Os líderes do agronegócio no Brasil vivem um paradoxo: estão mais otimistas em relação à economia do que seus pares globais, mas reconhecem desafios estruturais que podem comprometer a sustentabilidade do setor. Essa é a principal conclusão da 28ª edição da Global CEO Survey, realizada pela PricewaterhouseCoopers (PwC) e divulgada nesta terça-feira (4). A pesquisa ouviu cerca de 4.700 executivos em mais de 100 países, trazendo insights sobre as principais tendências e preocupações da alta gestão empresarial. Segundo a PwC Brasil, o país que mais respondeu à pesquisa.
Entre os CEOs do agronegócio brasileiro, 76% acreditam que a economia local vai acelerar nos próximos 12 meses, acima da média nacional (73%) e bem acima da média global (57%). “Passamos por uma crise sanitária gigantesca e por conflitos geopolíticos que trouxeram impactos relevantes para as economias. Mas já percebemos uma resiliência maior e uma estruturação dos negócios que acaba trazendo mais confiança para o crescimento da economia”, diz Mauricio Moraes, sócio e líder do setor de Agribusiness da PwC Brasil. “O ano passado foi muito desafiador para o agro. Há uma crença de que setores que estavam mais afetados tentam uma retomada a partir do final do primeiro semestre, início do segundo semestre de 2025. Existe, de fato, uma tendência de melhora.”
Leia também
Apesar do otimismo, a pesquisa também acende um alerta: 44% dos CEOs do agronegócio acreditam que suas empresas não serão viáveis economicamente por mais de dez anos sem mudanças significativas. O índice é 13 pontos percentuais maior do que o registrado em 2024, reforçando a necessidade de reinvenção.
De acordo com o executivo, as mudanças em tecnologia estão trazendo um impacto bastante grande nas organizações, seja em função de novos competidores chegando no mercado, “às vezes até de setores inesperados, seja na necessidade dos CEOs tomarem decisões mais rápidas, com mais qualidade e menos chance de erro”. “Há uma pressão enorme para que os CEOs acompanhem essas transformações, entendam as novas tecnologias, revejam seus modelos de negócios e ajustem suas estratégias para se manterem relevantes nos próximos 10 anos”, diz Moraes.
Mudanças climáticas e IA Generativa
A principal ameaça identificada pelos líderes do setor é o impacto das mudanças climáticas, mencionada por 56% dos entrevistados. O índice é muito superior à média global (14%) e nacional (21%). “Os eventos climáticos extremos estão pressionando a produção e a competitividade do setor. Precisamos acelerar a adaptação e adotar soluções mais sustentáveis”, alerta Moraes.“Mudanças climáticas não necessariamente significam sustentabilidade, mas estão dentro desse conceito.”
Mauricio Moraes é sócio e líder do setor de Agribusiness da PwC Brasil
O impacto ambiental, no entanto, não é o único fator de preocupação. A falta de mão de obra qualificada foi citada por 38% dos CEOs do agronegócio, um percentual também superior à média nacional (30%). “O setor vem avançando na digitalização, mas ainda enfrenta dificuldades para atrair profissionais qualificados”, aponta o relatório.
Enquanto enfrenta desafios climáticos e de qualificação, o agronegócio brasileiro aposta na inteligência artificial (IA) generativa como ferramenta estratégica para melhorar a produtividade e a rentabilidade. Nesta seara, 61% dos CEOs esperam que a tecnologia impulsione a lucratividade em 2025, um salto em relação aos 46% de 2024. Além disso, 86% planejam integrar IA a plataformas tecnológicas, percentual bem superior à média nacional (69%).
“Estamos vendo uma adoção acelerada da IA generativa no campo, com impacto direto na eficiência operacional e na tomada de decisão”, diz Moraes. No entanto, a pesquisa revela que os ganhos financeiros concretos ainda são limitados: apenas 24% dos CEOs do agronegócio relataram aumento da lucratividade com IA em 2024, contra uma expectativa inicial de 46%.
“Os dados da pesquisa mostram que, neste momento, a IA está contribuindo muito para eficiência, redução do tempo dedicado a determinadas atividades e geração de dados mais rápidos para gestão e tomada de decisão”, afirma Moraes. “Poucos respondentes afirmaram que reduziram a força de trabalho por causa da IA. A tecnologia não está chegando para causar desemprego, mas sim para exigir novas habilidades e gerar mais resultados no futuro.”
De acordo com o executivo, há um grande desafio muito influenciado por inovações tecnológicas e novos entrantes no mercado. Uma dessas variáveis é o risco climático. “E a inteligência artificial pode ser uma ferramenta de apoio na gestão desses riscos. No caso do clima, por exemplo, modelos de predição com IA têm sido cada vez mais utilizados e há muitos investimentos sendo feitos para antecipar situações climáticas. Isso ajuda em momentos estratégicos, como plantio, colheita, proteção de culturas e investimentos.
Além da IA, os investimentos sustentáveis vêm trazendo retornos relevantes: 47% dos CEOs do agronegócio afirmam que ações voltadas para a redução do impacto climático aumentaram a receita de suas empresas nos últimos cinco anos, bem acima da média nacional (30%).
Outro dado relevante mostra que 62% dos CEOs do agronegócio têm sua remuneração variável vinculada a métricas de sustentabilidade, reforçando a importância do tema nas estratégias corporativas. “Os investimentos em sustentabilidade não são apenas uma questão regulatória ou de reputação, mas uma fonte real de competitividade e rentabilidade”, aponta o relatório.
Transformação estrutural e reinvenção do setor
Os dados da PwC também mostram que o agronegócio está em plena transformação estrutural. A pesquisa aponta que 44% dos CEOs do setor relataram que suas empresas passaram a atuar em pelo menos um novo segmento nos últimos cinco anos, movimento impulsionado por investimentos em tecnologia e bioenergia.
Além disso, 44% dos executivos afirmam que fizeram parcerias com outras organizações para acelerar a inovação, um percentual 11 pontos percentuais acima da média nacional (33%). “O agronegócio está expandindo suas fronteiras e se integrando a setores como tecnologia e energia, o que abre novas oportunidades de crescimento”, diz Moraes.
Contudo, um desafio permanece: a realocação de recursos. Apenas 32% dos CEOs do agronegócio dizem realocar mais de 20% dos seus recursos financeiros ano a ano, um percentual abaixo da média nacional. O mesmo acontece com os recursos humanos: apenas 24% dos líderes do setor realocam mais de 20% da força de trabalho para novas funções ou projetos estratégicos.
