Aluna do Liceu Pasteur, fluente em francês, arquiteta de formação, mãe de dois filhos já moços, envolvida em causas socioambientais e faixa azul em jiu-jitsu, a empreendedora Patricia Levi inaugurou neste ano O Riad, um espaço de eventos idílico, de estética marroquina, localizado em Porto Feliz, a uma hora e meia de carro de São Paulo.
Como transformar uma casa de veraneio familiar em um empreendimento que reúna os conceitos de luxo e sustentabilidade? Além de contratar uma consultoria, a empresária aproveitou o seu background em certificação ISO no universo da construção civil e, prestes a concluir o MBA em Gestão de Práticas Socioambientais pelo Instituto IPÊ, já implementa diversos processos por lá, como privilegiar os fornecedores locais e destinar parte do valor de cada evento a uma entidade do terceiro setor.
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Enquanto o lugar ganha visibilidade de forma orgânica – não é nada difícil se encantar pelo espaço –, Patricia foca em aspectos que não aparecem nas fotos, mas que prometem destacar o lugar de qualquer outro do gênero. O objetivo está bem traçado: ela está de olho na certificação do Sistema B, selo que atesta que uma empresa busca não apenas o êxito financeiro, mas também o bem-estar da sociedade e do planeta. Nada mais atual.
Seu segredo de sucesso? Ela tem mais de um: acordar bem cedo está entre eles, assim como manter o dia a dia bem organizado e estabelecer metas para o futuro. Entre uma coisa e outra, não deixa de aproveitar as lições do tatame – que vão muito além dos golpes do jiu-jitsu. Nesta conversa com a empresária, o assunto é empreendedorismo.
Pode contar um pouco de você e de como começou a empreender?
Tenho 53 anos, sou filha de mãe romena, nascida em Bucareste, e pai egípcio, nascido no Cairo. Deu uma mistura boa – brinco que sou 50% Cleópatra, 50% Drácula. Quando eu tinha 8 anos, meus pais se separaram. Eu e minhas duas irmãs – sou a do meio – ficamos com o meu pai, o que era muito incomum para a época. Comecei a trabalhar aos 16 e ele, que já era empreendedor, queria que a gente entendesse de tudo. Tivemos empresas pequenas e outras bem grandes; uma delas foi a Europa Filmes, distribuidora de grandes títulos internacionais por aqui.
Qual é a história d’O Riad?
Depois de uma viagem ao Marrocos e procurando por um lugar no campo, o ator Raul Cortez chegou a este terreno em Porto Feliz e aqui quis reproduzir o estilo dos riads, que são essas casas tipicamente marroquinas, com jardins centrais, por onde entram luz e ventilação. Ele usufruiu do espaço por dois anos antes de adoecer e falecer, e a propriedade foi colocada à venda. Meu pai a adquiriu e aproveitamos o local por 16 anos. A casa, a piscina e os jardins, estes assinados por Gilberto Elkis, são do projeto original do ator. Todos que vinham aos encontros familiares ficavam espantados, pois o lugar parece um oásis, e perguntavam se alugávamos a casa. Veio daí a ideia de transformá-la em um espaço para eventos, seguindo uma tendência pós-pandêmica de encontros ao ar livre. Contratamos uma consultoria e ampliamos o espaço.
O que faz dele um lugar diferente?
Só de gramado são 20 mil metros quadrados. Todo o espaço tem wi-fi. É possível fazer não só comemorações, mas eventos corporativos, como exposições de arte ao ar livre e até festa com balão cativo. Como tenho experiência com certificação ISO e estou terminando uma pós-graduação em gestão de negócio ambiental, me preocupei de antemão com essas questões, por isso os produtos de limpeza usados aqui são biodegradáveis, por exemplo. Cuidamos da reciclagem em parceria com uma cooperativa local e incentivamos os clientes a deixar a decoração com flores naturais, para que sejam compostadas. Todo evento gera uma obrigação nossa do repasse de 2% do valor do evento para uma ONG. Com esse tipo de ação, estamos trabalhando para conseguir a certificação do Sistema B em 2024.
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Como você começou a se interessar por sustentabilidade?
Sempre tive um profundo interesse no tema. Fundei uma construtora com o meu ex-marido. Foram 15 anos na construção civil. Nesse período, implementei um sistema de doação de móveis em bom estado, que eram deixados nos imóveis de alto padrão que a empresa reformava. Chamava-se Caçamba.org. Também lá, fui auditora ISO, e isso me deu experiência e tranquilidade para fazer O Riad nascer com processos mais estruturados, além do olhar para as certificações com selo verde, de maneira séria, sem greenwashing. Construímos um salão anexo com 100% da mão de obra local e 95% do material veio de uma empresa local também, cujo dono nasceu em Porto Feliz. Assumindo a liderança do projeto comigo está minha sobrinha, Camila Auvray, de 28 anos, representando a terceira geração da família, que compartilha a mesma paixão por práticas e responsabilidades socioambientais.
Essa diversidade de experiências também ajudou no processo de transformar uma propriedade particular em negócio?
Além dessas atividades, sempre fiz outras em paralelo, como gestão patrimonial – que ainda faço um pouco, no âmbito familiar. Para mim, toda essa experiência traz um olhar 360º para pessoas, clientes, vendas, marketing. Para mim, é muito fácil começar um negócio, o que pode ser difícil para outras pessoas. E também sei onde quero chegar: a meta é ser uma força inovadora e referência no mercado de eventos e, além disso, estamos traçando estratégias internacionais.
Que hábitos fazem diferença no dia a dia de uma empreendedora?
Penso que precisamos ser organizados. No caos, um empreendedor não consegue avançar. Em seguida, acho importante acordar cedo – começo às 5h. E treino jiu-jitsu desde os 46 anos. Acho que toda mulher deveria fazer jiu-jitsu. Descobri nesse esporte uma combinação de força com estratégia que me trouxe consciência corporal, postura, confiança e maior visão para fazer planejamentos. É preciso enxergar aonde se quer chegar.
Qual é o seu maior exemplo de mulher de sucesso?
Gosto sempre de valorizar o nosso Brasil, nossa cultura e nossa gente. Hoje, para mim, um exemplo de mulher de sucesso é a Cristina Junqueira [cofundadora do Nubank]. No mercado financeiro, historicamente liderado por homens, ela conseguiu não só criar uma empresa que revolucionou o setor como também a vida financeira de milhões de brasileiros. Gosto também de seu jeito simples de se colocar.
Qual é a sua ideia de felicidade no trabalho?
Minha filosofia de vida segue os princípios da antroposofia, uma filosofia criada por Rudolf Steiner, e esse ato de retribuição tem um significado profundo para mim. O Riad representa a realização desse ideal. Por meio dele, desejo retribuir à sociedade tudo o que recebi. Minha concepção de felicidade no ambiente de trabalho, atualmente, envolve a oportunidade de aplicar todo o conhecimento que acumulei desde os meus 16 anos, quando comecei a minha trajetória profissional. Estou plenamente consciente de que o impacto dessas ações se estende muito além das fronteiras da empresa, abrangendo não apenas seus stakeholders, mas também o ecossistema que a envolve.
Por fim, que lição leva como empreendedora?
A vida é uma gestão de problemas; se dá melhor quem gere melhor os problemas. Sabe, machuquei a lombar direita no jiu-jitsu e fiquei 3 meses usando muleta. Estou voltando a treinar, mesmo com dores. Você pode me perguntar: por que treinar sentindo dor? Me lembro do meu pai dizendo: “é isso, essa é a gestão da vida”. Se você abraçar, enfrentar o problema, em vez de jogá-lo para debaixo do tapete, uma hora ele se resolve. Carrego essa lição para mim.
Donata Meirelles é consultora de estilo e atua há 30 anos no mundo da moda e do lifestyle.
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