“Colocamos um risco no chão”, disse Carlos Fávaro, Ministro da Agricultura e Pecuária (Mapa), sobre a retratação do CEO global do Carrefour, Alexandre Bompard, nesta terça-feira (26), na abertura do Forbes Agro100, evento fechado ocorrido em São Paulo e que reuniu cerca de 200 empresários, cooperativas e lideranças do setor. O evento começou poucas horas depois do ministro receber uma carta de retratação de Bompard. “Em hipótese alguma vamos aceitar que alguém deturpe o que fazemos com excelência”. O risco no chão, para Fávaro, significa “até aqui nós vamos dialogar.”
Fávaro destacou o trabalho da Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carne (Abiec), entidade que representa 43 grupos exportadores de carne bovina e que rapidamente mobilizou seus maiores nomes. “As grandes empresas, as indústrias de alimentos, como JBS, Marfrig, Minerva, e todas as outras de alimentos, são competentes em produzir alimentos com segurança”, disse. Entre elas, por exemplo, a ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal), que entrou no trabalho de mobilização de suas cadeias de aves e suínos. “Há um Brasil que fala por si em seu protagonismo”.
O ministro destacou o intenso trabalho de abertura de novos mercados, grande parte deles interessados em proteína animal. Países como China, México, Singapura, República Dominicana, Japão, Peru, El Salvador, Chile e Israel estão na lista. “Foram 74 missões internacionais nesses pouco menos de dois anos”, disse ele. “O resultado disso? 281 novos mercados abertos até o dia de hoje e tem novos anúncios na semana que vem. Vamos chegar ao final de 2024, próximos – ou se não já -, com 300 novos mercados abertos.”
O episódio Carrefour, que o ministro considera encerrado, mostra que a empresa parece ter se esquecido de sua história no país. A partir de junho de 1974, mais do que uma rede varejista urbana, o Carrefour foi o primeiro hipermercado no Brasil que contou com um expert no comando: o francês Jacques Defforey (1923-2000), cofundador junto com o irmão Denis e Marcel Fournier. Defforey não apenas investiu no varejo, mas em fazendas em Mato Grosso e no Vale do São Francisco, em Petrolina (PE). No Centro-Oeste, montou um dos maiores projetos nos anos 2000.
Em Tangará da Serra (MT), um confinamento de gado funcionava como um centro de pesquisa de carne de qualidade, quando esse atributo era tema de academia. Muito do que hoje o Brasil entende de cruzamento industrial de raças bovinas veio desses experimentos. Já em Juruena havia um trabalho de preservação ambiental com 25 mil hectares de reserva e proteção de nascentes em áreas de pastagens, na época um dos raros trabalhos nesse sentido. A fazenda de Juruena, por exemplo, era parada obrigatória para Defforey em todas as vezes que esteve no Brasil. Hoje, a fazenda São Marcelo pertence à família de Marcos Molina, controlador da Marfrig.
Fávaro reforçou que “quem quiser ofender a qualidade dos produtos brasileiros terá resposta à altura, como ao Carrefour francês. Mas se retratou no ponto mais importante, onde diz que o Brasil cumpre as normas, que nós respeitamos a legislação e, o mais importante, a qualidade dos produtos”. Fávaro também lembrou a importância do Carrefour, que possui cerca de 1.200 pontos de venda no país e 130 mil funcionários. “O Carrefour é parceiro da agropecuária brasileira e das indústrias de alimentos. Portanto, precisamos separar isso. Dizer que foi uma atitude intempestiva do presidente global do Carrefour, mas que foi corrigida e vida que segue”.
Para ele, existem formas de sanar todos os questionamentos com relação aos produtos do agro brasileiro. “A primeira é o diálogo reforçando o nosso compromisso com o que o comprador quer. Se quer boas práticas de sustentabilidade e é cabível, vamos aperfeiçoar o modelo e estamos prontos para isso”.
O ocorrido deixa um legado, segundo Fávaro, àqueles que “ousarem falar mal dos produtos brasileiros”, reforçando que o país está aberto para discutir sustentabilidade, rastreabilidade e boas práticas. “Acabamos de aprovar a lei que mensura o sequestro de carbono, ou seja, o Brasil está na pauta ambiental de forma muito altiva”. Fávaro se refere ao projeto de lei que regulamenta o mercado regulado de emissão de carbono por meio do PL 182/2024, que fundamenta o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) e que permitirá a negociação de Cotas Brasileiras de Emissão (CBE) e de certificados de redução ou remoção verificada de emissões (CRVE).
No painel “O Agro em 2025, perspectivas e expectativas”, mediado pela editora da Forbes Agro, Vera Ondei, Fávaro falou também sobre os trâmites do acordo Mercosul-UE. Disse que a decisão tem sido liderada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que ele está perto do final, mas quem não quiser assinar, não assina. “Nós queremos muito e o presidente Lula quer formaliza-lo, porque supera os desafios entre os países”. O acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia tem sido alvo de protestos, especialmente dos franceses e poloneses. Ele vem sendo negociado há mais de 20 anos e acordado politicamente a partir de 2019, no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Outro ponto foi o próximo Plano Safra que, segundo o ministro, já está sendo discutido e que o governo está atento às necessidades de ampliar recursos para o setor. “Nesse cenário de ajuste fiscal, trago aqui uma informação que não foi explícita sobre a decisão do tamanho do Plano Safra 2024-2025, em um momento onde as commodities estão com os preços retraídos e ainda com custo de produção elevado.”
Fávaro disse que o agro está fora de um cenário de cortes que é dado como certo e que está prestes a ser anunciado. Ele também lembrou da ampliação dos recursos ao Plano Safra 2023/24 e da necessidade atual de modernizar as regras para o fluxo de recursos internacionais ao setor, com juros competitivos. “Estamos captando recursos, por exemplo, da japonesa JICA, hoje, para um programa de recuperação de pastagens, de recursos a 2% ao ano”, disse ele.
JICA é a sigla para a agência do governo japonês responsável pela implementação da Assistência Oficial para o Desenvolvimento (ODA), braço do ministério das relações exteriores do país asiático. Os recursos são da ordem entre US$ 1 bilhão e US$ 1,5 bilhão, entre governo e iniciativa privada. “Temos um desafio, sim, de ampliar no mercado financeiro iniciativas para trazer recursos mais baratos”, afirmou Fávaro, visando o próximo Plano Safra.
O evento Forbes Agro100, que apresenta o ranking 2024 com as 100 maiores empresas e cooperativas com balanços públicos referentes a 2023, contou com o patrocínio de Chevrolet e Vibra Energia, mais a Royal Salute.