“Você deve estar louca” foi o que Mirelly de Moraes ouviu quando tomou a decisão de deixar o mercado financeiro para entrar no mercado de flores. “Estudou tanto para trabalhar numa floricultura?”, disseram seus familiares, seus peers e colegas da faculdade de administração na Fundação Getúlio Vargas, sobre o momento em que fundou, em 2012, a Verbena Flores. Embora mais colorido, o objeto de seu novo empreendimento se mostrou tão frágil, delicado e complexo quanto os fundos de private equity nos quais ela operava. Se aplica aqui também a palavra “próspero” – é, afinal, de uma businesswoman de sucesso que estamos falando. Após comprar a participação de sua sócia e assumir a empresa como CEO em 2019, Mirelly viu o crescimento da Verbena desabrochar como uma frésia na primavera.
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“Flores são um produto que conecta pessoas – é o que eu mais amo sobre elas” conta à coluna, direto de sua nova casa, em Palo Alto, Califórnia, onde vive com o marido (e fundador da XP Health) Antonio Ermírio de Moraes Neto, além das duas filhas, de cinco e sete anos. “Por promover essa conexão, o gesto de enviar flores se tornou um ato ainda mais especial durante a pandemia, quando a distância entre as pessoas, metafórica e literalmente, prevalecia – foi um período de crescimento rápido para a empresa”, explica ela, que logo entendeu que empreender significava varrer o escritório e atender clientes como a maison Dior com o mesmo entusiasmo e dedicação diária.
“Levar flores para todo o Brasil sempre foi minha meta. Porém, isso se mostrou um desafio. O produto Verbena é bastante sofisticado; são arranjos grandes, em vasos de vidro, difíceis de escalonar e incluir em uma logística que alcance diferentes cidades do país”.
Foi aí que nasceu, em setembro, a Ermética, novo modelo de negócio que consiste em um único produto: uma caixa com flores coloridas, embrulhadas em papel. Quais flores? Ora, as que estiverem mais frescas no dia. “Estamos lidando com um produto sazonal, que sofre muito com o clima – se chover muito hoje, por exemplo, as minhas rosas não vão estar boas”, justifica. Para além da identidade moderna, com apelo Gen-Z, a grande sacada da Ermética talvez esteja em sua logística: as caixas são despachadas sempre à noite, de São Paulo, e chegam no dia seguinte, até o meio-dia, no interior paulista e em endereços nas regiões Centro Oeste e Sul do país. “Com isso, conseguimos com que as flores desembarquem na casa do destinatário mais frescas do que as disponíveis nas cidades em que eles moram, pois foram colhidas poucas horas antes da entrega – enquanto floriculturas locais costumam receber flores de fornecedores a cada 4 dias, aproximadamente”. Parece loucura? Pois a previsão é que a Ermética passe a atender em breve também a região Nordeste.
“Eu adoro quando falam que estou louca – é uma supermotivação”.
O sucesso para você, hoje, significa o quê?
Ninguém cria nada sozinho. O que une as pessoas a criar algo em conjunto é o propósito. Meu marido sempre diz: “não viemos ao mundo para ser um peso, mas para fazer a diferença – nem que seja dentro de um microcosmo, um pequeno universo”. Com as flores, e ao lado de parceiros motivados por elas, podemos chegar mais perto disso.
Uma qualidade que todas as mulheres de sucesso têm em comum, na sua opinião?
Com certeza, a resiliência. Aqui no Vale do Silício, há muitas histórias do ‘empreendedor que, da noite para o dia, criou um negócio de milhões’. Mas não é assim que funciona, não mesmo. Algo que tenho notado, aqui nos EUA, é que existe uma maior valorização do “second-time entrepreneur“, o cara que criou um negócio que não deu certo, resistiu, e foi lá tentar de novo. Aqui, falhar não é visto como algo ruim. É quase uma virtude.
Do que você abriu mão na vida pessoal, em nome do nome do sucesso profissional?
Abrir mão, para mim, é saber o que há de mais importante para você. Por exemplo: sou uma mãe muito presente para minhas filhas; minha agenda foi moldada em torno delas. Eu me conecto às cinco horas da manhã para acompanhar a movimentação no horário do Brasil, entre 05h e 07h trabalho de casa, às 7h30 levo minhas filhas na escola, trabalho até as 17h, busco elas na escola, jantamos e depois volto a trabalhar. Em outras palavras: não sou a mulher que está todos os dias na escola, sendo voluntária para as atividades voltadas às mães. Eu amo as minhas filhas, mas também amo o meu trabalho; preciso de ambos para ser uma pessoa completa e me sentir feliz. De onde vejo o mundo, não há nada de errado em gostar de trabalhar.
O que você mudaria na sua profissão?
Sou de Goiás, de uma família de homens, mas isso em momento algum determinou para mim que, ao nascer mulher, teria condições diferentes de um homem para alcançar o que desejava profissionalmente. No entanto, sinto hoje que ainda há preconceito no mercado de negócios – todas as vezes em que vou falar com um investidor, ouço um discurso do tipo: ‘que bonitinho, você tem uma lojinha de flores’. É só quando falamos de números, mostramos 1500% de crescimento no faturamento, evidenciamos a criação de uma segunda marca, que eles me olham de uma forma diferente. Nesse sentido, ainda temos um longo caminho a percorrer.
Qual pessoa, para você, traduz a ideia de sucesso atualmente?
Me inspiro muito em nosso time de floristas. Nossa empresa é formada em 90% por mulheres (o que eu não vou te falar que foi mera coincidência). São mulheres que acordam de madrugada, deixam seus filhos na escola e vão trabalhar. E trabalham em prol deste produto, que não é essencial – eu tenho plena consciência: não é um alimento, não é uma necessidade básica. É, inclusive, algo que muitas pessoas enxergam como supérfluo. Mas, ao ver esse time de mulheres se debruçarem diariamente sobre isso, todos os dias, me lembro: estamos fazendo algo. E esse algo é: deixar o mundo em que vivemos um pouco mais belo, um dia de cada vez.
Com Antonia Petta
Donata Meirelles é consultora de estilo e atua há 30 anos no mundo da moda e do lifestyle.
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