O futuro da beleza é pautado por ciência e tecnologia: esta é a premissa que orienta a estratégia da L’Oréal. Com ambições de se tornar uma beauty tech, a gigante de cosméticos lidera uma série de iniciativas relacionadas à inovação para atender as necessidades de uma diversa base de consumidores.
A multinacional precisou navegar por mudanças inéditas na pandemia, e o declínio do mercado global de beleza, que chegou a cerca de 8%. No entanto, o grupo reportou uma recuperação do impacto da crise em seus resultados para o primeiro semestre de 2021, divulgados em agosto. Vendas no período alcançaram 15 bilhões de euros, um aumento de 6.6% em relação ao segundo semestre de 2019: a América Latina teve uma das melhores performances do grupo, com um crescimento em vendas de 32,8% puxado pelo Brasil.
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Em entrevista à Quem Inova sobre as prioridades estratégicas da companhia, o presidente da empresa no Brasil desde abril de 2021, Marcelo Zimet, atribui a performance positiva no Brasil a fatores como a sofisticação digital do grupo desde a emergência da pandemia. “A ciência e a tecnologia tiveram um papel crucial na obtenção destes resultados, mas percebemos que o foco nessas áreas também será um grande acelerador para o futuro”, ressalta.
TENDÊNCIAS
A estratégia de Zimet é informada por grandes tendências de mercado: segundo o executivo, há a questão da exigência dos consumidores – mulheres brasileiras têm a rotina capilar mais elaborada do mundo: usam, em média, 5 produtos capilares diariamente, enquanto as francesas, em comparação, usam uma média de 3 – e uma maior propensão a investir no autocuidado. “Já percebíamos isso antes da pandemia e [a ênfase] no bem-estar veio para ficar”, pontua.
O público também sofisticou seus hábitos de consumo via internet, segundo o executivo, e isso pauta as prioridades da empresa: “Continuaremos tendo um grande crescimento em vendas online que não deve desacelerar, independente de uma [plena] volta das lojas físicas. As pessoas vão voltar a ter uma experiência presencial do produto, mas isso não vai substituir o digital”, aponta.
Segundo Zimet, o peso do e-commerce no faturamento local triplicou em 18 meses, e a empresa incrementou sua plataforma digital no Brasil com ferramentas que já tinham sido desenvolvidas para outros mercados. Um exemplo é o virtual try-on, recurso para experimentar maquiagens online criado pela Modiface, startup de realidade aumentada adquirida em 2018.
A ênfase nas vendas online também impulsionou uma mudança na forma de trabalho das equipes, que precisaram se reajustar às novas imperativas. “Tecnologicamente, não mudamos tanto quanto o comportamento do consumidor, que passou a comprar muito mais online. O time precisou entender que, para alcançar nossas metas, tínhamos que colocar cada vez mais foco no canal digital, que vinha crescendo de forma exponencial”, constata.
DIVERSIDADE
As prioridades da L’Oréal incluem uma atenção especial ao desenvolvimento de produtos que atendam a diversidade do Brasil, como um protetor solar com cor de Garnier, cocriado com a cantora e embaixadora da marca, a cantora Iza, e 50 consumidoras negras; a linha de maquiagem Fit Me, de Maybelline NY, que tem 18 tonalidades; e a linha Cachos do Seu Jeito, de Niely, com 7 produtos para consumidoras com cabelos crespos e cacheados.
“Quando falamos sobre a beleza do futuro, é sobre uma beleza mais sustentável, com fórmulas altamente tecnológicas que contém ingredientes renováveis e naturais, mas também uma beleza muito mais inclusiva e diversa. Trata-se de representar o Brasil no portfólio de produtos e marcas que desenvolvemos”, diz Zimet.
A atividade da companhia em pesquisa e desenvolvimento, que recebeu um investimento de 964 milhões de euros em 2020, inclui um centro de pesquisa no Rio de Janeiro, com foco na vasta gama local de tipos de pele e cabelo: dos 66 tons de pele classificados pela pesquisa da L’Oréal, 55 são encontrados no Brasil, que tem os 8 tipos de cabelo catalogados pela empresa, do mais liso ao mais crespo. Esta enorme variedade de tipos físicos representa o mercado endereçável da empresa.
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Para alcançar estes públicos, a L’Oréal quer equipes igualmente diversas: atualmente, 35% dos colaboradores da empresa de cosméticos no Brasil se autodeclaram negros. Destes, 15% estão na liderança, e Zimet pretende aumentar este percentual para 30% até 2025. O programa de trainees da companhia, em que negros atualmente representam 56% dos candidatos, deve apoiar a meta. “Para acelerar a liderança, também precisamos construir a base”, diz o líder da operação brasileira.
Segundo Zimet, a diversidade do portfólio de produtos é um fator essencial para o sucesso da companhia. “Meu objetivo é ter uma empresa reconhecida não só pelos colaboradores, mas também pelo mercado como uma das mais diversas e inclusivas do Brasil”, frisa o CEO. “Além de ser uma obrigação com respeito ao país, trata-se também de uma grande oportunidade de negócio.”
EVOLUÇÃO
Nos próximos meses, a gigante de cosméticos deve buscar uma maior penetração de mercado com uso intensivo de tecnologia, em frentes como análise avançada de dados, e através do desenvolvimento de novos canais e parcerias estratégicas no ambiente digital. Segundo Zimet, investimentos em startups no universo de e-commerce, ativas em segmentos como live commerce, também devem desempenhar um papel importante no processo.
“A L’Oréal já não se considera uma empresa de beleza e sim uma beauty tech: isso significa que o grupo está considerando aquisições ou parcerias não só de produtos, mas também de serviços e tecnologias”, pontua o executivo.
As aquisições feitas pela companhia nos últimos 18 meses foram predominantemente do segmento de tecnologia, ressalta o CEO. Investimentos recentes feitos através do fundo de investimento BOLD (Business Opportunities for L’Oréal Development) incluem a francesa Carbios, de biotecnologia, a norte-americana Replika, de social commerce, e a britânica Slick, de gestão de dados.
Apesar de Zimet ser o principal responsável por identificar possíveis oportunidades de parcerias ou aquisições de startups no Brasil, o executivo diz que qualquer colaborador pode enviar sugestões diretamente para o BOLD, em Paris. “A maior competição de grandes empresas como nós virá de pequenas companhias muito ágeis e financiadas por grandes grupos financeiros. Temos que poder brigar de igual para igual, e a única forma de fazer isso é descentralizando um pouco dessa responsabilidade por aquisições, de investimento, de parcerias.”
O foco na digitalização tem apresentado desafios, mas também oportunidades de evolução ao líder da empresa no Brasil: “Muitas vezes, começo reuniões pedindo desculpas pela minha falta de conhecimento sobre temas como ciência, tecnologia, diversidade e inclusão, mas também demonstrando toda a minha fome de aprender” pontua Zimet. “Sem essa vontade, é muito difícil ter qualquer tipo de sucesso.”
Segundo o presidente da companhia no Brasil, os esforços da liderança e times na frente digital desde a emergência da pandemia devem gerar ainda mais frutos no futuro. “Conseguimos reduzir ciclos e tomar decisões muito mais rapidamente, um lançamento que podia levar dois anos hoje acontece em metade do tempo, graças ao uso de tecnologia, dados, métodos digitais”, ressalta o executivo. “A L’Oréal pós-Covid certamente será muito mais ágil e dinâmica do que antes.”
Angelica Mari é jornalista especializada em inovação e comentarista com duas décadas de atuação em redações nacionais e internacionais. Colabora para publicações incluindo a FORBES (Estados Unidos e Brasil), BBC e outros. Escreve para a Forbes Tech às quintas-feiras
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