O processo de aquisição de um imóvel é um dos momentos mais importantes da vida da maioria das pessoas, mas também pode ser o mais burocrático e estressante. São aproximadamente 190 passos desde o início da jornada até a conclusão do negócio, que tradicionalmente envolvem diversas etapas presenciais como visitas e o comparecimento à cartórios.
Isso tudo tem mudado graças à transformação do processo de compra e venda de imóveis, acelerado durante a pandemia. Uma das protagonistas neste espaço, a imobiliária digital e plataforma de inteligência de mercado Loft, nada de braçada em um cenário em que a compra, venda, reforma e financiamento de imóveis online se torna uma possibilidade para um público cada vez maior.
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A proptech fundada em 2018 e avaliada em mais de R$ 1 bilhão, enfrentou uma queda drástica em seu volume de negócios no início da crise da Covid-19 entre março e maio, seguida de uma rápida recuperação em junho, de volta aos níveis do período pré-pandemia. O tráfego no site mais que dobrou e a empresa diz servir mais de 5 mil clientes simultaneamente nos diversos estágios da jornada imobiliária.
Além disso, a operação de compra e venda de imóveis da empresa teve um crescimento de mais de 28 vezes entre o ano passado e o anterior: segundo a Loft, o número de clientes mensais subiu de 85 em dezembro de 2019 para 2,4 mil no mesmo mês em 2020. Isso se deve a fatores como a introdução do modelo marketplace, em que a empresa intermedia operações entre compradores e vendedores, adicionada à modalidade iBuyer, em que a Loft compra o imóvel e o reforma para vender.
Segundo Mate Pencz, cofundador e coCEO da startup, a Loft conseguiu atravessar a turbulência da crise devido a outros fatores como a visão estratégica da empresa, traduzida no trabalho anterior e durante a crise em transformar a jornada de compra e venda do cliente, bem como o fato de a companhia estar capitalizada – com um aporte anunciado em janeiro de 2020, a Loft se tornou o 11º unicórnio brasileiro.
“Nossa crença fundamental é que a experiência de compra de imóveis será intermediada por plataformas ou empresas de tecnologia, da mesma forma em que a Amazon ou Mercado Livre intermediaram o processo de e-commerce“, disse o fundador a esta coluna, em sua primeira entrevista de 2021.
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A Loft oferece a possibilidade de percorrer todo o processo de compra e venda online, da visita até o registro da escritura. Além disso, oferece serviços de reforma e financiamento, reforçados com as aquisições da Decorati em 2019 e da Investmais, anunciada em setembro de 2020. Em breve, a startup deve anunciar uma nova parceria, no segmento de seguros.
Porém, o nome do jogo para a Loft em 2021 é densidade. A estratégia da empresa, que diz ter mais de 10 mil apartamentos listados em São Paulo e no Rio de Janeiro, é ter mais propriedades por bairro do que focar em territorialidade, abrindo mais praças com poucos imóveis.
“Precisamos chegar cada vez mais perto da experiência do e-commerce, em que você chega no checkout, e nós mostramos como você pode pagar pelo imóvel. Esse processo passa não só por mostrar apartamentos relevantes, mas por um foco redobrado em mostrar todas as alternativas mais baratas de financiamento disponíveis”, pontua o cofundador da startup. “Reforçar a densidade e foco no financiamento é que vai fazer mais pessoas transacionarem conosco, e gerar clientes satisfeitos no fim da jornada.”
Segundo Pencz, apesar de ter as peças que precisa para levar esta visão a cabo por ora, a Loft deve fazer mais aquisições, no entanto isso deve ser feito mais como forma de reforçar o que já existe, do que abrir novas linhas de atuação. “Estamos em uma fase em que vamos focar na melhoria incremental da proposta de valor do negócio – não estamos reinventando a roda”, ressalta.
Apesar de ter planos declarados de internacionalização e observar dinâmicas favoráveis para o seu negócio, como maior transparência de preços, em mercados como o Chile, a Loft não divulga quando, nem em qual país deve entrar primeiro.
“Nós temos os dados e um plano de expansão, mas estamos aguardando a próxima fase da pandemia e como isso vai evoluir antes de anunciar o timing específico desse projeto”, aponta Pencz.
CRÉDITO
Para além de um movimento em que as pessoas estão repensando seus espaços de moradia (veja “Diversificação”, abaixo), o crescimento da Loft de forma geral se deve principalmente a baixos juros para financiamento, segundo Pencz. “Uma pessoa confiante sobre seu futuro e trabalho hoje compra 30% a mais do que comprava há um ano ou dois”, argumenta o fundador sobre o poder de compra no mercado de imóveis residenciais.
“Isso cria uma oportunidade interessante para nós, pois vemos que a taxa de imóveis comprados com financiamentos vem crescendo, por conta dos juros baixos”, aponta o fundador, acrescentando que os millennials, consumidores entre 23 e 38 anos, têm demonstrado uma maior propensão em tomar crédito do que em se descapitalizar. “É uma mudança cultural, em que estes consumidores investem de 20%-30% de seu patrimônio em um imóvel, e o restante em investimentos com maior liquidez.”
Além disso, Pencz observa que a migração de cada vez mais tipos de transações para o digital apresenta a oportunidade de oferecer cada vez mais produtos e serviços para os mesmos consumidores finais. “Compradores vão começar suas jornadas em uma plataforma e evoluir o processo em outra empresa parceira”, aponta o empreendedor, que acredita no conceito de ecossistema e se diz aberto a novas alianças.
“Reconhecemos que, por exemplo, não somos um banco, e não oferecemos financiamentos da mesma forma. Mas por outro lado, acreditamos que somos os melhores em precificação de imóveis e na facilitação de transações neste setor”, avalia Pencz, que prevê uma crescente sobreposição entre plataformas como a Loft e empresas como bancos digitais.
DADOS
Os dados que a Loft gera e analisa sobre o mercado imobiliário representam um “grande ser vivo” na empresa, que precisa ser constantemente melhorado, para entregar níveis cada vez maiores de precisão. Segundo Pencz, dados são a principal ferramenta da empresa para endereçar o que considera ser o maior desafio do setor, que é o gap entre os preços que proprietários pedem e valores reais de mercado.
“Quando olhamos para mercados como os Estados Unidos e Europa, há muito mais transparência e o gap entre os valores [que hoje está em cerca de 20% no Brasil] é muito menor, vende-se e compra-se muito mais rápido”, ressalta o cofundador da startup.
A ideia da Loft é aumentar seus esforços em dados do mercado, que incluem as transações que a própria empresa faz pelo modelo iBuyer, para apoiar o processo de descoberta de preços por parte de consumidores. Na prática, a startup vai ilustrar com números que, se consumidores listarem seus imóveis na plataforma com valores dentro da média de mercado, a venda vai acontecer mais rápido.
“[Transparência em relação a preços] é algo que beneficia muito o mercado e, obviamente, a nós também”, ressalta Pencz, que também acredita no poder dos dados para combater a corrupção. A Loft encaminhou neste mês 43 alertas de tentativas de transações suspeitas em sua plataforma, por motivos que incluem valores muito acima da média de mercado, para o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão do governo federal que trata de crimes financeiros como lavagem de dinheiro.
DIGITALIZAÇÃO
Apesar da compra 100% online ser possível, clientes que escolhem fazer suas transações imobiliárias dessa forma representam a minoria dos negócios da Loft, segundo Pencz. Isso inclui, por exemplo, brasileiros que moram fora e queriam conduzir a venda de seus imóveis sem ter que voltar para o Brasil. No entanto, as nuances observadas nos últimos meses indicam uma mudança de comportamento em curso.
Segundo o cofundador da Loft, um comprador típico de imóveis na plataforma visitaria entre sete e 10 apartamentos presencialmente antes de fazer a compra. Hoje, consumidores visitam entre 15 e 30 imóveis online, e falam com corretores em detalhes via WhatsApp, e o processo informa e culmina em duas a três visitas presenciais, antes da decisão final.
“Vemos que por conta de força do hábito ou inércia, muitos de nós iam a agências bancárias para fazer transações e hoje muitos fazem estas mesmas tarefas via apps”, explica Pencz. “Por ser uma transação grande, muitos ainda querem ver um imóvel antes de comprar de fato, mas a realidade é que não é preciso ver tantos imóveis [presencialmente] assim antes de decidir.”
Outra tendência citada pelo empreendedor é que na base de clientes da Loft, predominantemente formada por profissionais de colarinho branco de classe média alta, a adesão de clientes de mais de 50 anos aumentou seis vezes desde o início da pandemia. Isso se deve a fatores como a segurança oferecida por visitas à distância, bem como o aumento no letramento digital dessa população.
“Muitas pessoas [concluíram] que, agora que estão fazendo compras de supermercado online, consomem no Mercado Livre e pagam contas por um app, podem pensar em procurar por sua próxima casa na internet também”, pontua.
DIVERSIFICAÇÃO
Ainda sobre tendências imobiliárias, Pencz acredita que ainda não haverá um êxodo para o interior no Brasil. Apesar de muitos consumidores relatarem compras de imóveis no interior durante a pandemia, o fundador diz que é raro ver pessoas que tenham abandonado a cidade de vez: “A [decisão de permanecer nos grandes centros] tem uma grande correlação com a qualidade de infraestrutura dentro e fora das cidades”
No entanto, clientes Loft têm aumentado o escopo geográfico de suas buscas, já que muitos trabalham predominantemente de casa, e priorizam a proximidade a escolas. Outra tendência observada no negócio de reformas da Loft, é uma demanda quase uniforme por cozinhas abertas para acomodar o aumento das refeições em casa, bem como a busca por imóveis mais baratos com metragem maior.
E, ainda, o cofundador diz que a maioria das pessoas ainda quer morar em apartamentos: “[Um possível aumento de demanda por casas] era um dos nossos pontos de interrogação no início da pandemia. Essa tendência não se confirmou, por motivos que incluem segurança, que ainda é um fator importante para compradores”, aponta.
Considerando os movimentos do setor e o plano estratégico da empresa, Pencz prevê que a Loft deve melhorar a escala e a qualidade de sua oferta nos próximos meses, removendo o atrito da jornada imobiliária online para entregar uma experiência mais fácil, transparente e diversificada. Esse último objetivo passa pelo crescimento da Uotel, startup comprada em 2020 que propõe um misto de Airbnb com hotel, bem como o desenvolvimento do negócio de alugueis da Loft, que atualmente conta com cerca de 600 imóveis e é visto pela empresa como um estágio intermediário, que atende quem ainda não decidiu comprar.
“Uma das coisas que a maioria das pessoas não entende – e que já é realidade – é que somos o maior e mais desenvolvido marketplace transacional para o mercado residencial imobiliário fora da China e Estados Unidos”, ressalta o empreendedor. “Nos próximos meses, mais do que aluguel ou nossos outros negócios paralelos, nosso foco será na venda e compra, além de tornar o processo de financiamento o mais simples e conveniente possível.”
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O QUE MAIS ME CHAMOU A ATENÇÃO NESTA SEMANA
ESQUECIMENTO
A primeira sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou ontem (3) um julgamento que pode definir o posicionamento do Brasil sobre o direito ao esquecimento. A ação diz respeito ao direito de uma pessoa de não permitir que um fato ocorrido em determinado momento de sua vida seja exposto ao público em geral indefinidamente.
O recurso foi acionado no Brasil pela família de Aída Curi, assassinada nos anos 1950 em um caso de grande repercussão, por conta da reconstituição do ocorrido em 2004, no programa “Linha Direta”, da TV Globo, sem autorização. O direito ao esquecimento, que também compreende o direito de remoção de informações de mecanismos de busca online, é um conceito que foi colocado em prática na União Europeia, e também está em vigor na Argentina.
O conceito em prática é controverso, pois envolve as diversas nuances da liberdade de expressão e direito à privacidade, e por outro lado levanta questões como censura e o risco de movimentos que buscam reescrever a história. Do ponto de vista da indústria de tecnologia, a Federação das Associações das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assesspro) tem a visão de que uma decisão a favor do direito ao esquecimento pode gerar uma série de processos judiciais, assim como obrigações para plataformas em relação à criação de uma “lista proibida” de informações que não podem ser disponibilizadas; a associação entende que isso restringiria o direito à informação. O julgamento foi retomado na sessão de hoje (4), que ainda estava em andamento na conclusão desta coluna.
TURNÊ
Naa (2), o ministro das Comunicações, Fabio Faria, começou uma viagem cujo objetivo é conhecer os modelos de tecnologia 5G disponíveis no mundo. A comitiva conta com a participação de Bruno Dantas, Vital do Rêgo e Walton Alencar, todos ministros do Tribunal de Contas da União; do secretário de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Flávio Rocha; e de representantes dos ministérios da Defesa e das Relações Exteriores.
Faria deve visitar autoridades da Suécia, onde ficam empresas líderes da tecnologia, como a Ericsson; a Finlândia, que é a base da Nokia; a Coreia do Sul, onde fica a sede da Samsung, além do Japão, país da NEC e da Fujitsu, além da China, base da fornecedora de equipamentos Huawei. A lista de empresas que o governo visitará não foi divulgada.
A visita ocorre logo após a publicação de uma portaria do Ministério das Comunicações na última sexta-feira (29) que estipula uma série de diretrizes e obrigações para as teles em relação ao leilão da quinta geração de telefonia. Uma destas exigências é uma rede privativa para uso do governo, a ser construída pelas operadoras que vencerem a licitação.
A demanda pela estrutura exclusiva para Bolsonaro, que seria operada pela Telebras, foi a forma encontrada pelo governo de permitir a participação da Huawei no fornecimento de equipamentos para o 5G. As teles se opõem aos investimentos obrigatórios, que adicionariam bilhões à conta do 5G, mas antes de embarcar, Faria já ameaçou que pode aumentar o preço das licenças de faixas do 5G caso as empresas se recusem a cumprir as exigências, tornando a licitação arrecadatória.
INDÚSTRIA 4.0
A adoção de tecnologia e inovação será crucial para recuperar o crescimento do setor de indústria, segundo um estudo publicado hoje pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em parceria com a empresa de inovação aberta SOSA. O estudo da CNI ressalta que o setor de indústria responde por 21,6% do PIB brasileiro, que, segundo a entidade, deve cair 4,2% neste ano, depois de uma crise que “só se compara à Grande Depressão de 1930”.
A indústria representa 70,8% de todas as exportações de bens e serviços e 76,4% de todos os investimentos empresariais em pesquisa e desenvolvimento, diz o estudo. A CNI nota que 70% do setor buscou se adaptar à crise, com medidas como alguma modernização da produção, mas a retomada ao crescimento e a criação de empregos representam um grande desafio para o setor. Além disso, a adoção tecnológica no setor ainda deixa a desejar, segundo o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, que ressalta que o Brasil ocupa a 62ª posição no Índice Global de Inovação: “Existem exemplos de excelência em todo o país, mas ainda há muito a ser feito para que a indústria no Brasil realmente se torne mais competitiva”, ressalta.
Para a CNI, a saída é a abordagem de Indústria 4.0, com uso intensivo de tecnologias associadas à digitalização, ciência de dados, big data, machine learning, inteligência artificial, robótica e manufatura avançada. Para tornar esta visão realidade, propostas da CNI incluem parcerias entre o setor e o governo para o desenvolvimento de políticas públicas para acelerar a inovação na indústria, além de criação de mão de obra qualificada para responder às novas demandas do mercado.
“O futuro da indústria envolve a criação de políticas para a ciência, tecnologia e inovação que aumentem a presença do Brasil em diferentes mercados, criem empregos qualificados e apoiem negócios lucrativos e sustentáveis”, diz Andrade, acrescentando que existem “enormes desafios” a enfrentar. “Porém, condições precisam ser criadas para criar e disseminar soluções tecnológicas de ponta e inovações no setor produtivo”, aponta.
DIREITOS INFANTIS ONLINE
Hoje (4), o Comitê dos Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (ONU) adotou o Comentário Geral 25, que trata dos direitos infantis em relação ao mundo digital. Um Comentário Geral (CG) é um documento oficial que estabelece como a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (UNCRC) deve ser interpretada e implementada pelos países – neste caso, em relação à internet.
Trata-se de um marco: assim como a própria UNRC, um CG deve valer para todas as crianças, independentemente de suas habilidades ou circunstâncias, e ser aplicado em todos os países, ricos ou pobres, independentemente de inclinação política. O documento vai chegar nas mesas de todos os governantes, com detalhes sobre o que o ambiente digital significa em termos dos direitos e liberdades civis das crianças, além de outros desdobramentos, como seus direitos à privacidade online, a brincar, proteção, educação e não- discriminação.
O CG também explica por que, e como os países e outros detentores de poder devem agir neste sentido. Países como o Brasil, que ratificou a Convenção em 1990, são responsáveis pelas disposições da UNCRC e devem relatar periodicamente como cumpriram essas obrigações ao Comitê da ONU. Além disso, os países também são obrigados a garantir que responsabilidades com os direitos das crianças sejam cumpridas – incluindo empresas e outros, cujas atividades tenham um impacto significativo sobre as crianças.
Angelica Mari é jornalista especializada em inovação e comentarista com duas décadas de atuação em redações nacionais e internacionais. Colabora para publicações incluindo a FORBES (Estados Unidos e Brasil), BBC e outros. Escreve para a Forbes Tech às quintas-feiras
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