O acelerado crescimento do agronegócio brasileiro nas últimas duas décadas, e a necessidade de apertar o passo através da inovação e do refinamento das tecnologias já existentes, estão levando as empresas do setor a apostar alto para disputar o topo da cadeia, no caso o das médias empresas de gestão familiar. Mas o Grupo Essere, do setor de fertilizantes, indutores e defensivos biológicos, com sede no município de Olímpia (SP), que se encaixa no perfil, quer ir além do crescimento orgânico e abrir o seu capital em bolsa nos próximos anos. A primeira experiência nessa seara aconteceu no ano passado, com uma investida na B3, a bolsa de valores de São Paulo, para captar R$ 50,5 milhões através de NPCs (notas promissórias comerciais), operação estruturada por fundos de investimentos que adquiriram os papéis.
“Estamos aproveitando, surfando a onda do agronegócio que por muitos anos ainda vai ser grande, porque o mundo precisa de comida”, diz Antonio Carlos de Gissi Júnior, 55 anos, presidente e fundador da empresa, que neste ano estima uma receita de até R$ 300 milhões. “É uma operação alongada de cinco anos, com custo mais baixo que as operações convencionais. Usamos esse recurso para financiar o capital de giro, um acesso ao mercado de capitais que é novidade no Brasil”, afirma Renato Peixoto, 45 anos, diretor financeiro e administrativo, que há 15 anos funciona como um cérebro estratégico. Ele se tornou sócio da empreitada que mira cadeia de grãos, como a da soja, onde está a maior parte do negócio, além de café, cana-de-açúcar e FLV (frutas, legumes e verduras).
LEIA TAMBÉM: Livres de aftosa sem vacinação
O Grupo Essere, formado por quatro empresas, das quais três são unidades produtivas e uma de logística, planeja chegar em 2025 faturando R$ 1 bilhão e no ano seguinte abrir seu capital faturando R$ 1,24 bilhão. A expectativa de que o plano não vai desandar, além da certeza global sobre o crescimento do agronegócio no país, vem do planejamento para 20 anos, dos quais duas etapas já foram vencidas. Agora, está começando a terceira. A primeira foi tirar a empresa de uma receita de R$ 10 milhões, de estrutura familiar e pequena, e levá-la a R$ 100 milhões, feito ocorrido na safra 2017/18. A segunda etapa se encerra neste ano, com investimentos estruturados da ordem de R$ 60 milhões, valor necessário para dar suporte à corrida ao bilhão. O resto ainda está fora dos planos, mas não do radar. Como expandir as operações para os países do Mercosul, por exemplo. “No Paraguai há uma demanda grande dos brasileiros que plantam soja no país. Já vendemos a eles cerca de US$ 3 milhões anuais, um percentual pequeno da nossa produção, mas está sendo um aprendizado”, afirma Peixoto. “Mercosul é projeto para novos planos estratégicos.” Outra investida no radar do grupo são as agtechs.
Mas o cérebro de comando dessa agroindústria está com Gissi Júnior. O grupo que hoje emprega 400 funcionários nasceu da teimosia em não desistir. O empresário, que é técnico agrícola e nasceu em Barretos, no interior paulista, é filho de um mecânico. Aos 19 anos e trabalhando em uma revenda de insumos agropecuários, a virada começou quando foi transferido para Olímpia, município que adotou como casa até hoje. Contra a vontade do pai, que julgava ter o filho um bom emprego, Gissi Júnior montou uma revenda com um sócio. “Eu tive que, antes de tudo, convencer o meu pai porque naquela época não se podia ser dono de nada com menos de 21 anos”, conta. Ele não só convenceu o pai, como dois anos depois já era o único dono do negócio. Mas a vida industrial começou em 1994 quando a Kimberlit foi comprada: uma indústria de fertilizantes foliares que tinha cinco anos de idade e quatro funcionários em sua folha de pagamento.
“Foi uma trajetória de luta”, afirma o empresário. “Mas eu acredito muito e escuto as pessoas para tomar decisões. Tem muita gente que planeja, mas não executa, fica na gaveta. É melhor ter um bom planejamento – não precisa ser ótimo -, mas colocar em prática e ir ajustando o curso.” Com essa receita, Gissi Júnior inaugura no início de 2022 a segunda unidade de produção da Loyder, empresa criada em 2007 para ser somente B2B. Em 2018 nasceu a Bionat, de defensivos biológicos, mais a Floema para tratar de toda a logística do grupo.
O investimento de R$ 30 milhões para inaugurar a segunda unidade fabril da Loyder tem 75% desse valor captado no mercado e o restante próprios. A empresa é uma extensão do que ocorreu lá atrás. Gissi Júnior conta que quando comprou a Kimberlit havia apenas produtos para laranja no portfólio. “A cana-de-açúcar, forte nas imediações, não usava esse tipo de adubação, a foliar”, diz. Foi a partir daí que começou a corrida pela tecnologia. “Passamos do viés de commodity para inovação e montamos a área de pesquisa e desenvolvimento a partir de 2003. Em 2008 lançamos nossa primeira tecnologia”.
A aposta deu certo porque a empresa começou a falar em sustentabilidade. Era um tipo de fertilizante revestido com polímeros e compostos vegetais que ajudam a diminuir as perdas recorrentes das aplicações de fertilizantes convencionais. Hoje, o Brasil consome cerca de 40 milhões de toneladas de NPK (sigla para nitrogênio, fósforo e potássio), dos quais 85% são importados. Acontece que, em média, 50% do que vai para o solo pode ser perdido por volatilização e lixiviação, a depender do nutriente, porque há nutrientes com taxas de perda de até 70%.
A empresa fabricava o produto e vendia para as misturadoras de fertilizante até o início deste ano, quando a Loyder passou a processar o NPK para vender no estado de São Paulo. “Ainda não vendemos a outros mercados por conta do ICMS. Por exemplo, para Minas Gerais ele é de 8,4% e aí perde-se a competitividade”, afirma Gissi Júnior. Os atuais clientes paulistas, além de produtores, são as cooperativas. Enquanto isso, a Kimberlit se concentra nos fertilizantes foliares, bioestimulantes e adjuvantes, que não são defensivos mas melhoram as pulverizações aéreas.
Ciência a serviço do campo
O fato é que Gissi Júnior e seus sócios colocaram um componente fundamental no planejamento das duas décadas que estão se encerrando: a formação de um forte P&D. Atualmente, o time tem 15 pessoas, das quais oito são doutores. “De oito anos para cá, essa equipe começou a pesquisar, a entender o que o mundo está fazendo, o que as universidades estão desenvolvendo”, afirma o empresário. Uma das apostas foi nos indutores de resistência, tornando a Loyder uma das empresas consideradas vanguarda no assunto.
Trocando em miúdos, os indutores são vendidos como fertilizantes foliares porque não há classificação para eles. Ao ser aplicado, é como se a planta fosse vacinada, tornando-se resistente a doenças como nematóides, por exemplo. “Isso aí é fantástico para a sustentabilidade ambiental porque uma planta resistente precisa de menos agrotóxicos”, afirma Gissi Júnior.
Foi também a pegada ambiental que levou à criação da Bionat, uma biofábrica de insumos biológicos que começou a operar em 2019. Para a marca também estão sendo contratados R$ 31 milhões destinados à uma nova unidade com 15 mil metros de construção e que deve entrar em operação para a safra 2022/23. “Faltava ao nosso portfólio os defensivos”, afirma Gissi Junior. “Só que o mundo todo diz: olha tem que usar menos. Por isso está vindo fortemente essa onda de defensivos agrícolas biológicos.”
A unidade em operação, que trabalha na capacidade máxima, deve faturar neste ano R$ 40 milhões. São cerca de 200 a 300 toneladas no ano, a depender do produto biológico, se ele é líquido ou sólido. Com a nova unidade da biofábrica, a estimativa é faturar cerca de R$ 250 milhões por safra.
Peixoto, que além de finanças e tecnologia tem mestrado em gestão, acredita que a cultura da empresa fundada Gissi Júnior poderia levar à aceleração do processo de crescimento atual e até antecipar o IPO de 2026. Mas ele não bate o martelo, por ora. Isso porque o aprendizado na bolsa de valores deve se estender neste e nos próximos anos, com novas captações. E claro, o mercado favorece. “É possível antecipar, visto o crescimento dos negócios no campo. Antigamente, havia a safra e a safrinha. Hoje, o produtor já está indo para a terceira safra e isso se deve a produtos novos que aumentam a produtividade para o agricultor, a sua rentabilidade”, diz Peixoto. “Nós somos pequenos, mas estamos em lugares em que muitas grandes empresas do segmento não estão”. Ele cita o caso do segmento em que a Loyder atua, os fertilizantes especiais. Para o total de fertilizantes, a demanda deve chegar a 50 milhões nos próximos anos, ante as atuais 40 milhões de toneladas. “Nós estamos fazendo uma fábrica para atender 50 mil toneladas de produtos, por enquanto, mas em mercados de forte expansão.”
Facebook
Twitter
Instagram
YouTube
LinkedIn
Siga Forbes Money no Telegram e tenha acesso a notícias do mercado financeiro em primeira mão
Baixe o app da Forbes Brasil na Play Store e na App Store.
Tenha também a Forbes no Google Notícias.