Desde o encerramento dos Jogos de Paris deste ano, um recorde ficou marcado na história: Maria Carolina Santiago se consagrou como a atleta mulher com mais medalhas douradas pelo Brasil na Paralimpíada: ela voltou para casa com três ouros e duas pratas. “Confesso que não sabia que podia atingir essa marca, nem estava preparada”, conta a nadadora, que compete na classe S12 (deficiência visual). Carol tem a síndrome de Morning Glory, alteração congênita na retina que reduz seu campo de visão.
O resultado coroou anos de dedicação e superação, desde sua estreia nos Jogos Paralímpicos de Tóquio em 2021, aos 36 anos. “É muito difícil ter certeza do que você está fazendo no esporte, então sair com esse resultado é gratificante.”
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A pernambucana voltou da sua primeira Paralimpíada com três ouros, uma prata e um bronze. “Foi um incentivo para ser ainda melhor, mas ninguém chega a um pódio sozinho”, diz ela, destacando o apoio da sua equipe.
Agora, de volta ao Brasil e aproveitando as merecidas férias, ela já vislumbra novos desafios além das piscinas. Um de seus maiores sonhos é a maternidade, e nos próximos anos a medalhista paralímpica pretende equilibrar a carreira esportiva com esse desejo. “Sendo atleta mulher, essa é uma questão que deve ser abordada. Preciso ter planos, porque não quero deixar o esporte.”
Apesar de ainda não ter definido se competirá em Los Angeles 2028, Carol garante que, se decidir participar, levará a mesma garra que a conduziu ao topo. “Ainda não tenho um objetivo travado, mas posso garantir que tudo o que eu fizer será com 100% de corpo e alma.”
Águas passadas
Imersa no mundo da natação desde pequena, Carol Santiago herdou a paixão pelo esporte da família: sua mãe e tia eram atletas de vôlei e incentivaram as crianças a praticar alguma atividade física. “Não tinha a opção de não fazer esporte, sempre fez parte da vida da minha família.”
Devido à síndrome, Carol não podia fazer nenhum esporte de atrito. Seguiu os passos do irmão mais velho na natação e, aos oito anos, já encarava seu primeiro campeonato. “Eu era péssima, mas queria nadar. Na natação tive minhas primeiras amizades, viagens, e me sentia parte de algo, independentemente da minha deficiência.”
Apesar da paixão pelo esporte, a atleta precisou fazer uma pausa na carreira esportiva. Aos 17 anos, teve um acúmulo de água na retina e ficou sem visão completa por oito meses. “Fiquei com uma tristeza muito grande e não queria mais competir”, conta a nadadora, que sofreu o mesmo acúmulo outras vezes ao longo da trajetória.
Volta por cima
Carol Santiago só foi mergulhar em competições profissionais em 2018, quando conheceu o Movimento Paralímpico. “Minha relação com o esporte mudou: encontrei o meu lugar e não precisei mais ser aceita.”
Mas aos 33 anos, a nadadora demorou a superar a crença de que não tinha idade para o esporte de alto rendimento. “Me achava velha e meus próprios preconceitos não me permitiam melhorar.”
Para alcançar o sucesso físico e mental nos Jogos, Carol Santiago investiu na sua preparação psicológica e precisou superar os desafios de estar em uma comissão técnica até então majoritariamente masculina. “Não tinha abertura para conversar sobre ciclo menstrual, por exemplo. Dependendo do momento do mês, nem no pódio eu subiria”, conta. Posteriormente, a nadadora recebeu o apoio de uma ginecologista especializada em esporte para ajudá-la no preparo para as competições.
Legado além das piscinas
Comprometida com as novas gerações, Carol Santiago faz questão de marcar presença todos os dias na piscina do Centro de Treinamento, onde encontra fãs e atletas. “Posso ser mais útil com esse contato de igual para igual, principalmente com os jovens. A responsabilidade é muito maior do que só ganhar uma medalha.”