“É muito importante que as tecnologias biológicas passem a ser usadas progressivamente por todos os agricultores. Entre os produtores orgânicos, essa é uma prática, mas as tecnologias também têm valor para os agricultores convencionais e não biológicos, e podem realmente ajudá-los a enfrentar as alterações climáticas, a lidar com os
recursos limitados disponíveis, sejam fertilizantes ou água”, disse o agrônomo francês Frederic Beudot, radicado nos EUA e que falou com a Forbes direto de Indianápolis, onde está a sede global da Corteva, multinacional de produtos químicos, biológicos e sementes. Beudot está na empresa desde 2017, e em março de 2023 foi alçado a líder global da Corteva Biológicos.
A data é significativa. No dia 2 daquele mês, depois de seis meses de tratativas, a Corteva fez um duplo anúncio, fechando a compra da Symborg, com sede em Múrcia, na Espanha, que se dedica à pesquisa de tecnologias microbiológicas; e da Stoller, uma das maiores empresas independentes do setor, com sede em Houston (EUA) e presente em 50 países, inclusive no Brasil.
Em 2023, a Corteva faturou globalmente US$ 17,2 bilhões(R$ 85,4 bilhões na cotação atual),cm um Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização)de US$ 3,38 bilhões (R$ 16,8 bilhões),alta de 5% ante o ano anterior.
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Insumos biológicos, ou bioinsumos, segundo Beudot, têm hoje umadefinição muito ampla. “Na Corteva, quando nos referimos à proteção biológica, estamos falando de produtos que têm origem natural, que podem ser microrganismos, bactérias, fungos, mas também podem ser moléculas desenvolvidas a partir de nutrientes que provocam uma resposta específica na planta para obter um determinado efeito benéfico.”
A Corteva tem cerca de 30 diferentes tecnologias de base, para uma centena de produtos de prateleira, e outras seis
tecnologias em diferentes estágios de desenvolvimento no pipeline. “É uma evolução contínua na combinação de
diferentes tipos de tecnologias. E muitos dos nossos produtos hoje já utilizam duas ou três tecnologias diferentes”, afirma Beudot, fazendo uma retrospectiva do primeiro ano dessa iniciativa global. “Foi um dia incrível aquele 1º de março, e eu nunca vou me esquecer. Tínhamos equipes em todo o mundo para iniciar a transição das aquisições e, nos últimos 12 meses, trabalhamos com as lideranças nesse sentido.”
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Com uma forte presença global em cerca de 60 países, a Corteva tem expertise em sequenciamento de genes, em fermentação e acesso ao mercado, e corre para ser dona, também, de uma fatia da demanda global de produtos biológicos agrícolas, setor que é gigante e crescente.
Segundo a Roots Analysis, que faz pesquisas globais e consultoria, em 2023, a área foi estimada em US$ 13,76 bilhões (R$ 68,3 bilhões), e deve chegar a US$ 43,53 bilhões (R$ 216,2 bilhões) até 2035, representando um CAGR (taxa anual composta) de 9,98% no período.
Hoje, a Europa é a maior produtora de insumos biológicos, enquanto o Brasil é o maior consumidor global. E com equipe reforçada, por causa do potencial de crescimento local do uso de tecnologias biológicas. Desde dezembro do ano passado, Beudot tem em sua equipe a brasileira Ana Claudia Cerasoli, que hoje é líder global de Integração para Biológicos. Cria da casa, Cerasoli é engenheira química e está na empresa desde o ano 2000, quando ingressou na DuPont – lembrando que foi da fusão das gigantes químicas Dow AgroSciences e DuPont que a Corteva nasceu em 2019.
Depois do Brasil, o segundo maior consumidor é a Argentina, seguida de Espanha e Turquia. “Em termos de tamanho, os EUA também são um mercado muito grande, que continua crescendo e expandindo”, afirma o executivo. Em infraestrutura, a empresa está investindo no país, no município de Cosmópolis, interior paulista, desde 2019, quando a unidade passou por uma grande reforma. Depois disso, para melhorias e processos, os valores aplicados na fábrica tem sido da ordem de US$ 3,5 milhões por ano.
Amigos do meio ambiente, os biopesticidas, biofertilizantes e bioestimulantes têm sido utilizados com o principal objetivo de reduzir a dependência dos químicos convencionais, respondendo à demanda crescente dos consumidores por práticas agrícolas sustentáveis. Em termos globais, não há uma projeção muito clara de futuro entre os distintos cultivos, mas, no caso do Brasil, a soja é o principal mercado.
A previsão do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) é de que a área destinada aos grãos na safra 2032/33 pode chegar a 92,4 milhões de hectares, dos quais 55,8 milhões serão de soja – hoje, a área da leguminosa é de 43,8 milhões de hectares. “Na Corteva Biológicos, em negócios, as cinco principais culturas são soja, milho, cana-de-açúcar, café e algodão”, diz Beudot. “Há negócios importantes para fruticultura e hortaliças, mas ainda não são mercados em larga escala.”
Não por acaso, a empresa foi a primeira com um produto biológico certificado pelo USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), garantindo que nele não há qualquer tipo de contaminação por outro agente. “Encontrar os organismos certos com a atividade certa é apenas a primeira metade do trabalho. É igualmente importante como ele é produzido, como se estabiliza e como é formulado para que expresse esse valor na fazenda”, afirma Beudot.
“Essa é a diferença do biológico. No químico, gastamos até 90% dos nossos recursos para encontrar a molécula certa e descobrir como produzi-la. No biológico, não basta ter o melhor organismo. É preciso mantê-lo vivo durante o processo de fabricação até chegar ao campo”, diz ele. (*Reportagem publicada originalmente na Revista Forbes e atualizada depois de aberta ao público)