A transformação da produção de alimentos em um modelo mais sustentável possui uma série de desafios práticos, especialmente conectados à adição de práticas de agricultura regenerativa.
É importante ressaltar que, para que essa transição realmente aconteça, produtores e empresas do agronegócio precisam ser incentivados a mudar seus negócios e tomar riscos associados a tais mudanças.
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Mas o que permitiria que os produtores de alimentos e seus parceiros recebessem mais por suas práticas amigáveis ao clima?
Obviamente, o exemplo da agricultura orgânica salta à mente. Os fazendeiros podem receber um valor premium porque os consumidores estão dispostos a gastar mais por um produto certificadamente orgânico. Existe a possibilidade do agro sustentável e com práticas amigáveis ao clima também se beneficiar da conscientização do consumidor e da disposição de tomar decisões a favor do planeta? Isso é possível, mas para acontecer, algumas barreiras do agronegócio devem ser discutidas.
A necessidade por rastreabilidade e sustentabilidade
A agricultura e a produção de alimentos modernas foram otimizadas para eficiência. Agora, chegou o momento em que ambas devem ser recalibradas para que possam se encaixar nas demandas de sustentabilidade e rastreabilidade que hoje são cobradas.
Atualmente, a cadeia de alimentos para grandes commodities, na maioria dos países desenvolvidos, deixa o produtor e o consumidor separados por muitas etapas de processamento. Essa corrente possui muitos elos: cooperativas, armazéns de grãos, processadores de alimentos, embaladores e varejistas. Para poder mostrar ao consumidor que certo ingrediente foi cultivado de maneira sustentável, todos os caminhos desse processo devem se tornar rastreáveis, desde o fazendeiro que planta e colhe o alimento até o varejista que colocar o produto finalizado nas prateleiras.
Nesse caso, ter a capacidade de rastrear um alimento não serve somente ao desejo do consumidor de saber onde ele foi cultivado, mas carrega um dos principais atributos do produto, a própria sustentabilidade do produto, que ajuda o comprador a entender por qual motivo aquele ingrediente é mais valioso para o planeta.
Diferentes colheitas e commodities possuem diferentes tipos de cadeias de suprimentos. Algumas são mais curtas e integradas, significando que a empresa de alimentos por trás do produto pode conhecer diretamente o produtor que está cultivando aquele alimento. Em uma cadeia direta, a empresa pode discutir o valor das práticas de agricultura regenerativa diretamente com o fazendeiro e oferecer um pagamento premium para que ele possa adotar tais práticas.
Como as empresas de alimentos podem se adaptar
Para tornar esse tipo de negócio viável, a empresa alimentícia pode estabelecer uma nova marca para produtos, focando no fato deste ser cultivado de maneira sustentável. Ela também pode recompor seus custos de uma maneira diferente. Nesse caso, são poucos os envolvidos, e a safra, assim como os dados que a acompanham, passa por poucas etapas até chegar ao consumidor.
Em cadeias tão diretas, o consumidor rapidamente perceberá o impacto sustentável das marcas de alimentos e seus produtores parceiros. As informações sobre o impacto também devem ser encontradas nas embalagens de produtos, bastando ficar de olho.
No entanto, para alimentos que precisam de mais processamento e exigem economias de escala para atender às necessidades da sociedade moderna, a rastreabilidade e o reconhecimento de práticas sustentáveis e seu impacto no planeta podem ser mais difíceis de mostrar aos consumidores.
Para itens como grãos, oleaginosas e pulses, que são beneficiadas por meio do processamento em larga escala, há necessidade da criação de cadeias de suprimentos paralelas dedicadas que possam preservar a identidade das culturas que foram produzidas de forma sustentável.
Estabelecer e administrar economicamente uma cadeia de suprimentos paralela para culturas sustentáveis, também considerando culturas neutras em carbono ou positivas em carbono, tem grandes implicações, como a necessidade de ter instalações dedicadas de armazenamento e processamento para essas commodities.
Embora isso não seja impossível, seria mais fácil de realizar para uma marca menor que atua localmente, em vez de uma marca que influencia uma parcela muito grande da produção de alimentos e está comprando globalmente e em grandes quantidades.
Para a mudança realmente acontecer, deve haver uma desconstrução da ideia de que grandes empresas do agro são ruins. A transformação em larga escala do agronegócio depende da participação de todos os players, especialmente dos maiores.
São essas grandes empresas que estão em posição de “pagar adiante” e fornecer incentivos aos agricultores para catalisar uma mudança verdadeiramente significativa. Afinal, são essas entidades que vêm produzindo a maioria dos produtos. Elas certamente responderão às mudanças. Na realidade, já estão de olho na constante alteração das demandas do consumidor.
Os consumidores têm uma oportunidade única de moldar essa nova fase na produção global de alimentos e provavelmente votarão com suas carteiras nas iniciativas que importam para eles.
* Anastasia Volkova é membro do Forbes Councils Member para tecnologia, CEO e co-fundadora da Regrow.ag, consultoria sobre agricultura sustentável. O Forbes Technology Council é uma comunidade apenas de convidados para CIOs (Chief Information Officer), CTOs (Chief Technology Officer) e executivos de tecnologia de classe mundial.