Imagine que você é um produtor rural, que fez um planejamento para sua empresa para os próximos 10 anos, projetando novos investimentos, seja na ampliação do negócio existente ou em novos negócios. Imagine que investiu em expansão e renovação de instalações como silos, pivots centrais, confinamento, casas e alojamento para funcionários, fábrica de ração, novo maquinário, enfim, investiu levando em consideração os custos de produção e o valor de mercado previsto para o seu produto. Mas então, vem o governo estadual e muda as regras no meio do jogo, taxando a sua produção, podendo ceifar de 5% a 10% do lucro, o que poderia levar você a trabalhar no negativo.
Parece uma piada de mau gosto, mas a proposta de taxar produtos agrícolas para a criação de um fundo que visa melhorar a infraestrutura, como rodovias, pontes e aeródromos, tem sido discutida em grandes estados produtores como Goiás e Paraná, copiando o modelo que já existe no Mato Grosso. A Assembleia Legislativa de Goiás aprovou em primeira e segunda votação os projetos que viabilizam a criação do Fundo Estadual de Infraestrutura (Fundeinfra) através da taxação de até 1,65% sobre a comercialização de produtos agropecuários, como soja, milho, cana e carnes, Vistas como um retrocesso para o setor produtivo, as propostas agora seguem para a sanção do governador.
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A taxação sobre a produção impactará diretamente o produtor rural e num efeito cascata, aumentará os custos de produção, resultando na elevação do preço dos alimentos, que será sentido pela população, prejudicando principalmente a população mais carente, que têm na alimentação uma de suas maiores fontes de despesas.
Os estados não conseguem diminuir os gastos e tem que repassar esta conta para alguém, neste momento quem vai pagar a conta é o agro e a população. É papel do governo estadual buscar novas formas de arrecadação, mas onerar o principal setor produtivo é um tiro no pé, se a taxação for aprovada, empresas e produtores rurais terão que fazer uma correção de rota, pois a taxação pode trazer prejuízos comerciais e tornar os produtos produzidos nestes estados menos competitivos.
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O governo de Goiás defende que a contribuição é opcional, entretanto, é obrigatória para que sejam mantidos os benefícios fiscais e regimes fiscais especiais de tributação. Os chamados benefícios fiscais, não existem à toa, eles são na verdade, políticas públicas estabelecidas visando fomentar um determinado segmento, que neste caso, tem o intuito de garantir a segurança alimentar da nossa população.
Há um argumento de que o agro não paga imposto, o que não é verdade, o produtor rural já paga vários impostos como ITR (Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural) , FUNRURAL (Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural), IR (Imposto de Renda) e PIS/PASEP (Programa de Integração Social e o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público), COFINS (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) INSS ( Instituto Nacional do Seguro Social) além de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) na compra de máquinas e insumos agrícolas. Dizer que a taxação seria opcional é puro jogo de palavras, o produtor terá que escolher entre pagar a taxação ou ICMS que varia de 7 a 17% ou seja, mais um ônus para o produtor que será obrigado a pagar esta taxação sobre a sua produção.
A maioria das empresas do agro trabalha com contratos firmados para a próxima safra, portanto, é essencial a previsão de custos. O produtor rural lida com uma série de situações além do seu controle, seca, chuva, variação de preços no mercado e da mesma forma, trabalha com preços fechados a futuro, desta maneira, toda a cadeia do agronegócio foi surpreendida com a possibilidade de mudança na regra do jogo devido a esta taxação sobre a produção planejada na surdina.
O agro devido ao seu bom desempenho tem se tornado uma opção óbvia para buscar arrecadação e equilibrar as contas públicas, quando o objetivo deveria ser cortar gastos e garantir a segurança jurídica para uma trajetória de sucesso.
*Helen Jacintho é engenheira de alimentos por formação e trabalha há mais de 15 anos na Fazenda Continental, na Fazenda Regalito e no setor de seleção genética na Brahmânia Continental. Fez Business for Entrepreneurs na Universidade do Colorado e é juíza de morfologia pela ABCZ. Também estudou marketing e carreira no agronegócio.
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