Prestes a completar dois anos à frente da operação brasileira da Sanofi, farmacêutica francesa presente em mais de 100 países e uma das maiores do mundo, Félix Scott se diz impressionado com o nível de abertura da população local – profissionais, médicos e pacientes – à inovação. O diretor-geral da multinacional, que já comandou também as subsidiárias da companhia na Venezuela e no México, revela que, além dessa identificação com novas tecnologias, que facilita qualquer nova implementação, o país é tudo que uma empresa cujo negócio é desenvolver medicamentos poderia desejar.
“O nível de diversidade da população brasileira é muito alto. É como ter vários países em apenas um. E essa é uma característica muito importante para as pesquisas. Existem doenças que ocorrem com mais incidência no Nordeste, como, por exemplo, a infecção por Helicobacter pylori, uma enfermidade gástrica. Esse tipo de ocorrência nos dá a oportunidade de aprofundar nossos estudos até entender o contexto e propor soluções que vão muito além do medicamento. Elas passam pelo empoderamento do paciente, por meio de protocolos para precaução e previsão da doença”, explica o executivo.
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Para Scott, essas duas características – abertura tecnológica e diversidade – têm sido fundamentais para conduzir com eficiência algo que a companhia considera a espinha dorsal de seu negócio: a inovação com propósito. Ele explica que o foco da Sanofi está no paciente – e que é a partir daí que tudo acontece. “Não adianta participar dos melhores congressos médicos do mundo, entender o que tem de novidade e trazer para um país que não vive o problema para o qual elas foram desenvolvidas. Na Sanofi fazemos o contrário: mapeamos as necessidades dos pacientes e então buscamos a solução.”
Segundo o executivo, a multinacional atua em três frentes para entregar inovação. A primeira delas é global, capaz de endereçar necessidades mais complexas e comuns a um grande número de pessoas, qualquer que seja o país de origem. É nesses centros de desenvolvimento, que ficam em Boston (Estados Unidos) e Frankfurt (Alemanha), que são conduzidas pesquisas relacionadas à oncologia e vacinas, por exemplo. Já os centros regionais – dos quais Campinas, no interior de São Paulo, é o maior do mundo – executam localmente as pesquisas clínicas das inovações desenvolvidas em nível mundial e desenvolvem soluções para necessidades específicas dos países nos quais estão localizados.
Por fim, Scott cita a diversidade – desta vez do time – como condição sine qua non para continuar inovando. “Não há como criar nada novo se não entendermos, com profundidade, as demandas dos pacientes. E obter esse grau de entendimento só é possível se tivermos, na nossa equipe, uma amostra representativa da população brasileira”, diz. “Temos que reconhecer que repetir o padrão de colaboradores, em qualquer que seja a área, cria muitas dificuldades para fazer qualquer coisa diferente.”
Essa mentalidade tem acelerado contratações de negros, mulheres, LGBTs e PcDs. Nos últimos meses, 40 colaboradores com deficiência foram incorporados ao quadro da companhia no país, que conta, atualmente, com cerca de 3,8 mil funcionários por aqui. Scott conta que novas aquisições de pessoal também estão levando em conta a diversificação acadêmica.
“Ainda não estamos no patamar que gostaríamos, mas vamos chegar lá. É uma jornada cheia de desafios. Dos quatro gerentes gerais, apenas uma é mulher. Isso precisa mudar. Implantamos programas para o desenvolvimento acelerado das mulheres e faremos o mesmo para os outros grupos. Se não encontrarmos alguém habilitado no mercado para as nossas necessidades, precisamos contratar esse profissional e desenvolvê-lo internamente. Para isso, temos representantes de cada um desses grupos, encarregados de atrair esses potenciais talentos e criar um entorno para que eles cresçam. Não adianta ficar sentado achando que eles vão surgir do nada ou procurar no LinkedIn. A rede social é uma ótima ferramenta, mas não representa a diversidade brasileira”, diz o diretor-geral, explicando que o próximo passo é começar a exigir o mesmo dos fornecedores.
TRANSFORMAÇÃO DIGITAL
Assim como aconteceu em todas as companhias, a pandemia também acelerou processos e novas tecnologias na Sanofi. A plataforma de telemedicina que a empresa oferece aos médicos, por exemplo, foi construída em seis semanas. Scott conta que algumas ferramentas já existiam, mas consultas online, prescrições eletrônicas e assinaturas digitais foram agrupadas na mesma solução, integrada com as principais redes de farmácias do país.
As formas de comunicação com os médicos também foram incrementadas, assim como eventos, inclusive de outras áreas. “Já sabemos que no ano que vem não teremos congressos importantes presenciais. Tudo será online e isso não é, necessariamente, ruim. Notamos um aumento expressivo no número de participantes nas versões digitais dos eventos”, diz o executivo, contando que a roda de negociação comercial do último trimestre foi toda online. “Fizemos 128 reuniões nesse formato, de forma quase simultânea, e funcionou muito bem.”
Scott atribui à mobilidade a mesma importância que dá à diversidade da equipe e ao foco no paciente no processo de inovação. “Estamos usando tecnologias móveis digitais também para os pacientes. Temos, por exemplo, um app de diabetes que permite que eles monitorem a doença e entendam o que acontece no dia a dia. Essas informações são tratadas com a ajuda da inteligência artificial de forma a indicar as doses de insulina mais recomendadas em cada caso”, conta. “Assim como já acontece no entretenimento e na educação, a saúde também vai operar, em grande parte, de forma digital, sob demanda”, diz o executivo.
EXEMPLO VERDE E AMARELO
Scott revela que a operação brasileira da Sanofi – a primeira em vendas na América Latina e a quinta no mundo – tem se destacado. O Brasil é líder em transformação digital (ao lado da China) e há exemplos de inovação desenvolvidos por aqui que estão sendo exportados para outros países. Não é à toa que, só no ano passado, mais de € 13 milhões foram investidos na Unidade de Estudos Clínicos que fica em São Paulo.
Um desses exemplos é a VitaMedley, uma linha de monovitaminas e multivitamínicos desenvolvida pela Medley, farmacêutica brasileira comprada pela Sanofi em 2009, e lançada em junho – período em que o consumo desse tipo de produto aumentou consideravelmente no país. “Esse é um produto desenvolvido por brasileiros para brasileiros, mas que já está sendo exportado para outros países da América Latina”, conta Scott.
Outro caso é a combinação de dois medicamentos contra o colesterol alto, a rosuvastatina e a ezetimiba, que até então eram comercializados separadamente mas, juntos, mostraram-se muito mais eficientes. “Quando apresentamos o projeto em nível global, muitas regiões se interessaram e o desenvolvimento ganhou a participação de outros países, mas com liderança brasileira”, conta o executivo. “Até 2030, metade das vendas no Brasil virá de produtos desenvolvidos em Campinas”, diz.
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