O calor, em sua essência física, simboliza a transferência de energia entre corpos, provocando transformações de estado e moldando a matéria. No universo da arte, essa noção se desdobra como um processo de metamorfose. No “38º Panorama da Arte Brasileira: Mil Graus“, essas ideias se entrelaçam em uma diversidade de obras, que conectam passado, presente e futuro da arte. O conceito de calor reflete a realidade contemporânea e suas constantes transições, servindo como um elo entre gerações de artistas que exploram temas históricos, sociopolíticos e tecnológicos.
Sob a curadoria de Germano Dushá, Thiago de Paula Souza e Ariana Nuala, o projeto estabelece um diálogo entre a arte clássica e contemporânea, reunindo artistas que equilibram tradições ancestrais com inovações digitais. Germano destaca que “desde o início, estávamos interessados em juntar gerações. Nos trabalhos de décadas passadas há muito do novo, assim como práticas emergentes.” Essa proposta permite que vozes como a de Maria Lira Marques, que aborda geologia e seres elementais, coexistam com a de Gabriel Massan, que investiga as texturas da cultura digital.
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A exposição, realizada no Museu de Arte Contemporânea da USP (MAC USP) como parte do projeto do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), reflete sobre o “quente absoluto”, propondo a transmutação como um destino inevitável. Desde sua primeira edição em 1969, o Panorama consolidou-se como um marco no diálogo intergeracional, ampliando seu horizonte ao incluir práticas que vão dos imaginários ancestrais ao impacto das novas tecnologias.
Dushá ressalta que o conceito de “Mil Graus” abrange não apenas transformações físicas, mas também questões sociais e espirituais: “a energia de alta intensidade, essa capacidade de abraçar a transmutação, é o que conecta essas gerações.” Ariana complementa, afirmando que o foco no calor na curadoria aborda um elemento anterior à humanidade. “Quando trazemos o calor para o centro, falamos de algo que precede os seres humanos”, explica. Obras que exploram questões ecológicas e históricas transformam o espaço expositivo em um campo de reflexão sobre a condição humana diante dos desafios contemporâneos, diluindo as barreiras do tempo.
Esse panorama da produção artística brasileira não só preserva tradições, mas também as reconfigura frente aos desafios atuais. Ao propor uma “temporalidade alargada”, onde o calor age como agente de transformação, o 38º Panorama se estabelece como um espaço onde o novo e o antigo coexistem, revelando a arte como um campo de contínua evolução.
A exposição “Mil Graus” provoca uma reflexão sobre a intersecção entre passado e presente na arte brasileira, destacando a relação entre diferentes gerações de artistas. Germano sublinha a ambição desta edição em traçar um cenário da arte contemporânea no Brasil. “Desde o princípio, queríamos unir gerações. O passado e o presente se cruzam”, afirma. Ao integrar artistas de distintas épocas, a curadoria busca criar um espaço onde influências históricas dialoguem com inovações contemporâneas, refletidas na presença de artistas nascidos entre as décadas de 1940 e 2000.
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Ruy Teixeira Vista da exposição 38º Panorama da Arte Brasileira: Mil graus, do Museu de Arte Moderna de São Paulo
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Estúdio em Obra Melissa de Oliveira, Sucessagem, 2024 e Aquecimento, 2024
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Estúdio em Obra Obras de Labō & Rafaela Kennedy
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Estúdio em Obra Ana Clara Tito, sem título, 2023
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Estúdio em Obra Vista do 38º Panorama da Arte Brasileira: Mil graus
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Ruy Teixeira Vista da exposição 38º Panorama da Arte Brasileira: Mil graus, do Museu de Arte Moderna de São Paulo
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Ruy Teixeira Vista da exposição 38º Panorama da Arte Brasileira: Mil graus, do Museu de Arte Moderna de São Paulo
Vista da exposição 38º Panorama da Arte Brasileira: Mil graus, do Museu de Arte Moderna de São Paulo
As obras de Maria Lira Marques e José Mamami ressaltam a importância das raízes culturais. Enquanto Maria explora “seres elementais da terra”, José investiga a “tradição ancestral da cosmologia Yanomami”. Essa diversidade de vozes demonstra como a arte pode resgatar e celebrar a história, ao mesmo tempo em que novas perspectivas, como a de Gabriel Massan, analisam a cultura digital e suas implicações.
A conexão entre passado e presente desafia conceitos tradicionais de tecnologia na arte. Germano menciona a presença de Dona Romana, cuja prática escultórica incorpora “equipamentos que captam energias não necessariamente terrenas.” Ariana reflete sobre isso, afirmando que “flexibilizar o conceito de tecnologia é fundamental para entender essa relação.” A exposição convida o público a repensar o que significa ser contemporâneo, ampliando a definição de tecnologia para incluir práticas ancestrais.
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Os desafios de conectar tradições artísticas e inovações contemporâneas são significativos. Nuala observa que a história da arte, enraizada em uma filosofia moderna, tende a criar categorizações. “Estamos lidando com distinções dentro da própria história da arte, como arte contemporânea e arte popular. A ideia é não reforçar essas categorias, mas sim entender como as coisas existem em um mundo caótico, onde podem coexistir em diferentes intensidades”.
Ariana acrescenta que essa proposta curatorial não busca reforçar distinções, mas explorar as pluralidades que emergem ao reunir gerações. “As gerações desses artistas e esses diálogos são feitos, de certa forma, também pelas próprias matérias que eles conduzem nas obras”, finaliza.