No dia 1º de julho, em um bar de coquetéis no centro de São Francisco, Califórnia, de propriedade da famosa chef Dominique Creen, os clientes de um seleto grupo se tornaram os primeiros americanos a experimentar o sabor do futuro.
A refeição em si era simples – frango frito em uma massa de tempurá, servido com um aioli de pimenta queimada, flores comestíveis e vegetais verdes – mas este não era um pedaço de frango comum. Para começar, nenhum animal foi abatido no processo.
Nos últimos oito anos, a empresa de biotecnologia que produziu o frango, UPSIDE Foods, vem aprimorando constantemente o processo de coletar células do frango, cultivá-las em grandes folhas em biorreatores de aço e, em seguida, moldá-las em formatos que podem variar de filés a nuggets.
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Conhecido como “frango cultivado em laboratório”, ou “carne cultivada”, ele tem sido vendido em restaurantes selecionados em Singapura por outra empresa, Good Meat, desde o final de 2020, mas o mercado dos Estados Unidos tinha permanecido inacessível. Até o mês passado, tanto a UPSIDE Foods quanto a Good Meat receberam a autorização da Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA (FDA) e inspeções federais necessárias para vender carne e aves nos Estados Unidos.
Amy Chen, diretora de operações da UPSIDE Foods, descreveu a possibilidade dos consumidores americanos finalmente provarem o produto como um “grande momento”.
“O progresso que fizemos nos últimos anos tem sido notável tanto no aspecto científico quanto na cadeia de suprimentos”, diz Chen. “O que não é tão glamoroso, mas para nós conseguirmos produzir milhares, milhões, bilhões de quilos de frango, precisamos de uma cadeia de suprimentos que possa suportar isso.”
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A rápida diminuição dos custos de produção, juntamente com a perspectiva de carne produzida de forma ética e com uma pegada de carbono menor do que a criação tradicional de animais, são fortes motivos para ver potencial no futuro da carne cultivada.
Isso é apenas um dos novos tipos de alimentos do futuro que podem estar disponíveis nos próximos dez anos. Aqui estão 10 produtos que, em breve, estarão no prato das pessoas e que estão prestes a redefinir as experiências gastronômicas:
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Divulgação/Aleph Farms Bife cultivado
Enquanto a UPSIDE Foods estava lançando seu frango cultivado, outra startup do mesmo segmento se preparava para ter seu próprio momento de destaque. A carne bovina há muito tempo tem sido descrita como a forma mais prejudicial ao meio ambiente de criação de animais, com estudos constatando que um único quilo de carne bovina gera 70 kg de emissões de gases de efeito estufa.
Com sede em Rehovot, Israel, a Aleph Farms atualmente trabalha com agências reguladoras no Oriente Médio e Ásia para lançar o primeiro bife cultivado do mundo. De acordo com Neta Lavon, diretora de tecnologia da Aleph Farms, este será um produto híbrido composto por uma mistura de carne bovina cultivada e proteínas vegetais.
“[O produto] tem o potencial de ser mais saudável porque de fato controlamos as porcentagens de gordura versus proteínas”, diz ela. “O primeiro produto que lançaremos será magro, com baixo teor de gordura. Ainda teremos uma experiência sensorial muito boa com pouca gordura, então por que precisaríamos adicioná-la?”.
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Divulgação/Cathie Martin Tomates com alto teor de vitamina D
A deficiência crônica de vitamina D tem sido associada a uma série de problemas, desde osteoporose, depressão sazonal e até mesmo um maior risco de Alzheimer. Essa questão é extremamente comum em certas partes do mundo, com um estudo observacional estimando que cerca de 40% dos europeus têm deficiência de vitamina D e 13% são gravemente deficientes.
Porém agora os botânicos do instituto de pesquisa em ciência vegetal John Innes Centre, em Norwich, Reino Unido, descobriram uma maneira de produzir tomates que contêm vitamina D ao desativar um gene específico usando a tecnologia de edição de genes CRISPR.
“A vitamina D não é produzida por plantas, nós a desenvolvemos e obtemos de fontes animais”, diz Catherine Martin, professora de ciências vegetais que liderou o projeto. “Portanto, isso poderia ajudar as plantas a se tornarem uma fonte de vitamina D para veganos e vegetarianos, reduzindo a necessidade de suplementos.”
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Getty Images/Bartosz Luczak Alimentos à base de micoproteína
Com a projeção de que a população global ultrapassará nove bilhões de pessoas até 2050, fornecer proteínas dietéticas suficientes para atender às necessidades de todos é um grande desafio. Como resultado, há um interesse crescente em fontes de proteína não derivadas de animais, como diferentes formas de micoproteínas criadas a partir da fermentação de fungos microscópicos.
As micoproteínas estão sendo cada vez mais utilizadas como constituintes principais em uma variedade de carnes e produtos veganos, como salame, patê e foie gras.
Dominic Farsi, pesquisador pós-doutorando na Teagasc, organização estatal responsável pela pesquisa, extensão e capacitação para o setor agroindustrial da Irlanda, afirma que a micoproteína tem a vantagem de ser rica em proteínas e fibras, além de ter baixo teor de gordura, colesterol, sódio e açúcar. “Há muitos benefícios em consumir micoproteína”, ele diz. “Por exemplo, observamos melhorias nos marcadores de danos no DNA no intestino, em comparação com carne vermelha ou processada.”
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Divulgação/NuCicer Grão-de-bico com alto teor de proteína
Estima-se que o grão-de-bico seja uma fonte de proteína cada vez mais importante, pois é acessível para os consumidores e possui características que o torna mais resiliente às mudanças climáticas, como eficiência no uso de água e capacidade de fixação de nitrogênio.
A empresa NuCicer, sediada na Califórnia, que recentemente recebeu investimento da Leaps, braço de financiamento em startups da multinacional alemã Bayer, desenvolveu uma variedade de grãos-de-bico que contém 75% mais proteína, além de abrir oportunidades para outras características, como tolerância ao calor e à seca. Através do cruzamento entre cultivos selvagens e variedades cultivadas de grão-de-bico, eles afirmam ter expandido a diversidade genética em 40 vezes, possibilitando aumentar os níveis de proteína e a resiliência ambiental.
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Divulgação/Pairwise Folhas de mostarda mais saborosas
As folhas de mostarda são conhecidas por seus benefícios nutricionais, sendo ricas em vitaminas A, C, K e cálcio. Um estudo descobriu que as folhas de mostarda cozidas a vapor reduzem a ligação de ácido biliar em maior proporção do que vegetais crus, o que pode trazer benefícios para o colesterol. No entanto, nem todos conseguem gostar do seu sabor picante e amargo, que é causado em parte por uma enzima chamada mirosinase.
A Pairwise, empresa sediada no estado americano da Carolina do Norte, que também recebeu financiamento da Leaps, usou a tecnologia CRISPR para reduzir a atividade dos genes que codificam a mirosinase, tornando as folhas de mostarda mais agradáveis. O produto foi recentemente lançado em locais selecionados, incluindo nas cidades americanas Springfield, Saint Louis e na região metropolitana de Minneapolis-Saint Paul, e espera-se que seja distribuído para supermercados em outras localidades dos Estados Unidos ainda este ano.
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Getty Images/Anthony Lee Frango carbono neutro
No que diz respeito à criação de frangos, uma das maiores fontes de destruição ambiental vem da alimentação desses animais, com frangos consumindo mais de três quartos da soja produzida no mundo.
A delimitação de espaços de terra para cultivar grandes quantidades de soja resulta no processo de desmatamento em larga escala em países como o Brasil, além na emissão de poluentes decorrente do transporte do alimento ao redor do mundo.
Startups estão buscando aumentar a produção de frangos e ovos livres de carbono, provenientes das fazendas onde esses animais são alimentados com uma dieta sem soja, composta geralmente por insetos ou alimentos excedentes de supermercados que foram transformados em ração para frangos.
A estratégia mais recente tenta compensar qualquer impacto de carbono proveniente da criação de frangos por meio da utilização de resíduos de alimentos que, de qualquer forma, teriam sido descartados em aterros sanitários, resultando na geração de gases de efeito estufa.
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Divulgação/Fork and Good Pastéis suínos cultivados
Nos últimos anos, a cadeia de suprimentos de carne suína tem sido enfraquecida pelo crescente reconhecimento de que a criação convencional de suínos contribui para a propagação de vírus e resistência a antibióticos. Além disso, a criação de porcos também tem um alto consumo de água, tornando a carne suína cultivada uma opção atraente para o futuro.
Fork and Good, uma startup que também recebeu financiamento da Leaps, recentemente inaugurou a primeira instalação de carne suína cultivada do mundo em Jersey City, nos Estados Unidos, utilizando culturas de células para produzir carne moída para uso em pastéis fritos de porco. Eles esperam lançar o produto no próximo ano.
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Getty Images/Monty Rakusen Embalagem de alimentos comestíveis
Todos os anos, cerca de 8 a 10 milhões de toneladas de plástico acabam chegando ao oceano. Na taxa atual, estima-se que até 2050 o plástico terá um peso maior do que todos os peixes no mar.
Em 2021, uma pesquisa destacou que uma grande proporção da poluição marinha por plástico tem origem em embalagens de alimentos, sendo que sacolas de uso único, garrafas plásticas, recipientes de comida e embalagens de alimentos compõem quase metade dos resíduos produzidos pelo homem nos oceanos.
Uma solução é criar mais embalagens comestíveis feitas de ingredientes naturais. A empresa Loliware, sediada em Nova York, criou canudos comestíveis feitos de algas marinhas, enquanto a Xampla, uma empresa derivada da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, desenvolveu embalagens para caldos feitos de proteína de ervilha em cubos que podem se dissolver em água quente e se tornar parte da refeição.
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Divulgação/BlueNalu Atum, caranguejo e lagosta cultivados
Embora o cultivo de células tenha se tornado mais conhecido como uma nova forma de produzir carne, ele também pode ser utilizado em frutos do mar. Isso poderia oferecer uma maneira de aliviar a pressão sobre muitas espécies comerciais de peixes, já que dados mostram que um terço das reservas globais de peixes está sendo pescado em excesso. Atualmente, projetos estão em andamento para desenvolver carne de lagosta, camarão e caranguejo cultivados em laboratório.
Conforme afirmado por Lou Cooperhouse, fundador, presidente e CEO da BlueNalu, com sede em San Diego, que está desenvolvendo atum cultivado, essa abordagem também poderia garantir que se esteja consumindo frutos do mar mais saudáveis. “Na indústria de frutos do mar, temos uma cadeia de suprimentos frágil e vulnerável”, ele diz. “Além disso, não há previsibilidade nos frutos do mar, e existem problemas de saúde humana relacionados ao potencial de contaminação por mercúrio, microplásticos ou outros poluentes.”
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Getty Images/Penpak Ngamsathain Bolo impresso em 3D
Em março, engenheiros da Universidade Columbia, em Nova York, divulgaram um relatório detalhado sobre uma fatia de bolo composta de pasta de bolacha Graham, manteiga de amendoim, geleia de morango, Nutella, purê de banana, cobertura de cereja e glacê.
Essa fatia de bolo foi construída inteiramente por um robô, capaz de usar diferentes cartuchos de pasta e pó de alimentos, e meticulosamente distribuí-los em uma sobremesa em camadas comestíveis. A visão futura é a de uma impressora de alimentos combinada com um fogão a laser que fica em uma prateleira da cozinha e atua como um chef digital pessoal, capaz de grelhar carne ou produzir um bolo.
Por enquanto, objetos simétricos, como sobremesas, são os mais fáceis para uma máquina criar. “Sobremesas são mais versáteis”, diz Hod Lipson, roboticista da Universidade Columbia que lidera o laboratório de impressão de alimentos. “Os quitutes salgados, quiches e comidas relacionadas são mais fáceis de trabalhar do que um corte de carne, onde você espera um sabor e formato específicos.”
Bife cultivado
Enquanto a UPSIDE Foods estava lançando seu frango cultivado, outra startup do mesmo segmento se preparava para ter seu próprio momento de destaque. A carne bovina há muito tempo tem sido descrita como a forma mais prejudicial ao meio ambiente de criação de animais, com estudos constatando que um único quilo de carne bovina gera 70 kg de emissões de gases de efeito estufa.
Com sede em Rehovot, Israel, a Aleph Farms atualmente trabalha com agências reguladoras no Oriente Médio e Ásia para lançar o primeiro bife cultivado do mundo. De acordo com Neta Lavon, diretora de tecnologia da Aleph Farms, este será um produto híbrido composto por uma mistura de carne bovina cultivada e proteínas vegetais.
“[O produto] tem o potencial de ser mais saudável porque de fato controlamos as porcentagens de gordura versus proteínas”, diz ela. “O primeiro produto que lançaremos será magro, com baixo teor de gordura. Ainda teremos uma experiência sensorial muito boa com pouca gordura, então por que precisaríamos adicioná-la?”.
*Juergen Eckhardt é colaborador na Forbes EUA, vice-presidente sênior e diretor da Leaps by Bayer, unidade com foco em inovações e soluções de biotecnologia relacionadas a saúde e agricultura (tradução: João Pedro Isola).