Na indústria do vinho do estado de Washington, muitas pessoas se referem a Christophe Baron como o “Francês Louco”. Quem mais compraria um campo de pedras que ninguém mais queria e plantaria um vinhedo nele? Quem mais empregaria cavalos de trabalho musculosos para cultivar o solo nos vinhedos? Mas…. quem mais se tornaria tão bem-sucedido, com seus distintos vinhos biodinâmicos de classe mundial normalmente se esgotando nas primeiras três semanas de lançamento, a cada ano?
Nascido em Champagne, na França, em uma família de vinicultores, Baron estudou viticultura e enologia em Champagne e na Borgonha. Em seguida, viajou pelo mundo para fazer vinho na Austrália, Nova Zelândia e Romênia, antes de ir para o Noroeste do Pacífico.
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“Em 1996, decidi comprar um terreno em Willamette Valley, no Oregon”, contou Baron em uma recente entrevista online “e estava dirigindo para lá no dia seguinte, mas parei em Walla Walla, Washington, para visitar um velho amigo. Enquanto conversava, com uma taça de vinho nas mãos, mostrei a ele uma foto em um livro do sul do Ródano com os vinhedos cobertos por grandes pedras. Então, ele me falou que havia um campo de pedras como aquele ao sul da cidade. Nos dirigimos até lá, e vi o campo com pedras do tamanho de uma bola de softball e completei: ‘é isso!’”
Desnecessário dizer que Baron nunca chegou ao Oregon. Em vez disso, negociou no dia seguinte a compra do campo de pedras – que ninguém mais queria porque era muito difícil de cultivar. Em 1997, ele plantou seu primeiro vinhedo de uvas syrah e batizou a propriedade de ‘Cayuse’, em homenagem a uma tribo nativa norte-americana, cujo nome veio do francês ‘cailloux’, que significa ‘pedras’.
Hoje, após quase três fantásticas décadas na produção de vinho, em 30 hectares de vinhedos e 5 marcas de vinho de sucesso, Baron reflete sobre a jornada e o que o tornou tão bem-sucedido. Parte desse sucesso tem a ver com cavalos e agricultura de acordo com princípios biodinâmicos. Outros aspectos importantes incluem a produção limitada, pontuações excepcionalmente altas em seus vinhos e contratação de uma equipe talentosa de funcionários.
Os aspectos positivos dos cavalos no vinhedo e a agricultura biodinâmica
“A potência é a maneira de fechar o círculo”, explica Baron. “Mudamos da agricultura orgânica para a biodinâmica em 2002 e, desde então, usamos apenas produtos naturais nos vinhedos. Além de cavalos para lavrar entre as vinhas, temos também cabras, vacas, porcos e galinhas.” Os animais fazem parte do sistema de agricultura biodinâmica, pois fornecem fertilizante natural e auxiliam no cultivo e no controle de ervas daninhas.
Os cavalos são especialmente importantes em Cayuse, e Baron contrata “peões” especialmente treinados para operar arados antigos que são atrelados aos enormes cavalos de trabalho. “Com os cavalos não há compactação do solo”, continua Baron. “Eles têm um impacto menor, o que é melhor para a longevidade da videira e ajuda a criar vinhos mais complexos e interessantes.”
E a linha de vinhos Cayuse é especialmente interessante, com excelente concentração, complexidade e sabor literal do basalto das pedras. Atualmente, são cinco marcas no portfólio: Cayuse, Horsepower, Hors Catégorie, No Girls e um importado Christophe Baron Champagne, que Baron produz nos vinhedos de sua família na França. Todos os vinhos custam US$ 100 (R$ 515 na cotação atual) ou mais por garrafa, com algumas das safras mais antigas (se você puder encontrá-las), alcançando até US$ 600 (R$ 3 mil) por garrafa.
Em Cayuse, também foi adotado o espaçamento de ruas mais estreito entre as fileiras de vinhas, o que é comum na Europa. “Usamos espaçamento de 1 metro por um metro em alguns dos blocos”, relata Baron. “Com isso se atinge a maturação em um brix mais baixo usando espaçamento mais fechado, o que resulta em mais tensão e aderência ao paladar dos vinhos. O espaçamento também proporciona mais sombra aos cachos de uva, o que os protege do sol quente.”
Baron admitiu que notou o aquecimento global pela primeira vez no verão muito quente de 2003 e novamente em 2005, 2007 e 2009. Desde então, ele plantou novos vinhedos para porta-enxertos tolerantes à seca e aumentou a quantidade de folhagem para fazer sombra. “Também elevei a altura da treliça para 1,7 metro”, disse Baron, “porque uma treliça mais alta fornece mais sombra aos cachos”.
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Mas, na indústria vinícola do estado de Washington, ele não precisa se preocupar apenas com os verões quentes, mas também com os invernos muito frios. “Hoje, há neve e está muito frio no vinhedo”, relata Baron, girando sua tela de zoom para mostrar o vinhedo coberto de branco, “e por isso devemos enterrar as vinhas todos os anos para protegê-las”. É, de fato, muito trabalho para cuidar desse especial vinhedo.
Produção limitada e uma equipe de enólogas poderosas
Nos primeiros anos da produção de Cayuse, era muito comum encontrar uma placa manuscrita, colada na porta da frente da pequena sala de degustação em Walla Walla (o estúdio de vinho fica a cerca de 15 minutos da cidade). A placa dizia: ‘Vinho esgotado em 3 semanas. Consulte-nos novamente no próximo ano.’
Este é o tipo de sinal que muitos proprietários de vinícolas adorariam poder postar, mas poucas têm a sorte de ter tanto sucesso desde o início. “O segredo”, diz Baron, “é produzir vinhos de grande qualidade e manter a produção pequena”.
Disse, também, que teve sorte de receber pontuações muito altas em seus vinhos de Harvey Steiman, no Wine Spectator (plataforma de conteúdo do setor). “Harvey nos colocou no mapa”, explica Baron. “Além disso, sempre mantivemos nossa produção baixa. Primeiro foram 350 caixas, depois 500. Crescemos muito devagar.”
Hoje, a marca Cayuse ainda gira em torno de 4.500 caixas por ano, com as outras marcas girando em torno de 1.000, dependendo da safra. O vinhedo emprega 45 funcionários, e Baron recentemente promoveu Elizabeth Bourcier, assistente vinhateira por muitos anos, ao cargo principal como vinhateira do negócio.
“Elizabeth e Karin Gasparotti, vinhateiras assistentes, estão basicamente administrando o estúdio de vinhos agora”, relata Baron. “As mulheres têm um paladar melhor do que os homens e não têm egos tão grandes quanto os homens. É uma verdadeira alegria ter uma equipe de mulheres no comando.”
Elizabeth é a responsável pelo lançamento da marca de vinhos No Girls em Cayuse, que apesar do nome desconcertante à primeira leitura, tem um significado muito positivo. Isso ocorre porque, historicamente, as mulheres foram excluídas dos principais estágios da produção de vinho, porque era considerado “trabalho de homem”. O No Girls celebra a força e a resiliência das mulheres.
Hoje, por causa da produção limitada e a alta demanda, há uma lista de espera para todos os 5 vinhos da marca Cayuse. Por isso, os potenciais clientes devem registar-se para adquirir os vinhos da adega. No entanto, algumas garrafas selecionadas podem ser encontradas em lojas de vinhos finos.
O futuro em Cayuse e algumas combinações criativas de vinhos
Quando questionado sobre o que viria a seguir, Baron sorriu e disse que tinha outro projeto em mente, sobre o qual ainda não podia falar. No entanto, quando questionado sobre qual comida ele combinaria com os vinhos que estávamos degustando na ligação do Zoom para esta reportagem, ele foi bastante loquaz. Abaixo, as suas sugestões:
- Cayuse Cailloux Vineyard 2019 Viognier com Vieiras Grelhadas e Molho Ponzu
- Horsepower Fiddleneck Vineyard 2018 Grenache com jack rabbit, trufas e foie gras
- No Girls 2017 Tempranillo com cabrito assado no palito com ervas
- Cayuse Vineyard 2018 Flying Pig (Bordeaux Blend) com peito de pato grelhado e ervas
- Hors Categorie 2019 Syrah com cordeiro ou porco assado, batatas e ervas
- 2016 Champagne Christophe Baron (100% Pinot Meunier em magnum) com batatas fritas, crème fraîche e caviar
* Liz Thac é colaboradora da Forbes EUA, escritora, consultora de vinhos e professora no programa Wine MBA na Sonoma State University e dá aulas de negócios sobre vinhos na Stanford Continuing Education. Tem 9 livros publicados. Fica baseada em Napa e Sonoma, Califórnia, e conhece as principais regiões vinícolas do mundo e mais de 65 países.