O cuidado com o planeta não é uma alternativa, mas uma obrigatoriedade de grandes empresas. É o que pensa Lorival Luz, CEO global da BRF – uma das maiores empresas alimentícias do mundo e dona de marcas como Perdigão, Sadia e Qualy – a respeito dos desafios enfrentados pela companhia à medida que o comportamento e os hábitos de consumo da sociedade se transformam. “A gente tem que estudar os acontecimentos no mundo. Quando colocamos essas dimensões e perspectivas juntas, isso nos dá uma projeção e uma direção”, comenta o executivo.
Em entrevista exclusiva à Forbes, Luz falou sobre uma das inovações que a companhia começa a apostar: a carne cultivada em laboratório, a partir de células de animais, pode ser responsável por parte da produção de proteínas no mundo nas próximas duas décadas. A BRF, que está no Especial Forbes Agro 100, acaba de anunciar o investimento para essa inovação.
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Em março, a BRF já havia apresentado ao mercado uma parceria com a startup israelense Aleph Farms, para a produção da carne cultivada a partir de proteína animal. Segundo Sérgio Pinto, diretor de inovação da companhia, esse lançamento deverá chegar ao mercado em meados de 2024, com aprovação de órgãos reguladores, testes de eficiência, preço acessível e segurança alimentar à mesa dos consumidores.
A partir da observação de que haverá consumidores para esse tipo de produto, a BRF entende que é o momento de inovar para atender essa demanda. Segundo a Organis (Associação de Promoção dos Orgânicos), em 2020, a venda de produtos orgânicos e sustentáveis teve crescimento de mais de 50% só no Brasil. É nesse tipo de consumidor que a BRF aposta.
Mas não é somente esse nicho que irá crescer. De modo geral, o consumo de proteína animal tende a aumentar no mundo para as três categorias que hoje já são as mais consumidas: a bovina, a suína e o frango. Para atender a esse público, as projeções do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) para o período de 2019 a 2030 mostraram que o maior crescimento de produção brasileira, de 28,1%, será na carne de frango.
No entanto, a liderança das exportações ficará com a carne suína, que deve crescer 36,7%, seguida pela carne de frango (34,3%) e pela bovina (32,7%). A produção total das três proteínas, que estava estimada em 28,2 milhões de toneladas em 2019/20, deve chegar a 34,9 milhões de toneladas no final da próxima década.
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A BRF não divulgou valores de investimento para a produção da nova tecnologia que tem sido tratada como “revolucionária” na companhia. Países como Estados Unidos, Israel e Singapura já têm essa inovação e a ideia da empresa, neste momento, é desenvolver a tecnologia no Brasil.
O processo de produção da carne artificial ainda está em fase de testes entre a BRF e a startup israelense. Em linhas gerais, se baseia na multiplicação em laboratório de células retiradas de animais. A primeira etapa é a extração de células através de uma biópsia. Em seguida, as células são colocadas em um meio de cultura com fatores de crescimento e nutrientes e começam a se multiplicar. O crescimento é então acelerado em reatores biológicos, até que as células se aglutinam para dar origem a pequenos filamentos que se juntam para formar o tecido muscular
“Pensamos numa solução que conviva com as proteínas da carne animal e não a substitua”, afirma Sérgio. Ele explica que o processo da carne de laboratório passa por cinco fases em seu processo de produção. “Alimentação de células animais, o crescimento dessas células, o resultado dessa alimentação – como se fosse um monte hambúrguer desmontado –, a separação do tecido e a estruturação da carne dentro desse tecido. Por exemplo: se existe uma demanda maior por um pedaço de picanha, patinho ou qualquer corte de carne, seria reproduzi-la. “Uma coisa revolucionária, que ainda está em processo de desenvolvimento”, reforça o diretor.
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Os dois executivos da BRF, no entanto, pregam cautela quanto à chegada dessa proteína na mesa dos consumidores. Isso porque a carne de laboratório ainda depende de marcos regulatórios e de análises junto à Diagro (Agência Defesa e Inspeção Agropecuária), órgão do Mapa, e à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). “Faz parte do nosso acordo com a nossa parceira as missões regulatórias. Estamos lado a lado com o ministério da agricultura e agropecuária nacional, estabelecendo qual vai ser essa diligência de jornada tecnológica e qual vai ser a jornada de aprovação de ingredientes de regulação”, afirma Sérgio. “Há um interesse em ambas partes, já que o Brasil é um dos maiores exportadores de proteína animal do mundo.”
Para Lorival o objetivo do negócio é ter algo de qualidade, eficiente e com acessibilidade. “Você tornar esse produto rentável e disponível à população já é um benefício à empresa. É o que o mundo tem nos permitido, a mudar diariamente. Inovar, ter a atenção do mercado e ver as transformações dos negócios e dos consumidores.” Com a tecnologia dominada e em escala, em valores atuais Sérgio calcula que essa carne poderia chegar ao consumidor pelo preço médio entre R$ 30 e R$ 35 o quilo. “Hoje ela ainda é uma tecnologia cara. Mas a gente vai conseguir deixar em um preço bem acessível ao consumidor de todas as classes sociais. Será uma carne competitiva no mercado.”
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