, é “um reconhecimento da necessidade de chips avançados,” acrescentaram.
Por outro lado, analistas da Bernstein expressaram dúvidas sobre se o modelo da DeepSeek foi realmente desenvolvido por menos de US$ 6 milhões, argumentando que o valor “pode não incluir todos os outros custos associados à pesquisa prévia e experimentos sobre arquiteturas, algoritmos ou dados.”
Eles enfatizaram que os “modelos da DeepSeek parecem fantásticos, mas não acreditamos que sejam milagres,” e disseram que o pânico em torno do “fim do complexo de infraestrutura de IA como o conhecemos” é “exagerado.”
Exagerado ou não, o temor fez os investidores questionarem os enormes valores que grandes empresas de tecnologia têm investido em modelos de IA e centros de dados. O melhor exemplo foram as ações da Nvidia, uma das maiores beneficiárias do entusiasmo em torno da IA. As cotações chegaram a cair 14% no pré-mercado em Nova York. A fortuna do CEO da Nvidia, Jensen Huang, recuou US$ 20 bilhões (16,95%) após a queda das ações.
Na Europa, as companhias de chips ASML e ASM International, com sede na Holanda, recuaram 8,9% e 13,6%, respectivamente, enquanto, na Ásia, as ações de empresas japonesas de chips também registraram quedas generalizadas.