Quando, em 1958, Charles de Gaulle, então primeiro-ministro da França, exclamou a emblemática frase “Como alguém pode governar uma nação que tem 246 tipos de queijo?”, não imaginava que esse número viria a crescer, e muito – calcula-se que já são mais de mil tipos de queijo produzidos em território francês. Um verdadeiro universo de sabores para agradar o paladar dos franceses, os maiores consumidores mundiais (mais de 27 quilos de queijo por pessoa por ano, segundo a International Dairy Federation), e também o de seus fãs étrangers de qualquer nacionalidade.
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Visitar uma legítima fromagerie francesa, especialmente em Paris, é um ritual que começa antes de você entrar na loja. O aroma dos queijos, desagradável para muitos, inebriante para outros, é perceptível da calçada. Mesmo que você esteja no primeiro grupo, vença esse obstáculo e encante-se com a disposição impecável das vitrines.
A icônica loja parisiense Barthélémy, no bairro de Saint-Germain-des-Prés, tem em seu comando a fromager Nicole Barthélémy e um time composto exclusivamente por mulheres. Em seu pequeno espaço – normalmente disputado por muitos clientes – reúne mais de 200 variedades de queijos de diversas regiões da França. A especialidade da casa é o cremoso e aerado Fontainebleau. Para os mais atentos, vale reparar na pequena porta que acessa o porão da loja – ali a mágica acontece: o pequeno espaço é onde a especialista realiza a etapa final de maturação de seus produtos, o “voilá” para tornar seus queijos únicos.
A maturação (o envelhecimento dos queijos) é um dos grandes segredos das fromageries mais especiais de Paris. Segundo Bruno Cabral, proprietário da loja paulistana O Mestre Queijeiro, é um processo que pode ser comparado ao de uma obra de arte, onde é necessária “a sensibilidade e o conhecimento para decidir o tempo certo de maturação”, que é diferente para cada um deles (podem variar de um dia a meses ou até anos). “Durante a maturação, as bactérias, enzimas, fungos e as leveduras agem juntas e transformam o queijo. É aí que o queijo se torna mais digerível, consistente, com sabor melhor e aroma peculiar”, explica Cabral. O processo é também influenciado pela temperatura da câmara de maturação, a umidade e outras peculiaridades do local. No processo também é possível acrescentar ingredientes como banhos de cerveja, salmoura, carvão, cinzas de madeiras, ervas aromáticas… Não há limites para a criatividade do profissional.
O “mestre de maturação” é chamado de maître affineur – e, para um ótimo conhecedor, apenas olhar a aparência e sentir a textura da peça de queijo basta para ele decidir se já está em sua melhor condição de consumo.
Nas fromageries Laurent Dubois, o foco são os produtos feitos a partir de leite cru, ou seja, que não passaram por processo de pasteurização. Após a curadoria do proprietário homônimo, que herdou da família a afinidade pelo assunto, grande parte dos queijos também passa por processo de maturação nas caves, todas localizadas em Paris. Atualmente são quatro unidades espalhadas pela cidade, sendo que a mais recente foi aberta em 2018 – um espaço gourmet dentro da loja de departamentos Printemps (do Boulevard Haussmann), nos andares superiores da ala de moda masculina.
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A Androuët é uma queijaria mais que centenária e provavelmente a mais tradicional. No começo dos anos 1900, Henri Androuët já comercializava queijos de várias partes da França em Paris, e em 1934 seu filho Pierre se juntou a ele nos negócios. Nos anos 1950, a dupla firmou-se como os fromagers mais famosos do mundo. O legado pode ser conferido até hoje em nove unidades da Androuët espalhadas por Paris, onde, além da vasta variedade de queijos de leite cru e maturados, são oferecidos aulas, degustações e seminários.
Uma festa francesa
Quase todas as regiões da França produzem queijos com origem controlada, distinguidos pelo selo AOC, que é reconhecido por seu caráter singular e sua localização geográfica, sistema similar ao da classificação de vinhos. Além dos que possuem denominação AOC, muitos outros tipos são ofertados no mercado. Para distinguir o estilo de cada um foi criada a classificação “Les Huit Familles de Fromage”, que divide a produção em oito grandes famílias segundo suas características, como mostra a tabela abaixo.
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