Pelo menos três vezes ao ano, o administrador de empresas Egor Kirin, 36 anos, toma um voo em Nova York com destino ao Brasil. Kirin, que nasceu na Rússia e reside nos Estados Unidos, é um dos muitos estrangeiros interessados em investir no país. No ano passado, somente na B3, eles colocaram R$ 44,9 bilhões, a segunda maior quantia da série histórica iniciada em 2004. Mas Kirin não quer saber de bolsa, o foco de seu investimento são as commodities cultivadas no país, como soja, milho e trigo.
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Ele é o fundador da Agro.Club, uma plataforma global online de análise, compra e venda de commodities que se instalou no Brasil há um ano e meio. Em 2023, a receita da empresa superou os US$ 200 milhões (dados ainda por fechar), o que significa valores acima de R$ 1 bilhão. Com sede em São Paulo e filiais em Rondonópolis (MT) e Londrina (PR), o Brasil é o país responsável pela maior parte do faturamento. Entre janeiro e outubro do ano passado, a receita foi de R$ 400 milhões.
“O Brasil é um dos maiores mercados de grãos do mundo. É estratégico estar aqui e essa sempre foi a minha ideia de expansão do negócio”, diz ele, que nos EUA também é membro do grupo Forbes Business Council, uma organização em que participam apenas convidados, entre proprietários, fundadores de empresas e líderes executivos que são experts em liderança, gestão, envolvimento do cliente, tecnologia e crescimento.
O desafio não é pequeno. O agro do Brasil é foco de grandes tradings nacionais e globais, como Amaggi, Bunge, ADM, Cofco, LDC, Agrex, Multigrain, entre outras. Mas a aposta é no digital, onde ainda é baixa a presença dos chamados Grain Marketplaces, ou seja, empresas e startups exclusivamente destinadas às operações pós-porteira.
Dos EUA, para onde tem grão no mundo
A Agro Club é uma plataforma que, embora tenha sede em Nova York, não atuava nos EUA. As operações no país sede começaram timidamente em meados de 2023 e devem se intensificar neste ano, a partir de um escritório já instalado no estado do Kansas. “Já temos seis pessoas trabalhando e começamos as primeiras operações. É importante estar em casa, até porque os Estados Unidos são um grande produtor de grãos”, diz Kirin. “Pelo potencial do país, a minha expectativa é que daqui três ou quatros anos os negócios nos EUA estejam no mesmo patamar, em lucros, que no Brasil”. Na soja, uma das principais commodities do mercado global, a estimativa para a safra 2023/24 é de 160,1 milhões de toneladas colhidas no Brasil e de 111,7 milhões de toneladas nos EUA. De milho, o Brasil deve colher 118,5 milhões de toneladas e os EUA, 386,9 milhões de toneladas.
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A história da construção do negócio de Kirin no agro, conta ele, começou por acaso. Ele se formou na Universidade de Pittsburgh, em 2007, e em 2009 terminou um MBA na Universidade de Saint Louis, mesmo ano em que se tornou analista financeiro na Monsanto, vendida para a Bayer em 2016 por US$ 63 bilhões.
A sede da Monsanto ficava em Saint Louis, mas em 2012 a empresa transferiu Kirin para a Rússia, país que produz cerca de 160 milhões de toneladas de cereais, com destaque para o trigo que, segundo a SovEcon, deve chegar a 91,3 milhões de toneladas em 2024. “Eu entrei por acaso no agronegócio, mas gostei logo de cara. Eu me identifiquei com o ambiente, com as soluções que eu podia oferecer ao segmento e também com o propósito do setor na produção de alimentos”, diz ele. “Falando com os agricultores durante meus anos de executivo, percebi que eles tinham uma certa dificuldade na negociação da safra. Tinha um buraco na transação e faltava transparência na operação”.
Kirin diz que seu desejo era empreender e apostar no negócio próprio, daí a ideia de fazer carreira solo. “Minha família não é do agronegócio, mas sempre foram empreendedores, então eu já tinha isso no meu DNA. Escolher abrir a própria empresa era um caminho muito natural para mim”, afirma. “A ideia sempre foi ter algo simples, em que o produtor rural pudesse visualizar o processo e o valor da operação de forma instantânea”.
Mas como “ter ideias é fácil, executá-las é que o difícil” foram dois anos de estudos sobre o mercado global de grãos para tirar o projeto do papel. Assim, aos 31 anos, ele criou a Agro.Club,com a primeira unidade justamente na Rússia. Atualmente, em todo o mundo, a plataforma possui 45 mil produtores cadastrados. “A tecnologia foi essencial para transformar o meu negócio. Muitos acham que temos uma plataforma mágica, mas na verdade é simples”, diz Kirin. “Baseamos o serviço em duas etapas. A primeira delas é identificar o valor de mercado, considerando preço da bolsa e outros fatores e com isso ver todas as possibilidades para aquela transação. A segunda parte é decidir a melhor forma de realizar aquele negócio. Fazemos todo o trâmite, desde o início da operação, resolvemos a logística, até chegar no processo final com a commodity em seu destino”.
Kirin conta que não teve investidores no início de sua empreitada, dizendo que “todo o valor para abrir o negócio veio das minhas economias durante minha carreira de executivo”. Mas hoje é diferente. Estão no conselho e apoiam a expansão global da Agro.Club nomes como o Elevator Ventures, parte integrante da estratégia de inovação Raiffeisen Bank International, com sede em Viena, na Áustria; a Speedinvest, aceleradora que reúne cerca de 500 investidores e cerca de 40 gestores de investimentos; a Rabo Frontier Ventures, fundo de investimento com 275 milhões de euros para negócios globais, e a VentureFriends, que nasceu na Grécia que depois se expandiu para investimentos mundiais em startups, entre elas food techs, marketplaces e consumer tech.
Não por acaso, Kirin acredita em crescimento no país por causa dos apoios e também pelo histórico rápido até aqui. Ele começou no Brasil com 5 funcionários e atualmente são 50. No mundo todo são 250. Outro ponto são os apoios. Na Rússia, ele chamou um amigo de infância para tocar o negócio, Dmitry Taratuta, que hoje é o CEO. No Brasil, a parceria foi com o engenheiro Pedro Salles, no cargo de CEO, que já passou por empresas como a trader de etanol Delta, a Copersucar, Gavilon e Agribrasil.
“Quando o Egor me chamou conversamos por um bom tempo e decidi aceitar o desafio porque a Agro.Club me permitiria implantar o que eu sempre desejei que era inserir tecnologia na comercialização de grãos”, diz Salles. “O maior desafio no início foi encontrar o coração da equipe. Selecionar pessoas capacitadas, mas que acreditassem no projeto, que compartilhassem a ideia de criar soluções através da tecnologia”, diz Kirin. E completa: “a expectativa de crescimento continua. Isso se deve ao potencial agrícola brasileiro, à mente aberta dos agricultores em adotar novas tecnologias e, especialmente, à equipe liderada pelo Pedro. Os agricultores têm que se preocupar com o campo e nós cuidamos do resto.”