A tilápia é o peixe mais cultivado no Brasil. Pela primeira vez, pesquisadores brasileiros realizaram um trabalho bastante relevante para a piscicultura nacional. Eles mediram as emissões de metano em produções desse peixe em tanques-rede para condições tropicais.
Parte desses resultados foi publicada na revista Environmental Challenges e anunciados nesta semana pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária). A aquicultura intensiva aumentou em todo o mundo nas últimas décadas. No País, a piscicultura em tanques-rede nos reservatórios tem se ampliado nas últimas décadas, impulsionada pela presença de barragens utilizadas na produção de energia elétrica, que fornecem água de alta qualidade. O Brasil está entre os países com maior produção aquícola, com 612 mil toneladas em 2019, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ).
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O estudo é importante porque os cálculos internacionais costumam considerar condições de clima temperado em que as chamadas emissões ebulitivas (por bolhas) dos peixes são menos frequentes. Os estudos foram conduzidos em três afluentes secundários que deságuam no reservatório de Ilha Solteira (SP): Formoso, Cancan e Ponte Pensa, adequados para produzir, por ano, 800 toneladas de tilápia, o primeiro, e 3 mil toneladas os outros dois afluentes.
“Essas descobertas fornecem informações valiosas de que a criação de tilápia em tanques-rede em reservatórios pode estar associada ao aumento das emissões de metano, mas o impacto é restrito a uma área pequena quando comparada à área total do reservatório. Esse é um fato importante a ser considerado e indica que a piscicultura tem potencial para ser uma das atividades de produção animal com menor pegada de carbono”, diz Paula Packer, chefe-geral da Embrapa Meio Ambiente, unidade localizada em Jaguariúna (SP), e uma das autoras do estudo.
Aproximadamente 75% das emissões ebulitivas (por bolhas) de metano em produções do peixe foram registradas em locais com tanques-rede, em comparação às demais superfícies do reservatório. Porém, as bolhas foram eventos pontuais e não ocorreram em toda a área dos tanques-rede. A emissão de GEE (gases de efeito estufa) em reservatórios ocorre devido a processos físico-químicos decorrentes da degradação da matéria orgânica e oxidação dos compostos químicos na coluna d’água e sedimento. O metano tem potência 34 vezes maior do que o dióxido de carbono de influenciar o aquecimento global em um horizonte de tempo de cem anos.
Conforme Marcelo Gomes da Silva, do CNPq (Programa de Bolsas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), pouco se sabe sobre a contribuição da piscicultura nos processos de emissão ou remoção de GEE em reservatórios tropicais.
Uma das principais preocupações associadas às fazendas de peixes está relacionada à liberação na água de quantidades consideráveis de matéria orgânica, proveniente de alimentos não consumidos e excrementos de peixes, que pode ser convertida em GEE.
Os GEE produzidos em corpos d’água são transportados para a superfície principalmente por dois mecanismos. No fluxo difusivo, os gases formados no sedimento e na água são transportados através da coluna de água para a atmosfera. O ebulitivo, originário de bolhas formadas no substrato, é liberado quando ocorre a agitação da água ou quando a bolha supera a pressão hidrostática, atravessando a coluna de água e sendo liberada para a atmosfera.
Para um resultado fidedigno, foi necessário estudar os dois transportes. O difusivo, apesar de ser comum e acontecer no reservatório inteiro, tende a ter menor emissão de metano quando comparado com a emissão por bolhas.
O estudo no reservatório de Ilha Solteira mostrou que as emissões média de metano por difusão foi de 5 miligramas por metro quadrado por dia. Por outro lado, a emissão de metano ebulitivo, que é menos frequente, chegou a emitir bolhas de 5 mil a 10 mil miligramas por metro quadrado por dia. Estudos no exterior quase não avaliam a emissão por bolhas porque esta é uma característica de reservatórios tropicais, de áreas de águas mais quentes, com muita matéria orgânica disponível.
Para a inclusão dos dados nos inventários nacionais, os pesquisadores de áreas tropicais sugerem considerar as emissões ebulitivas. “Quando fazemos análise de metano, com modelagem para determinar esse fluxo de gás que sai da coluna de água para a atmosfera, ou com uso de equipamentos que medem apenas o ar atmosférico em cima do reservatório, esses métodos não conseguem pegar essas bolhas”, diz Gomes da Silva.
A grande importância desse trabalho é mostrar que além dos tanques-rede aumentarem a emissão de gás de efeito estufa na forma de metano, ampliam muito o fluxo ebulitivo, isto é, a quantidade de bolhas e o impacto pela emissão de metano. Por isso, a importância de se entender os dois transportes de gases para a atmosfera. De acordo com Silva, observou-se que o aumento das emissões de metano esteve associado à área de produção de tilápia. O aumento foi de cerca de seis vezes para o metano difusivo e de, aproximadamente, 2 mil vezes para as emissões ebulitivas, em comparação com as áreas externas dos tanques-rede. (Com Embrapa)