
Começou nesta quarta-feira (19) e termina amanhã, em São Paulo, a conferencia anual da World Cocoa Foundation (WCF), com o tema “Nosso Futuro: Resiliência Através da Sustentabilidade”. O evento reúne cerca de 400 participantes de mais de 40 países, incluindo agricultores de cacau, especialistas de empresas, governos, academia, doadores financeiros, filantropos, sociedade civil e imprensa, para discutir e colaborar em questões críticas do setor cacaueiro.
O setor global do cacau vive um momento decisivo. A combinação de colheitas em queda, preços recordes e novas regulamentações ambientais colocou toda a cadeia produtiva sob pressão inédita. O alerta foi feito por Chris Vincent, presidente da WCF, durante a abertura da conferência.
O preço do cacau chegou a quase US$ 13 mil por tonelada em dezembro de 2024, triplicando em relação ao ano anterior, antes de recuar para a faixa dos US$ 8 mil nos meses seguintes. A alta foi impulsionada principalmente pela queda na produção em Gana e na Costa do Marfim, países que juntos respondem por cerca de 60% da oferta global.
“Estamos enfrentando uma confluência de desafios: baixa renda dos produtores, mudanças climáticas, envelhecimento dos cacaueiros e produtores abandonando a atividade. Mesmo com os preços mais altos, muitos agricultores não conseguem se beneficiar por causa da queda na produção ou por limitações fundiárias”, afirmou Vincent.
Além do cenário climático e produtivo adverso, o setor passa por um corte significativo nos financiamentos ao desenvolvimento, tanto dos Estados Unidos quanto da Europa. De acordo com o presidente da WCF, os recursos futuros estarão cada vez mais vinculados aos interesses domésticos dos países doadores, o que limita a flexibilidade de aplicação e exige reestruturação nas estratégias de apoio à cadeia produtiva.
Outro fator de preocupação é a adaptação a uma nova onda de regulamentações ambientais, como a EUDR, da União Europeia, que exige comprovação de origem livre de desmatamento. A implementação dessas normas, que já foi adiada, deve ganhar força no segundo semestre e provocar mudanças significativas no funcionamento do setor.
“O escopo dessas regulamentações é amplo e complexo, envolvendo questões como biodiversidade, condições de trabalho e rastreabilidade. Precisamos entender como elas serão aplicadas e como os diferentes atores – empresas, produtores e governos – irão responder a elas”, explicou.
Para a WCF, a saída para o momento atual está na construção de resiliência por meio da sustentabilidade. Isso inclui investir em práticas produtivas mais eficientes, manejo adequado de pragas e doenças, diversificação de renda e modernização das lavouras.
O Brasil foi citado como referência nesse esforço pela sua liderança climática como anfitrião da COP30, e também pela experiência acumulada em cadeias agrícolas robustas. A agenda da conferência inclui a participação de especialistas brasileiros em temas como sistemas agroflorestais, o desenvolvimento de pequenos produtores de café e o controle da vassoura-de-bruxa.
Além da produtividade no campo, o evento também discute os impactos macroeconômicos da crise. O déficit no fornecimento global de cacau em 2024 foi o maior dos últimos seis anos. O aumento no custo de vida nos principais países consumidores também levanta dúvidas sobre o comportamento da demanda nos próximos meses, especialmente diante da pressão sobre os preços dos produtos finais.
“É fundamental usar esse momento de preços altos para gerar melhorias estruturais e preparar o setor para suportar os próximos choques, climáticos ou econômicos. Isso inclui ampliar a colaboração entre continentes no combate às doenças do cacau e participar ativamente da construção dos novos padrões regulatórios que estão por vir”, disse Vincent.