Ícone pop, cantora e uma das pioneiras do rock nacional, Rita Lee morreu na segunda-feira (8), em São Paulo, aos 75 anos. Segundo comunicado no Instagram da cantora, ela “faleceu em sua residência, em São Paulo, capital, no fim da noite, cercada de todo o amor de sua família, como sempre desejou.”
Rita Lee havia sido diagnosticada com um tumor no pulmão esquerdo em maio de 2021. Depois de um ano de sessões de imunoterapia e radioterapia, seu filho Beto Lee anunciou em abril de 2022 que ela estava curada. Em fevereiro deste ano, foi internada e saiu do hospital em 4 de março.
A artista, uma das maiores do país, foi destaque da lista 50 Over 50 da Forbes em 2022, que reúne grandes nomes que chegaram à maturidade com mais relevância e influência.
Carreira
Em mais de 50 anos de carreira, Rita lançou 315 músicas, que foram regravadas 638 vezes. A mais tocada e regravada da última década é “Mania de Você”, segundo o Ecad (Escritório Central de Arrecadação de Direitos). Das dez músicas mais tocadas, quatro são em parceria com o marido, Roberto de Carvalho.
Nos últimos dez anos, Rita teve mais de 80% de seus rendimentos em direitos autorais vindos de rádio, TV e shows. Sua última música inédita, “Change”, foi lançada em setembro de 2021, depois de um hiato de nove anos.
Em 2022, o Grammy Latino homenageou a cantora pelo conjunto de sua obra, que tem mais de 30 álbuns solo e com o grupo Os Mutantes, que a alçou ao sucesso e ao status de estrela do rock. Rita foi indicada a sete prêmios da academia e venceu em 2001 na categoria Melhor Álbum de Rock em Língua Portuguesa, por “3001”.
Longe dos palcos, ela se dedicou à literatura. Lançou nove livros desde 2016, incluindo histórias infantis e sua autobiografia, que se tornou um best-seller. Em 2017, foi a autora brasileira que mais vendeu livros na categoria não-ficção no país – um total de 98 mil exemplares só naquele ano.
Suas obras de literatura infantil, como a série “Dr. Alex” e “Amiga Ursa”, trazem temáticas de meio ambiente e do mundo animal. Rita era vegana e foi uma amante e defensora dos animais – teve diversos bichos de estimação, como gatos, cachorros, pássaros e adotou até mesmo uma jaguatirica vítima de maus tratos.
Origem
Filha de imigrantes, com pai americano e mãe italiana, a artista nasceu em São Paulo, em 31 de dezembro de 1947. Começou a tocar piano como uma permuta entre o pai, dentista, e a pianista Magdalena Tagliaferro, e logo mostrou seu talento.
Quando se formou no colégio, tentou ser secretária. Mais tarde, iniciou o curso de comunicação da USP, mas nunca terminou.
Aos 15 anos, começou a tocar bateria e foi backing vocal e integrante de grupos musicais durante a adolescência. Mas seu sucesso começou no grupo Os Mutantes, em 1966, durante o Movimento Tropicalista, ao lado dos irmãos Sérgio Dias e Arnaldo Baptista, com quem se casou. O grupo ganhou notoriedade após acompanhar Gilberto Gil na apresentação de “Domingo no Parque” no 3º Festival de MPB da TV Record, em 1967.
Após o fim do relacionamento com Arnaldo em 1972, Rita foi expulsa da banda pelo ex-marido. Em seguida, passou a integrar a banda Tutti Frutti. Entre os hits com o novo grupo estão “Agora Só Falta Você”, “Esse Tal de Roque Enrow” e “Ovelha Negra”, do disco “Fruto Proibido”, de 1975, um sucesso estrondoso que rendeu a Rita o título de Rainha do Rock Brasileiro, apelido do qual não era fã.
Nesse momento, Rita já vivia um relacionamento com o guitarrista Roberto de Carvalho e, a partir de 1979, os dois começaram a fazer discos e shows juntos. São dessa época os sucessos “Chega Mais”, “Doce Vampiro” e “Mania de Você”, do álbum “Rita Lee”.
Em 1982, é lançado “Rita Lee e Roberto de Carvalho”, mais conhecido como “Flagra”, em que o casal estampa a capa e traz os sucessos “Flagra” e “Cor-de-Rosa Choque”.
Ativismo
Além da causa animal, Rita foi voz ativa para outras questões políticas, especialmente durante a ditadura militar.
Suas músicas se referiam à sexualidade feminina e abordavam temas considerados tabus à época, como menstruação e menopausa. A artista teve muitas de suas letras censuradas e chegou a ser presa em 1976, grávida do primeiro filho, condenada a um ano de prisão domiciliar por porte e uso de maconha. Ela passou 15 dias detida e foi solta após uma visita da cantora Elis Regina.
Segundo Rita, sua prisão foi um truque do regime, incomodado com uma figura que representava a liberdade feminina em um período de muito conservadorismo. A artista chegou a dizer que preferia um apelido que relembre esse seu papel do que o de “rainha do rock”, como é conhecida por muitos. “Gosto mais de ser chamada de ‘padroeira da liberdade’ do que ‘rainha do rock’, que acho um tanto cafona”, disse em entrevista à revista Rolling Stone Brasil.
Rita revolucionou na música e na política, mas também deixou um legado no mundo da moda. Seus figurinos extravagantes, metalizados e cheios de cores e estampas são sua marca registrada – assim como os cabelos e a franja ruivos e os óculos redondos.
Em meados de 2014 começou a deixar os cabelos brancos e abandonou o icônico visual ruivo. Em entrevista de 2015 disse “Adorei ter sido ruiva, mas encheu o saco”. No ano seguinte, lançou sua autobiografia.
Rita deixa o marido, Roberto de Carvalho, e três filhos. O também guitarrista Beto, nascido em 1977, João (1979) e Antônio (1981) , e os netos Izabela e Arthur.
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Wikimedia Commons 4. Ativismo
Ela era feminista nas músicas e na postura, mas não se declarava assim. “Nunca carreguei bandeira de feminismo. Eu era a única menina roqueira no meio de um clube só de bolinhas, cujo mantra era: para fazer rock tem que ter culhão. Eu fui lá com meu útero e meus ovários – e me senti uma igual, gostassem eles ou não. Sou do tempo em que o feminismo era queimar sutiã no meio da rua, e eu nunca tive peito suficiente para sequer usar sutiã. Talvez eu seja uma feminista gauche.”
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Wikimedia Commons Rita Lee, 1972
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Wikimedia Commons Rita Lee, 1972
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4Imagens/Getty Images 3. Pioneirismo
Temas que eram tabu na época em que ela surgiu no cenário da música, como sexo, drogas e menstruação, viraram algumas das músicas mais tocadas nos rádios. Lança Perfume, Mania de Você e Cor de Rosa Choque trazem esses temas.
Rita criou um jeito diferente de cantar, que até Elis Regina imitou em Alô, Marciano, sucesso na voz da cantora e composta por Rita e Roberto. Quase tudo o que fazia tinha uma marca registrada. Seus figurinos, em boa parte criados por ela e o cabelo vermelho que teve vários tons ao longo da carreira eram algumas dessas marcas.
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Rui M. Leal/Getty Images Rita Lee se apresentando no Coliseu dos Recreios em julho de 2008 em Lisboa, Portugal
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Alexandre Cardoso/Wikimedia Commons Rita Lee no Credicard Hall em 2010
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Paulo Whitaker/Reuters Caetano Veloso, Rita Lee e Gilberto Gil em carro alegórico da Escola de Samba Águia de Ouro durante carnaval de 2012 no Sambódromo do Anhembi, em São Paulo
4. Ativismo
Ela era feminista nas músicas e na postura, mas não se declarava assim. “Nunca carreguei bandeira de feminismo. Eu era a única menina roqueira no meio de um clube só de bolinhas, cujo mantra era: para fazer rock tem que ter culhão. Eu fui lá com meu útero e meus ovários – e me senti uma igual, gostassem eles ou não. Sou do tempo em que o feminismo era queimar sutiã no meio da rua, e eu nunca tive peito suficiente para sequer usar sutiã. Talvez eu seja uma feminista gauche.”