Os estímulos à importação de arroz que estão sendo implementados pelo governo brasileiro podem desestimular produtores do Rio Grande do Sul a semear a próxima safra (2024/25) e gerar um problema futuro na oferta, afirmaram integrantes da federação dos agricultores do Estado nesta segunda-feira.
Segundo os representantes dos produtores rurais gaúchos, o programa do governo federal que destina mais de R$ 7 bilhões para apoiar a compra de arroz importado, para depois a estatal Conab vendê-lo ao varejo com exigência de preços controlados, é a “maior intervenção” no mercado desde o início do Plano Real, há 30 anos, que já se mostrou ineficaz no passado.
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Em entrevista para comentar os impactos das enchentes para o Rio Grande do Sul, Estado que responde por cerca de 70% da produção de arroz no país, o presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Gedeão Pereira, lembrou que o Estado havia colhido grande parte de sua produção de arroz antes das inundações.
Assim, ele considerou o apoio estatal a importações como “desnecessário”, afirmando que há oferta interna suficiente, e ainda qualificou de “tresloucada” a medida que autoriza compras de até 1 milhão de toneladas de arroz importado.
“O ministro parece que se preocupou muito com a importação de arroz, não com salvar os produtores do Rio Grande do Sul”, afirmou Pereira, mencionando o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, Na terça-feira, Fávaro vai instalar um gabinete itinerante da pasta no Estado.
O preço do arroz em casca posto na indústria do Rio Grande do Sul subiu quase 13% no acumulado do mês até a última sexta-feira, para 120,95 reais a saca de 50 kg, segundo indicador levantado pelo centro de estudos Cepea.
De acordo com presidente da Farsul, isso teria sido causado mais por problemas logísticos para retirar a produção e por dificuldades para se emitir notas fiscais em meio às enchentes.
“Não tem por que essa importação intempestiva. Ainda com preço subsidiado, porque a R$ 4 que eles querem colocar no saco (no supermercado) deverá ter subsídio em torno de 20% no quilo. Parece que veio afundar mais o produtor rural, e justamemte em um setor que estava se reabilitando”, afirmou.
Ele citou o preço estabelecido para o quilo do arroz no programa da Conab, que venderá o produto diretamente para supermercados, hipermercados, atacarejos e outros estabelecimentos comerciais, exigindo a revenda ao consumidor com controle de preços.
Pereira lembrou que o Rio Grande do Sul, que já plantou no passado mais de um milhão de hectares de arroz, elevou a área plantada na última temporada. Disse que, se o preço cair novamente, o Estado pode reduzir a safra.
Procurado, o Ministério da Agricultura não comentou o assunto imediatamente.
Intervenção
Para o economista-chefe da Farsul, Antonio da Luz, o programa do ministério “será a maior intervenção em preço de produto não administrado desde o início do Plano Real”.
“Uma coisa é intervir em energia e combustível, mas são preços administrados, agora preço de arroz, que não é administrado, a última vez que isso aconteceu não tínhamos nem a moeda que temos hoje”, afirmou.
Ele lembrou que o Brasil já viveu tabelamento de preços no passado, e “sabemos que isso não funciona”. “A Argentina estava fazendo isso até pouco tempo atrás, e vimos onde deu”, afirmou.
Já o presidente da Farsul afirmou que o planejado apoio à importação de arroz resultará na chegada do produto apenas no segundo semestre. “Leva 70 a 90 dias para viabilizar carga da Tailândia e ou outro país asiático”, afirmou.
Além do programa da Conab, o governo anunciou tarifa zero de importação de arroz para ampliar as compras externas.
Perdas de R$ 3 bilhões
As perdas nas lavouras inundadas do Rio Grande do Sul são estimadas em ao menos R$ 3 bilhões, com maior impacto na soja e menor nas plantações de arroz, avaliaram representantes da Farsul, que não deu números de colheita para o Estado
Estes prejuízos não incluem aqueles problemas com as infraestruturas e silos.
“No entanto, há perdas imensas em áreas não inundadas, mas não conseguimos calcular ainda. Onde foi inundado é fácil calcular porque conhecemos a área, e a perda é de 100%”, disse o economista-chefe da federação.
Na soja, a cultura mais afetada, ainda que a colheita estivesse já 75% concluída, produtores citaram problemas com grãos ardidos, brotados e podres, além de cargas com umidade acima do normal. Em muitos casos, afirmou a Farsul, os armazéns dos compradores ou cerealistas não estão recebendo os carregamentos pelos problemas de qualidade.
Para tentar reduzir os impactos, a Farsul está solicitando ao governo federal um programa que envolva renegociações de dívidas que alongue os vencimentos, com período de dois anos de carência, além de juros de 3% ao ano.