“Sim, eu faço. Sim, eu posso. Sim, tem quem me reconheça”. A frase foi dita pela mineira Vanusia Nogueira, segurando águas teimosas nos cantos dos olhos. A filha e neta de produtores e vendedores de café, que quinta-feira (10), é a nova diretora-executiva da OIC (Organização Internacional do Café), vai se tornar a primeira mulher no mundo a ocupar pelos próximos cinco anos a principal sala da 222 Gray’s Inn Road, em Londres, na Inglaterra, endereço da sede da entidade. Mas a frase, que serve perfeitamente a esse momento, não foi dita ontem e nem é uma auto referência.
Nogueira deu essa declaração em um dos 30 episódios que podem ser conferidos no Youtube, realizado pela BSCA (Brazil Specialty Coffee Association), ou Associação Brasileira de Cafés Especiais, com sede em Varginha (MG), para contar como é o processo da xícara ao grão, por meio de histórias de gente do setor. O vídeo publicado em 15 de dezembro do ano passado é, justamente, uma homenagem à Nogueira, que também é diretora da BSCA. Ela, que vai se mudar para a Inglaterra, se emociona ao relembrar como produtoras rurais, guerreiras do café, iniciaram suas jornadas em exposições e feiras para mostrar que produziam grãos de qualidade e que o reconhecimento era mais que um merecimento no vácuo: ele era o fruto de um árduo trabalho de posicionamento de mercado.
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Ela tem recebido várias homenagens e apoios nos últimos meses, desde que o movimento em favor do seu nome para ocupar o cargo no OIC foi oficializado. Entre os apoiadores estão a ABIC (Associação Brasileira da Indústria de Café), a Abics (Associação Brasileira da Indústria de Café Solúvel), a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) , o Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil) e o CNC (Conselho Nacional do Café). O processo de indicação, que terminou ontem com a escolha de seu nome, começou no dia 2 junho do ano passado, quando o CNC recebeu um documento da Representação Permanente do Brasil junto às Organizações Internacionais em Londres que versava sobre as eleições para o cargo.
Vai um cafezinho aí?
A nova diretora da OIC está há 20 anos no setor que representa um produto símbolo do Brasil e que tem o país como o maior produtor e exportador desse grão. No ano passado, o Brasil vendeu 40,37 milhões de sacas de 60 quilos para 122 países. Não por acaso, a Colômbia, que tem um dos mais famosos cafés do mundo, apoia o seu nome. No mundo, a OIC representa um grão com produção global de 168,9 milhões de sacas de 60 quilos na safra encerrada.
Além de diretora-executiva da BSCA e conselheira do CNC, Nogueira também faz parte da Rainforest Alliance, da Alliance for Coffee Excellence, e da SCA(Specialty Coffee Association). Ela é administradora e graduada em Tecnologia da Informação, tem MBA em gestão de marketing e em 2017 se tornou doutora em administração, negócios e marketing pela Fundação Getúlio Vargas/Universidade Nacional de Rosario. Na BSCA desde 2009, ela é a responsável pela realização do Cup of Excellence, o maior concurso de cafés especiais do mundo, criado no ano 2000.
Atualmente, o evento global conta com o apoio da Apex-Brasil (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos) e da ACE (Alliance for Coffee Excellence), entidade com sede em Portland, Oregon (EUA), e que representa cerca de 50 países produtores de cafés especiais. Além desse evento, há outros realizados pela entidade, como o Concurso Aroma BSCA, o BSCA Micro-Region Showcase, o 3 Corações Florada Premiada e o Nosso Café Yara.
Todos eles têm como foco a valorização dos cafés especiais. No leilão que vendeu os melhores do Cup of Excellence no ano passado, realizado no dia 20 de dezembro, houve três recordes de preços. O maior atingiu US$ 14,83 por libra-peso, o que equivale a R$ 11.152,33 (US$ 1.961,71 para o dólar do dia) por saca de 60 quilos. No dia, Nogueira declarou: “Quando avaliamos as amostras, tivemos uma grande surpresa, já que a safra 2021 foi impactada por adversidades climáticas, como longo período de seca e altas temperaturas. Mas os lotes recebidos entregaram uma qualidade ímpar, reforçando que os cafés do Brasil possuem características que os fazem superar os desafios.”
O que faz a Organização Internacional do Café
Com o novo cargo, os desafios dessa liderança agora passam a ser internacionais. O mandato do atual diretor-executivo da OIC, o também brasileiro José Sette, termina no dia 30 de abril. Nogueira assume uma entidade que vem se modificando ao longo dos anos, por meio de convênios internacionais nos quais estão os papéis desempenhados pela entidade.
Por exemplo, no Convênio Internacional do Café de 1983, uma das principais ações propostas era a definição de um regime de cotas de exportação para, “quando necessário, garantir a estabilidade de preços dentro de faixas acordadas anualmente” entre os membros da OIC. Outra decisão foi a criação de um fundo para a promoção do consumo, financiado pelos próprios países exportadores e dedicado a campanhas para o aumento do consumo da bebida.
Houve outros convênios internacionais importantes, como o de 1994, quando foi criado o Fórum Internacional das Associações da Indústria e do Comércio de Café (Coffee Industry and Trade Associations Forum). E o de 2007 quando, definitivamente, a OIC foi reconhecida formalmente, o que ocorreu a partir de 2011, como fórum para consultas intergovernamentais visando transparência no comércio internacional por meio de acesso a informações relevantes da economia cafeeira.