Danuza Leão – que morreu na tarde de quarta-feira, 22 de junho, de insuficiência respiratória, aos 88 anos, no Rio de Janeiro – era o que antigamente se costumava chamar “femme du monde”. A mulher do mundo: sofisticada, cosmopolita, inteligente, independente, divertida, articulada, não exatamente bela, mas devastadoramente charmosa e, claro, polêmica.
Por isso é pouco dizer que Danuza foi modelo, socialite, jornalista trabalhou para o Jornal do Brasil, Folha de S.Paulo e O Globo – e escritora – deixa dez livros publicados e dois prêmios Jabuti.
Ela mesma, no prefácio de um de seus livros, esboçou um breve currículo: “…fui secretária, dona de butique, de restaurante, manequim, relações públicas da TAP, jurada de televisão e mais ou menos atriz (invenções do Glauber)”. O Glauber era o Rocha, cineasta de fama internacional que a colocou em um papel sem falas na sua obra prima, “Terra em Transe”. Ela listou também outras atividades profissionais, como diretora de nightclub – Régine’s e Hippopotamus, nos anos 1980 consultora e produtora para telenovelas da Rede Globo. Tudo, sempre, com muito sucesso.
Danuza Lofego Leão, nasceu em Itaguaçu, Espírito Santo, em 1933. A propósito, tinha horror a revelar a idade e chegou mesmo a limar alguns anos em seu passaporte. Era irmã mais velha da cantora Nara Leão, estrela da MPB, morta em 1989. Aliás, conta-se que foi no apartamento da família, em Copacabana, onde músicos se reuniam para tocar, cantar e jogar conversa fora, que a Bossa Nova nasceu, nos anos 1950.
Muito garota ainda, aceitou um convite do magnata das comunicações de então, Assis Chateaubriand, para participar como modelo de um baile de gala, do barão de Coberville, em Paris. Arrasou na festa, pediu emprego para o estilista Jacques Fath – que junto com Dior e Balenciaga formava
a santíssima trindade da haute couture na época – namorou um astro do cinema francês e arrasou mais um pouco nas passarelas.
De volta ao Rio, casou-se com o jornalista Samuel Wainer, dono do jornal Última Hora, e tiveram três filhos: a artista plástica Pinky Wainer, o jornalista Samuel Wainer Filho – morto em um acidente de automóvel, em 1984 – e o produtor de cinema Bruno Wainer. Separou-se de Wainer ao sucumbir a uma paixão pelo jornalista e compositor Antônio Maria e foi viver com ele. Mas, paixão acaba e ela voltou para o ex-marido. A família foi viver em Paris, no início do governo militar, quando Samuel foi exilado. Danuza se casou ainda mais uma vez, com outro jornalista, Renato Machado, nos anos 1970.
Como femme du monde que se preza, Danuza Leão viveu uma existência movimentada e cheia de episódios dignos de um livro, filme, série ou musical. Certa vez chegou atrasada para seu trabalho no júri do Programa Flávio Cavalcanti – apresentado ao vivo nas noites de domingo na década de 70 – e se desculpou informando que tinha vindo direto do réveillon em Paris, de uma festa onde também estavam Alain Delon e Cristina Onassis.
Em uma entrevista na TV, falou da visita que fez com Samuel Wainer à China de Mao Tsé-Tung e o quanto ficou entusiasmada com tudo que viu por lá. Porém, reviu seus conceitos no momento em que deparou com um frasco de condicionador de cabelo – no free shop do aeroporto de Hong-Kong – artigo de primeira necessidade inexistente no regime comunista.
Nos anos 1990, já consagrada como escritora, contou para a revista Interview que estava voltando de uma temporada de férias no Nordeste, mas não tinha gostado. Segundo ela, era todo dia a mesma coisa. Mar, Sol e céu azul. Disse que não aguentava mais aquilo e queria que acontecesse alguma coisa diferente, nem que fosse uma tempestade.
Para encerrar, só mesmo uma dica mais que preciosa de Danuza, a própria. Falando de viagens em seu “Na Sala Com Danuza” – manual de etiqueta absurdo e indispensável – ela cravou: “Pintou uma viagem. Você fica louca para ir, claro, mas imediatamente entram as dúvidas, as inseguranças, as culpas. TUDO BOBAGEM. Vá, vá e vá. Você vai voltar nova, revigorada, mais bonita, mais feliz, enriquecida, esqueça a obrigação de sofrer (que todos nós temos), não pense, vá. E depois me conte”.
Bon voyage, Danuza.
(Com Mario Mendes)
Donata Meirelles é consultora de estilo e atua há 30 anos no mundo da moda e do lifestyle.
Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião de Forbes Brasil e de seus editores.