Não é novidade para quem acompanha a economia e agricultura brasileira que o setor do agronegócio é um dos principais responsáveis por segurar as contas do país. Na contramão, projeções da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) indicam que o setor deve aumentar seu PIB (Produto Interno Bruto) em até 5% neste ano, trazendo impactos positivos para toda a sociedade, sendo um deles a geração de empregos. Em 2021, ano em que o PIB Agro cresceu 9,37%, o setor gerou cerca de 165 mil empregos no país.
Foi um dos setores que mais contrataram durante a pandemia e não apenas profissionais das ciências agrárias, como médico veterinário, engenheiro agrônomo e zootecnista. A demanda passa por administradores, biólogos, matemáticos, economistas, químicos, advogados, engenheiros de automação agrícola, cientista de dados, designer de máquinas agrícolas, entre outros.
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Não por acaso, é esperado que o novo ano seja marcado pela continuidade dessa demanda. Mas qual é o tipo de profissional que será procurado pelas empresas e fazendas em 2022? Que tipo de profissional está habilitado a lidar com cenários como os da estiagem do ano passado e uma safra chuvosa, como ocorre nestes dias? Quais as habilidades para lidar com os desafios de uma logística global impactada pela pandemia? Quem é o profissional que vai atuar no crescente mercado de bioinsumos?
“Com o cenário favorável para o agronegócio, o foco principal tem sido a implementação de novas tecnologias no campo, indústria e área administrativa, prospecção de novas oportunidades comerciais e análises de possíveis fusões/aquisições”, afirma Fabio Guelere, gerente do PageGroup, empresa de recrutamento especializada em executivos. “Há uma forte tendência de migração para o setor agro em todos os níveis hierárquicos, uma vez que o setor tem salários e benefícios muito competitivos com o mercado e acabam chamando atenção do público.”
O salário de um desenvolvedor de software, profissional muito buscado por agtechs, pode chegar a até R$ 15 mil, por exemplo. Segundo a Distrito, plataforma de inovação para startups e parceira global de empresas como KPMG, Microsoft e outras, cerca de 4,5 mil colaboradores foram empregados em 300 agtechs em 2021, reforçando uma área de tecnologia em pleno crescimento.
Além da área tech, o agronegócio também deve investir pesado em ESG (governança ambiental, social e corporativa), tema que ganhou ainda mais destaque após a realização da COP 26 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2021).
“O ESG veio como uma avalanche para cima de todo mundo e veio para ficar”, afirma Jeffrey Abrahams, especialista em recursos humanos e sócio-gerente da Fesa Group, holding de soluções em gestão de talentos. “A concorrência internacional vai exigir do Brasil um trabalho muito mais profissional de rastreabilidade e outros projetos ESG”.
Para isso, as empresas devem buscar executivos não só com a capacidade de gerenciar lavoura, pecuária e agricultura, mas também com boas noções de “liderança, finanças e um conhecimento sobre sistemas de manejo mais sofisticados”.
Abrahams também destaca qual o perfil profissional que a maioria das empresas deve buscar em 2022. “O profissional deve ter uma preparação acadêmica boa e a facilidade de lidar com a Avenida Paulista e a BR-163, ou seja, ele também deve estar com a linguagem pessoal em dia para conversar com simplicidade, sem ser totalmente pragmático.” A Avenida Paulista é o símbolo da vocação para negócios, enquanto a BR-163 é a principal rota de escoamento de grãos de Mato Grosso, o maior produtor do país, para os portos do Norte.
Profissionais que devem se destacar no agronegócio em 2022
As especificidades na busca de mão de obra para o agro são novas, mas elas vêm sendo refinadas, sendo algumas dessas demandas recorrentes e que devem se manter em 2022.
Setores do agro como os de insumos e maquinários agrícolas, sucroalcooleiro, papel e celulose, nutrição animal e proteínas são as que mais estão “demandando mão de obra profissionalizada em todos os níveis”, segundo o PageGroup.
Guelere pontua quais profissionais devem se encaixar melhor em 2022. São eles:
- Operações: “Busca cada vez maior por profissionais qualificados para áreas técnicas da indústria e do campo, como diretores de operações e gerentes agrícolas; áreas de manutenção e processos também têm sido muito demandadas. As empresas têm buscado profissionais com alto potencial de liderança e desenvolvimento de times.”
- Representantes técnicos de vendas: “Atuação em projetos por safras ou para gerar um diagnóstico de novas oportunidades no mercado durante alguns meses, seja em outras regiões ainda não exploradas ou para novos produtos/serviços.”
- Gerentes de projetos: “Durante um prazo determinado estruturam todas as etapas e times necessários para projetos de transformação digital, digitalização e no campo o agro 4.0.”
- Crédito/cobrança: “Com o aumento da inadimplência para alguns subsegmentos, empresas do agro viram a necessidade de estruturar equipes temporárias de crédito/cobrança que atuem com os picos de demanda.”
- Planejamento Financeiro: “Ainda com o cenário de instabilidade por conta de pandemia e fatores macroeconômicos, as empresas estão buscando profissionais temporários na área de planejamento financeiro que consigam gerar cenários com uma previsibilidade, desta forma não afetando o negócio no médio e longo prazo.”
“Historicamente sempre trabalhamos com muitas posições de finanças e de campo”, complementa Igor Schultz, headhunter e sócio da Flow Executive Finders. “Mas vemos que posições mais voltadas para tecnologia são uma grande tendência. Isso não engloba somente especialistas em sistemas de TI, mas também pessoas de inovação e que estejam por dentro de novos mecanismos e tecnologias que podem impactar o campo”.
O headhunter cita que profissionais com foco em automação de processos, sistemas e predição e prevenção de riscos também serão importantes para o agro em 2022.
Abrahams, da Fesa Group, também ressalta a importância da contratação de “bons profissionais” especializados em risk management na área de trading e troca de grãos (barter), setor que ainda enfrenta gargalos na logística e também pode ser afetado por mudanças bruscas no clima.
Diferenciais que importam na edição
Embora não seja uma exclusividade do agronegócio, o profissional deve expandir os seus conhecimentos para além de sua formação e, por vezes, até da área de atuação. Segundo a consultora de recursos humanos Marcia Machado de Campos, executiva da consultoria de RH Machado de Campos, “uma deficiência que acomete este mercado é a falta de fluência no idioma inglês”. A falta desse diferencial pode impedir que profissionais consigam trabalho ou cresçam em multinacionais. “A comunicação [de um profissional] não é só com seus clientes aqui no Brasil, mas internamente na organização.”
A consultora também destaca que pós-graduação, mestrado e doutorado também podem gerar um impacto positivo na colocação do profissional no mercado, fazendo com que os talentos sejam “diferentes e mais completos”. Outra recomendação é que um profissional que queira entrar no agro tenha treinamentos em gestão e “conhecimento global do mercado”, por meio de análise de notícias, estatísticas, além de acompanhar o movimento das principais empresas do setor.