“O acidente é um baque que você nem sabe se vai viver depois dele”, diz o produtor rural Fernando Dal Molin, 42 anos, que há cerca de um ano e meio sofreu um acidente de trabalho. Ao desmanchar uma leira, um tronco de árvore atingiu suas costas. Desse dia em diante, foram 60 dias internado, uma cirurgia, uma grave infecção e outros quatro meses de fisioterapia, já em casa, para se adaptar à uma vida sem os movimentos das pernas.
Por “em casa” entende-se a fazenda de 300 hectares em Mafra, município catarinense na divisa com o Paraná, onde ele cultiva soja. “Mas a vida continua, tem de continuar“, afirma Dal Molin, que diz ainda estar no caminho das descobertas dessa realidade. Dal Molin, que é filho de agricultor, pai de três crianças, declara que não saberia fazer outra coisa na vida que não fosse cuidar da terra.
Leia também:
- Fazendeiros do biometano: como eles giram a economia circular do Centro-Oeste
- Trator a biometano de R$ 1 milhão começa a ser vendido pela New Holland
- Colheitômetro da New Holland vai acompanhar as safras brasileiras em tempo real
Há alguns meses, Dal Molin foi convidado pela New Holland, fabricante de máquinas agrícolas que pertence ao grupo CNH Industrial, para testar no campo o primeiro trator adaptado disponível no mercado em todo o mundo a sair de fábrica pronto, e que foi lançado comercialmente nesta segunda-feira (14), em Curitiba (PR), onde está a principal fábrica da marca no Brasil. “O trator ficou três dias na minha fazenda”, diz Dal Molin. ”É uma máquina muito segura para subir, que é essa a dificuldade: chegar no banco do operador.”
Irrequieto, na sua jornada de retorno a uma vida normal na fazenda – e antes de conhecer o trator adaptado –, Dal Molin já havia convocado um amigo que é dono de uma oficina de torno mecânico em sua cidade para adaptar às suas necessidades o antigo trator, uma aventura que, segundo ele, está longe da tecnologia concebido pela New Holland.
“Vemos o tema inclusão e acessibilidade como urbano, mas é preciso enfrentar o desafio também no meio rural”, diz Eduardo Kerbauy, VP da New Holland para a América Latina. “É preciso cobrir uma lacuna hoje sem assistência e foi esse nosso objetivo”. No Brasil há cerca de 2,9 milhões de pessoas que possuem alguma deficiência e que residem no campo. No total, há no país 17,3 milhões de pessoas com dois anos ou mais de idade com algum tipo de deficiência (8,4% da população), sendo que 7,8 milhões possuem deficiência física nos membros inferiores, de acordo com a PNS (Pesquisa Nacional de Saúde) de 2019, realizada pelo Ministério da Saúde em conjunto com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Chamado de TL5 Acessível, o trator destinado a pessoas com deficiência motora nos membros inferiores e que agora entra na linha comercial da New Holland, começou a ser pensado em 2018, quando a marca lançou uma retroescavadeira acessível. Em 2019, o trator foi apresentado como um conceito em duas feiras agropecuárias, e desde então ele era aguardado. O veículo foi desenvolvido em parceria com a empresa de mobilidade inclusiva Elevittá, a Arteprima e o Senai de São Leopoldo (RS), testado e validado entre 2021 e 2023. A New Holland possui cerca de 14 mil patentes no mundo, das quais 1.400 foram criações de sua equipe brasileira.
- Inscreva sua empresa ou cooperativa no Forbes Agro100 utilizando este link
- Siga a ForbesAgro no Instagram
A máquina está na faixa de 80 a 100 cavalos de potência (nas versões de 80, 90 e 100 cv ), onde se concentra 43% do mercado dos tratores da New Holland, diz Flávio Mazetto, diretor de marketing. “É o trator mais vendido e faz parte de todo o ciclo de uma propriedade rural, além da possibilidade de uso urbano, por exemplo, na limpeza de cidades. O trator acessível custa cerca de R$ 310 mil, mas depende da região e das condições que o banco da montadora dispõe. De modo geral, os juros de um financiamento ficam na casa de 9% ao ano. Mas Kerbauy diz que a marca vem fazendo um movimento junto ao governo federal para que nas linhas do Plano Safra tenham juros diferenciados para tratores dessa categoria.
Isso porque a marca pretende seguir com investimentos em inovação, o que inclui mais máquinas e equipamentos acessíveis, por exemplo de maior potência. A CNH Industrial faturou no ano passado, em todo o mundo US$ 23,6 bilhões (R$ 117,6 bilhões na cotação atual), dos quais US$ 1,4 bilhão (R$ 7 bilhões) foi em inovação e pesquisa. “Para 2023, a estimativa é US$ 1,6 bilhão (R$ 8 bilhões)”, afirma. No projeto do trator acessível, a marca colocou cerca de R$ 5 milhões. E segundo o executivo, sua venda está aberta ao mundo. “Fizemos o trator para o mercado brasileiro, para as nossas necessidades, mas claro que ele é um produto para todos.”