Bernard Arnault é o homem mais rico do mundo, a princípio, graças à primazia no varejo de joias, perfumes e outros artigos de luxo, como bolsas, roupas e sapatos. Mas na base do lucro da LVMH (Louis Vuitton, Moët e Hennessy), o prestigiado império que faturou 86,15 bilhões de euros (R$ 470,37 bilhões na cotação atual) em 2023, é o agronegócio que responde por parte das matérias-primas utilizadas. Nesse setor da economia — e não só nas vitrines — o empresário de 75 anos, com fortuna de US$ 233 bilhões (R$ 1,1 trilhão), é peculiarmente estratégico.
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A holding francesa com sede na avenida Montaigne, em Paris, fechou balanço no ano passado com faturamento 9% acima do registrado em 2022, adicionando à fortuna pessoal de Arnauld US$ 22,1 bilhões (R$ 111,1 bilhões), conforme noticiou a Forbes na semana passada. O montante garantiu que ele mantivesse a maior riqueza do mundo pelo segundo ano consecutivo, acima de Elon Musk, dono da Tesla, e Jeff Bezos, da Amazon. Os negócios do bilionário estão divididos em seis setores. Dois deles, o segmento de moda e bens de couro, e o segmento das bebidas, faturaram 48,7 bilhões de euros (R$ 265,4 bilhões), equivalente a 56,5% da receita.
Entre eles, o resultado de mais de mais de 1,7 mil lojas ao redor do mundo e 75 marcas, com roupas, acessórios e bolsas da Louis Vuitton, foi o segundo setor mais lucrativo entre todos. Moda e bens de couro cresceu 9% em 2023, com receita de 42,17 bilhões de euros (R$ 229,8 bilhões). “A Louis Vuitton teve um excelente ano”, declarou a empresa em janeiro, na apresentação dos resultados. O setor de bebidas faturou 6,6 bilhões de euros (R$ 35,9 bilhões), 4% a mais do que no ano anterior.
O couro, a matéria-prima nobre do negócio, vem de vários curtumes que processam pele bovina, de ovelhas, crocodilos e outros. Parte das empresas processadoras de couro foram compradas ou outras Arnault se tornou sócio. Duas aquisições são icônicas: o francês Roux, desde 2012, e o espanhol Riba-Guixá, do qual se tornou sócio em 2015. Fundado em 1803, o Roux é especializado em couro bovino de alta qualidade e fornecedor a outras marcas de luxo. O Riba-Guixá tem 80 anos de história, com sede em Barcelona, e também produz couro fino.
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Outra tacada veio em 2011, quando a LVMH comprou a maioria das ações da Heng Long, curtume de Singapura que processa couro de crocodilo desde 1950, num investimento de US$ 160,8 milhões (R$ 804 milhões). É desse couro a bolsa mais cara, lançada em novembro do ano passado – a Millionaire Speedy –, aquela de US$ 1 milhão, cravejada de diamantes e que, feita sob encomenda, provocou rebuliço nas redes sociais. Parte dos couros são provenientes da captura legal de crocodilos selvagens no rio Nilo, no Egito, e outra parte vem de fazendas de criação no Vietnã, país que exporta cerca de 30 mil couros de crocodilo, por ano.
Outros negócios vieram por meio da Métiers d’Art, empresa criada em 2015 pela LVMH para as aquisições e participações no segmento. Entre as participações visando couro bovino de alta qualidade, em 2019 a empresa se tornou acionista minoritária do curtume italiano Masoni, de Florença. Em 2023, foi a vez do Nuti Ivo, sediado na Toscana e que exporta 85% da produção. Entre os fornecedores, também no ano passado a Métiers d’Art fez parceria com o Verdeveleno, tradicional curtume espanhol de Valência especializado em peles exóticas, como cobras píton e lagartos.
O império das uvas, vinhos, espumantes e champanhe
Outro exemplo da importância do couro para as empresas do bilionário Arnault é a linha de produtos de base vegetal. Esse tipo de “couro” foi lançado no desfile da LVMH pela estilista inglesa Stella McCartney, em outubro de 2023, durante a Paris Fashion Week. O produto é fabricado a partir dos resíduos da produção do champanhe Veuvet Clicquot, que figura entre as garrafas mais caras do mundo e também pertence à companhia. O “couro” vegetal foi utilizado na criação de três bolsas e dois tipos de sandálias da Louis Vuitton, além de um suporte exclusivo para garrafas de Veuve Clicquot Yellow Label, um dos rótulos da fabricante.
Arnault consagrou-se no vinho, espumantes e champagne não somente com um amplo portfólio de rótulos, produzido em 26 vinhedos (o mais antigo deles datado de 1365), mas também por produzir algumas das bebidas do mais alto padrão de qualidade no planeta.
O antigo vinhedo Clos de Lambrey, que ocupa 8,7 hectares na Côte de Nuit, na Borgonha, é a propriedade que melhor ilustra o poderio da holding francesa na viticultura.
A história do lugar remonta ao século 14 e, posteriormente, à Revolução Francesa iniciada em 1789, quando a lavoura tinha 74 donos. Em 1981, as bebidas da propriedade ganharam o título de Grand Cru, que se refere aos grandes vinhos produzidos na França. O Domaine des Lambrays foi comprado pela LVMH em 2014, e hoje produz um pinot noir, o Clos de Lambray, considerado um dos 100 melhores do mundo.
Já a casa Moët & Chandon, que atualmente também pertence à LVMH, é uma produtora de vinhos espumantes, fundada em 1743 na comuna de Eparney, leste da França, conhecida por suas vinícolas. O vinhedo tem 1,1 mil hectares com solo rico em calcário, na rota do champanhe. As caves da propriedade são as mais extensas da região, com 28 quilômetros formando um labirinto subterrâneo onde o vinho fica armazenado. A produção é estimada em cerca de 30 milhões de garrafas por ano, ou 10% da produção local. É ali que se fermenta o requintado cuvée Dom Pérignon.
Arnault aposta na agricultura regenerativa
No agronegócio, Arnault não ficou de fora das tendências e principais desafios do setor em nível global. Em agricultura regenerativa, que hoje é uma das principais frentes de atuação ecológica da economia rural no mundo todo, a LVMH anunciou uma parceria estratégica com a CBA (Aliança de Bioeconomia Circular, na sigla em inglês), um network global de transição climática criado em 2020 pelo rei da Inglaterra, Charles III, durante a COP27, realizada em novembro de 2022 no Egito. O programa LIFE360 prevê a recuperação de cinco milhões de hectares de solo degradado até 2030.
Uma das iniciativas do programa apoiado pelo bilionário é resgatar o Lago Chade, localizado na África Subsaariana, próximo à Nigéria, que diminuiu 90% entre 1963 e 2001 e tende a desaparecer em 20 anos, em função da produção industrial de algodão com utilização intensiva da água. O Living Lab, um dos braços de atuação da CBA, com apoio da LVMH, comprometeu-se a apresentar os métodos de produção por meio da agricultura regenerativa para 500 produtores da região, que devem plantar árvores frutíferas ou madeireiras junto aos algodoais.
Vale citar que a África Ocidental compreende doze países produtores de algodão (Benim, Burkina Faso, Camarões, República Centro-Africana, Chade, Costa do Marfim, Gana, Mali, Níger, Nigéria, Senegal e Togo) — destes, o maior produtor é o Mali, com 750 mil toneladas da fibra por ano, segundo o USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos).