Claudia Goldin tornou-se este ano a primeira mulher a ganhar o Prêmio Nobel de Economia sozinha e não como parte de um grupo de acadêmicos.
Entre outras realizações, ela é também a primeira mulher a obter o título tanure em economia na Universidade de Harvard – destinado a estudiosos que demonstraram excelência em pesquisa e ensino.
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Quando o Comitê do Nobel anunciou o prêmio de Goldin, observaram o seu papel em ajudar a esclarecer a razão pela qual a igualdade salarial continua tão ilusória.
No Brasil, a remuneração recebida pelas mulheres representa 78% do rendimento dos homens (uma diferença de mais de 20%), segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Nos EUA, a diferença entre os rendimentos médios de homens e mulheres diminuiu muito lentamente, a uma taxa de cerca de 0,5% ao ano, desde que a Lei de Igualdade Salarial foi aprovada em 1962, de acordo com o Comitê Nacional de Equidade Salarial. Em 2019, as mulheres ganhavam, em média, US$ 0,77 para cada US$ 1 recebido pelos homens.
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Penalidade da maternidade e desigualdade salarial
Há muitas décadas, o potencial de remuneração das mulheres era limitado principalmente pelas suas oportunidades educacionais e perspectivas dentro da sociedade. Hoje, à medida que as mulheres alcançam e ultrapassam os homens em termos de escolaridade e qualificações, “a maior parte da diferença de rendimentos ocorre agora entre homens e mulheres na mesma profissão, e surge em grande parte com o nascimento do primeiro filho”.
Essa conclusão faz parte de um grupo mais amplo de consequências vividas pelas mulheres quando se tornam mães, chamado de “penalidade da maternidade”. Esse foi um dos principais focos de um artigo publicado por Goldin e pelos co-autores Lawrence Katz e Marianne Bertrand, em 2010, sobre as trajetórias de carreira de pessoas com MBA.
Nele, os pesquisadores descobriram que homens e mulheres com MBA têm perspectivas de carreira e ganhos quase equivalentes imediatamente após a graduação. Mas as mulheres que se tornam mães experimentam uma queda acentuada em salários e oportunidades.
Quinze anos depois de concluírem o MBA, apenas 30% das mulheres trabalhavam em tempo integral e tinham filhos. A diferença salarial foi ainda mais gritante. Imediatamente após a formatura, a mulher com um MBA ganhava, em média, US$ 115 mil, e o homem, US$ 130 mil. Nove anos depois, as mulheres ganhariam em média US$ 250 mil, enquanto os homens, US$ 400 mil. A maior parte desse déficit cumulativo pode ser explicada pelo fato de as mulheres terem tirado algum tempo fora da força de trabalho, geralmente para criarem os filhos.
Como eliminar a disparidade salarial?
Há alguns anos, parecia que essas disparidades salariais continuariam como um desafio, uma vez que as mulheres com filhos eram forçadas a escolher empregos com menos demandas e espaço para crescimento na carreira, e, portanto, salários mais baixos, ou abandonar totalmente a força de trabalho para se dedicar aos cuidados dos filhos.
Goldin estudou farmacêuticos — uma profissão remunerada, com uma pequena desigualdade salarial entre gêneros e que dava espaço para se dedicar à família.
A pesquisadora descobriu que a ascensão de grandes farmácias nos EUA com políticas e tecnologias bem estabelecidas facilitou que os farmacêuticos trocassem os turnos. Os horários flexíveis pareciam um caminho promissor para a paridade salarial, mas que exigiria mudanças estruturais e tecnológicas para atrair a maioria dos empregadores. Ela se perguntou: “o que acontece quando uma mudança tecnológica reduz os custos de proporcionar essa flexibilidade?”
Mais de três anos após o início da pandemia de Covid-19, os dados sobre essa questão começaram a chegar. Na Conferência de Trabalho Remoto este ano, Emma Harrington, professora de economia na Universidade da Virgínia e especialista em trabalho remoto, compartilhou descobertas iniciais sobre o impacto do trabalho remoto sobre a penalidade da maternidade durante a pandemia.
Ela e seu colega Matthew E. Khan perceberam que, antes e durante a pandemia, os avanços tecnológicos aumentaram a possibilidade do home office para trabalhadores com diplomas universitários em áreas como finanças e marketing. “Em campos em que o trabalho remoto aumentou, as disparidades da maternidade no emprego diminuíram”, diz Harrington.
Um aumento de 10% no trabalho a partir de casa estava correlacionado com um acréscimo de quase 1% no emprego das mães. “Essas tendências demonstram que a ascensão do trabalho remoto tornou um conjunto mais amplo de empregos favoráveis à família.”
Embora as descobertas sugiram que regimes flexíveis melhoram os resultados de emprego das mães no longo prazo, “esses ganhos ainda não foram concretizados nos dados”.
Não são só as mulheres e mães que querem flexibilidade
O Relatório Mulheres no Local de Trabalho de 2023 da McKinsey e LeanIn descobriu que tanto as mulheres como os homens consideram a flexibilidade para trabalhar de onde e quando querem como os principais benefícios que buscam hoje – logo depois do plano de saúde.
Mesmo com o aumento da participação feminina na força de trabalho, as mulheres continuam claramente subrepresentadas no topo das organizações devido ao degrau “quebrado”. O fenômeno de mulheres perdendo promoções importantes no início das suas carreiras devido, em parte, a uma interrupção para criar os filhos em um momento-chave da trajetória profissional.
Assim como Goldin descobriu no seu estudo sobre profissionais com MBAs, as mulheres ainda perdem promoções e salários mais elevados. Mas talvez não por muito tempo.
“Uma em cada cinco mulheres afirma que a flexibilidade as ajudou a permanecer na organização ou a evitar a redução do seu horário”, conclui o relatório da McKinsey.
Mulheres que trabalham em regime flexível em 2023 são tão ambiciosas em relação às suas carreiras como os seus pares. E também têm três vezes mais probabilidades de dizer que a flexibilidade ajuda a obter sucesso em suas carreiras do que em 2021.
Em outras palavras, o trabalho flexível ainda não teve um impacto mensurável na desigualdade salarial, mas ainda é cedo e há sinais promissores.
Claudia Goldin passou mais de quatro décadas mapeando a forma como a sociedade barrou a participação das mulheres na força de trabalho e o seu potencial salarial.
Talvez caiba aos seus herdeiros intelectuais na economia de gênero e trabalho acompanhar o que acontece com as carreiras femininas quando a estrutura do local de trabalho muda, e abrir espaço para as mulheres, e especialmente as mães, participarem, avançarem e liderarem.
*Lisa Conn é colaboradora da Forbes USA. Ela é cofundadora e CEO da Gatheround, empresa que ajuda equipes remotas a melhorar sua interação e impulsionar a cultura da empresa.
(traduzido por Fernanda de Almeida)