Quem poderia imaginar que uma simples cebola cozida, uma “onion boil”, se tornaria a nova obsessão do TikTok? Pelo menos é o que está acontecendo nos Estados Unidos. Em um mundo onde as tendências alimentares mudam diariamente, este prato despretensioso conquistou corações e visualizações. Fato é que a #FoodTikTok pode até ter apresentado a cebola cozida como algo novo, mas as suas raízes são muito mais profundas.
E mais, o nome “cebolas cozidas” pode fazer alguns imaginarem elas borbulhando em uma panela de água, mas não é. Na maioria das versões deste prato, as cebolas são assadas ou grelhadas e a parte “cozida” do nome refere-se à mistura de temperos, inspirada nas especiarias normalmente usadas em “seafood boils” — cozido de frutos do mar, prato típico do sul dos Estados Unidos — reinterpretada para a cebola.
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Onde começa a tendência da cebola
“Já ouvi falar de ovo cozido, de frutos do mar cozidos, mas cebola cozida?”. Essa frase é de um vídeo que foi publicado pela TikToker @doll_mimi, produtora de conteúdo, em junho deste ano na rede social Tik Tok. Foi assim que começou a trend da cebola.
Não demorou para o vídeo gerar curiosidade entre os usuários da rede e viralizar. A trend da cebola cozida acumulou 2,4 milhões de visualizações, 269 mil curtidas, 1.900 comentários, 28,3 mil salvamentos e 20,4 mil compartilhamentos. Outros TikTokers contribuíram para a onda, alguns com mais de 1 milhão de seguidores como @bellyfull.net.
Outros criadores também surfaram na trend e compartilharam versões próprias com temperos ou coberturas adicionais. Alguns comentários chamaram o prato de “perfeição em comfort food”, enquanto outros se sentiram atraídos por seu estilo despojado, sem ingredientes sofisticados ou passos complicados. A rede social também se tornou um espaço para compartilhar receitas à base de cebola e trocar memórias de pratos afetivos.
Essas interações transformaram um alimento básico do dia a dia em um prato viral, mostrando como os ingredientes mais simples podem ganhar outro destaque.
A Jornada da Cebola
A cebola é um ingrediente milenar em todo mundo, com origens na Ásia Central. À medida que foram compradas por outros países, o vegetal ficou conhecido por sua resistência e sabor. De acordo com a Associação Nacional de Cebola dos Estados Unidos, organização que representa produtores de cebola, os antigos egípcios usavam a hortaliça em rituais funerários, simbolizando a eternidade. Os gregos, por sua vez, introduziram esse alimento em sua dieta por causa da facilidade de cultivo e do sabor marcante.
No Brasil, estima-se que o vegetal foi introduzido durante a colonização portuguesa, mas ganhou maior proporção no século 18, na região Sul. Neste caso, não foi preciso uma trend para popularizar a hortaliça, já que o país está entre os oito maiores produtores mundiais de cebola e produz cerca de 1,5 milhão de toneladas anuais.
Segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA Esalq/USP), a área de produção do vegetal no Brasil é de cerca de 45 mil hectares e se concentra, principalmente, em Santa Catarina, Bahia, Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul e Goiás. Tamanha produção torna a cebola a terceira hortaliça com maior importância econômica do país.
A tendência da cebola cozida resgata seu legado como ingrediente considerado simples, acessível, versátil e nutritivo. Pesquisas, incluindo um estudo publicado no PubMed, principal plataforma de estudos acadêmicos da medicina global, mostram que as cebolas são ricas em antioxidantes e compostos benéficos para o coração.
Preparação Simples com Raízes Profundas
Embora a “cebola cozida” seja nova no TikTok, assar cebolas não é uma ideia recente. Na verdade, receitas como essa existem há séculos. Um exemplo vem do livro de culinária mais popular do século 19, de 1808, “Um novo sistema de cozinha doméstica”, de Maria Rundell, que inclui uma receita de cebolas assadas com alguns temperos para realçar seu melhor.
Em 2019, a receita foi recriada no canal de culinária histórica norte-americano, Townsends, mostrando como gerações passadas transformavam ingredientes básicos em algo especial muito antes do TikTok.
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Os turcos, armênios e gregos também apreciam uma boa cebola assada e recheada. Pratos como Soğan Dolması da Turquia, Sogan Tourmasi da Armênia e Gemista me Kremmydia da Grécia são alguns dos muitos que transformam cebolas em refeições robustas, que costumam ser recheadas com arroz, carne ou ervas.
O Poder das Comfort Foods
O apelo da cebola cozida pode estar relacionado ao movimento gastronômico de comfort foods, ou seja, comidas que proporcionam alívio emocional e se encaixam na categoria de alimentos nostálgicos e físicos.
A cebola cozida, com seus sabores salgados e textura macia e caramelizada, captura o que as pessoas procuram em uma comfort food, algo familiar e satisfatório.
Como as Tendências Virais Reinterpretam a Tradição
A frase “tudo que é velho é novo outra vez” não poderia ser mais adequada para a cebola cozida. Conversas nas comunidades da rede social Reddit mostraram que para cozinheiros experientes, essa “tendência” parece mais um velho amigo do que uma descoberta inovadora. Para eles, a cebola cozida é um método que existe há muito tempo.
A natureza das tendências, como a que viralizou no Tiktok, reformula práticas antigas, levando-a a um público que talvez nunca tivesse considerado cozinhar cebolas como um prato principal.
* Stephanie Gravalese é colaboradora da Forbes EUA. Escreve sobre temas como gastronomia, preservação de alimentos e a indústria de cervejas artesanais. Ela também comanda o Food Stories Told podcast.