A Agroconsult divulgou nesta quinta-feira (18) uma nova redução para a safra da soja em 2023/2024. Não é o primeiro corte — graças a uma combinação de instabilidade climática com lavouras mais precoces, a colheita agora esperada é de 153,8 milhões de toneladas, redução de 3,7% em relação à última temporada.
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Em decorrência da instabilidade climática em todas as regiões produtivas, a temporada já acumula uma quebra de 15,3 milhões de toneladas em relação à expectativa inicial (169 mi t), e de seis milhões de toneladas ante o resultado da safra de 2022/2023, de acordo com a consultoria. A área plantada aumentou 2,9%, para 45,7 milhões de hectares, expansão considerada “insignificante”.
“A precocidade da soja é hoje um dos fatores que torna os impactos do fenômeno El Niño tão fortes”, explicou André Debastiani, coordenador do Rally da Safra, a expedição organizada pela Agroconsult que percorrerá 80 mil km² de plantações em 12 estados, ou 97% da área produtiva, entre os dias 11 de janeiro e 24 de março.
Em coletiva de imprensa nesta tarde, o especialista destacou uma combinação de temperaturas 3ºC acima da média, entre setembro e novembro (época do plantio), com lavouras mais precoces esse ano, como um fator de quebra de safra.
“Exceto pelo Sul do Brasil, que teve muita chuva, o Sudeste, Centro-oeste e Nordeste tiveram temperaturas muito altas”, explicou Debastiani. “Na Bahia, por exemplo, não choveu em outubro; em novembro e dezembro também choveu pouco”, acrescentou, com base nos dados do Inmet (Instituto de Meteorologia).
Com 50% do plantio realizado até a segunda quinzena de novembro, a Bahia apresentou as lavouras mais precoces desta temporada — o que, somado à estiagem, resulta em perda de produtividade, como se averiguou em todas as regiões. No Mato Grosso, o maior estado produtor de soja do Brasil, dificilmente as fazendas alcançarão o recorde de produtividade de 2023, de 63,8 sacas por hectare, segundo a Agroconsult.
“Neste momento, no Mato Grosso, estamos colhendo a pior parte da lavoura em termos de produtividade. E o que vem adiante também está prejudicado”, informou Debastiani, cuja expedição já percorreu, em seus preparativos, o oeste do Paraná e médio-norte do Mato Grosso. “Agora, a falta de chuva pode causar mais danos que o excesso”, pontuou. Segundo ele, ainda existe o risco de novos cortes serem feitos nas projeções até a conclusão da safra — revisão positiva, nem pensar.
Outro exemplo, o sudoeste de Goiás traz um cenário muito semelhante ao do estado do Mato Grosso, com atraso significativo na regularização das chuvas e altas temperaturas. O início da colheita na região confirma resultados abaixo da expectativa dos produtores. A estimativa pré-rally é de 56 sacas por hectares (para se ter uma ideia, foram 65,5 sacas por hectare na temporada de 2022/2023).
Replantio bateu recorde
O sócio da Agroconsult, André Pessoa, chamou atenção para os níveis recordes de área replantada nesta safra. São três milhões de hectares ou 6,4% da área plantada nacional, partindo de um solo menos produtivo. “Uma parte significativa dessa área veio do milho verão, algo em torno de 10% da área do milho ou 500 mil hectares migraram para a soja. A área de replantio só passou de um milhão de hectares — o que não acontecia há muito tempo — por causa disso”, afirma Pessoa.
O El Niño de alta intensidade, que ocasionou estragos maiores nas lavouras, também levou ao abandono de muitas áreas de soja para dar lugar ao algodão. Em Minas Gerais, pontua o especialista, muitos produtores do Triângulo Mineiro optaram por “segurar” a safra até que as chuvas se regularizassem. “A tendência agora é entrar num ciclo melhor. O receio é com a chuva em fevereiro (época da colheita)”, diz Pessoa.
As condições fitossanitárias, com a maior incidência de doenças no Nordeste e pragas no Centro-oeste, são outro fator negativo para a safra, em decorrência da instabilidade climática. “O clima bagunçou o calendário de aplicação de insumos este ano”, observou Graciela Moguinol, diretora de marketing para o sistema de cultivo soja da Basf, presente na coletiva.
Preços também preocupam
O contexto exige cautela do produtor porque, além da quebra de safra, os estoques globais estão altos e a soja vem perdendo preço no mercado internacional — os contratos para maio de 2025, por exemplo, estão sendo negociados a US$ 12 por bushell, enquanto em janeiro deste ano a cotação é de US$ 12,7 por bushell, ou seja, há uma tendência de desvalorização.
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“A rentabilidade será satisfatória?”, disse Ricardo França, head de agronegócios do Santander. “Sentimos a perda de liquidez em 2023, em 2024 estamos atentos. É preciso ver até onde vão esses preços”, sinalizou.
Responsáveis pela maior parte das exportações brasileiras de soja, os planteis de suínos chineses tampouco devem estimular o mercado esse ano, destacaram os especialistas, uma vez que a suinocultura vem perdendo sua rentabilidade no país. “É o dínamo da soja brasileira. E o apetite chinês está bem calmo, bem tranquilo”, afirmou Pessoa.
Apesar disso, a recuperação da safra argentina somada à produção dos outros países da América do Sul devem representar um aumento de 28,5 milhões de toneladas nos fluxos comerciais a nível mundial — descontado o déficit estimado para o Brasil, a oferta dos países sulamericanos tende a crescer de 194,8 milhões de toneladas para 223,3 milhões de toneladas.
O incremento deve compensar o desfalque ocasionado por outra quebra de safra, a americana em 2022/2023, com prejuízo de 10 milhões de toneladas. A demanda global pela soja atingiu no ano passado um novo patamar: 380 milhões de toneladas.