A pouco mais de 20 metros, a mamãe alce e seu filhote, ambos com as patas enterradas na neve até o pescoço, confortavelmente instalados, brincam à vontade entrelaçando as cabeças; mas também curtem as pausas, sabem ficar como estátuas, sentindo uma brisa muito leve e agradável, em uma manhã de cinco graus negativos, com sol e céu azul improváveis. Em certo momento, dá para reparar na mãe cerrando os olhos, como se entrasse em transe, ornando a paisagem de forma quase surreal com o paredão de montanhas jovens, agudas e nevadas do Parque Nacional Grand Teton ao fundo. É uma cena selvagem, silenciosa, lenta, quase parando.
O alce adulto pesa quase meia tonelada e tem dotes ecléticos: pode correr a 56 km/h e mergulhar a seis metros de profundidade. Os machos exibem chifres que crescem na primavera, podem pesar até 35 quilos e caem no inverno. Quando esses bichos disputam uma fêmea, é no chifre que eles resolvem suas diferenças. Agora, mãe e filho desfrutam de um certo ócio, em um fim de março com temperaturas para lá de amenas, à beira de uma estrada asfaltada e bem sinalizada, onde esparsos carros passam sem os animais darem a menor bola. Algumas centenas de metros atrás da família de alces, quatro bisões imponentes preenchem o quadro desenhado pelo binóculo de forma impactante.
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Caminham à toa, ruminando sem pressa o café da manhã. Desfilam a elegância do maior mamífero terrestre da América do Norte, um animal que pode pesar uma tonelada, mas com a habilidade de saltos verticais de quase dois metros. Por aqui, uma rotina ininterrupta desde os tempos pré-históricos. É o bisão que está no centro da bandeira azul de Wyoming; e é ele também que, em uma canetada de Barack Obama, em 2016, virou o mamífero nacional dos EUA. Se, nos idos de 1890, a espécie estava quase sumindo do mapa (Nicolas Cage, em Butcher’s Crossing, mostra bem essa matança), com meras mil cabeças remanescentes, hoje eles respiram aliviados: são mais de 500 mil animais.
Estamos no oeste de Wyoming (o mais vazio estado dos EUA, com 578 mil de habitantes), próximos ao vilarejo mais desejado (e seleto) das Montanhas Rochosas: Jackson, 10 mil habitantes, lugarzinho para lá de simpático, com arcos decorativos – feitos de chifres de alce – nas esquinas da praça central; comércio e entretenimento sintonizados na cultura cowboy; cercado por pistas de esqui da melhor qualidade e uma vida animal que remete à paisagem do oeste norte-americano de 200 anos atrás. Ao lado de Teton Village, Kelly, Moose, Wilson e Moran Junction, Jackson compõe uma área conhecida como Jackson Hole.
A rica fauna preservada está ligada à criação dos parques nacionais que protegem uma extensa área no coração das Rochosas: Grand Teton e Yellowstone – o mais antigo do mundo (criado em 1º de março de 1872), que, com 8.980 quilômetros quadrados, esparrama-se por Wyoming, Idaho e Montana, lar de mais de 60 espécies de mamíferos e 100 pássaros. Yellowstone é o endereço de cartões-postais de natureza dos mais emblemáticos dos Estados Unidos, como o enorme círculo ultracolorido de Grand Prismatic Spring.
Trata-se de uma esquina do país bastante especial, com atrações a rodo em qualquer época do ano – do excelente esqui (tanto para quem é expert como para quem precisa de aula particular, como eu) nos meses de inverno a maravilhosas trilhas de trekking, mountain bike e descidas de rafting no verão. A última temporada de esqui foi histórica: com picos de mais de 3 mil metros de altura, as 116 pistas vibraram com 143 dias de neve, a mais longa temporada nos 58 anos de atividade da estação.
E atenção, que a expectativa para a temporada 24/25, que começa no dia 29 de novembro e vai até 13 de abril de 2025, é muito boa – melhor reservar o quanto antes. A maior das novidades é o novo teleférico de alta velocidade Sublette, que agora sobe milhares que metros até o topo em apenas 4 minutos.
FOUR SEASONS JACKSON HOLE
E agora você deve estar se perguntando: “Tudo bem, que baita lugar, mas onde devo me hospedar?”. Olha, meu amigo, não precisa pensar duas vezes: Four Seasons Resort and Residences Jackson Hole, o único ski in/ski out na base de Jackson Hole Moutain Resort; o mais exclusivo da região e a melhor base para desfrutar dos parques de Grand Teton e Yellowstone.
Não é para menos que, este ano, a propriedade foi anunciada na lista Forbes Five-Star Rating. É a 17ª vez consecutiva que o Four Seasons Jackson Hole salta aos olhos dos especialistas – sempre anônimos – da Forbes Travel Guide. “Alcançar – e manter – esse prestigioso prêmio exige dedicação contínua e um compromisso de nossos funcionários com a excelência”, declarou Ryan Grande, gerente geral. Inaugurado em dezembro de 2003, o hotel tem 155 habitações (31 delas Resort Residences, que podem ter de dois a cinco quartos).
Após a renovação de diversas suítes e espaços comuns nas primaveras de 2022 e 2023, a mais recente reforma foi a Granite Residence, a maior da categoria, no nono (e último) andar, com cinco quartos (todos com varanda privativa), cozinha gourmet, mesa de jantar para 10 pessoas e visuais panorâmicos arrebatadores dos picos agudos de Teton.
Não pense, porém, que é fácil chegar à sua suíte – muito menos sair dela. A primeira “dificuldade” é passar incólume pelas obras de arte expostas nos corredores e acessos aos elevadores. É comum se deparar com hóspedes parados admirando quadros como se estivessem no MoMa. Então, você precisa estar preparado para “se enroscar” na sucessão de peças de arte que convidam à contemplação mais detalhada – a cuidadosa iluminação sobre as obras contribui para o desfrute da observação.
Uma vez dentro da suíte, o alto nível da curadoria dos quadros compete com visuais estupendos, enquadrados pelo amplo acesso à varanda e pela janela. Se você é desses (como eu) que sempre prefere o “lado montanha” de um hotel, atenção para o “lado interno” do Four Seasons Jackson Hole: uma ampla vista de montanhas no horizonte, com raras filas de casinhas enfileiradas no descampado forrado de neve fresca. Uma paz danada – um panorama tão bonito que poderia ser outra obra de arte exposta pelos quatro cantos do FS; já o visual do “lado montanha” – também bonito, claro – traz o frenesi das pistas durante o dia e a estrutura usada pelas gôndolas.
PARCERIA COM GALERIA DE ARTE
Desde o verão passado, parte das obras expostas no hotel compõe a seleção Wild by Four Season: mais de 50 peças de temática contemporânea western (todas disponíveis para compra) da Wild, galeria local. Em fevereiro, houve uma recepção e um jantar com a presença da pintora e fotógrafa Patricia Griffin, que se inspira na natureza selvagem dos arredores de Yellowstone. Outros nomes de destaque encontrados nos corredores são Nealy Riley, de Salt Lake City, que costuma usar petróleo, ouro e folhas de metal como matéria-prima; e Josh Tobey, da Astoria Fine Art Gallery, que assina as estátuas de lobos do Ascent Lounge, “o” lugar para tomar um drinque, como o Suntory Sour, feito com uísque Suntory, limão, gengibre e aquafaba, que cai muito bem com o Hamachi Sashimi.
Se o assunto é gastronomia, permita-me apontar meu restaurante favorito para o jantar: Westbank Grill, de atmosfera vibrante e luz baixa. Antes de entrar no cardápio em si, importante sublinhar o atendimento impecável, de garçons como Keven Pare, de 32 anos, fotógrafo nas horas vagas, há quatro anos e meio no FS Jackson Hole, mas há nove no grupo (temporadas em Miami, Denver e Havaí). Mais do que indicações certeiras no menu (tudo o que ele sugeriu eu comi de joelhos), Keven fala sobre a região, dá dicas de passeio e orienta com orgulho sobre o leque de atividades exclusivas e de altíssimo padrão oferecido pelo Four Seasons.
LOBOS, ALTA GASTRONOMIA E ESQUI
A vedete do momento é: A Day with the Wolves Experience. Um dia que começa com um voo particular em um jato Pilatus para oito hóspedes, cruzando as Rochosas, até Livingston, em Montana. De lá, os afortunados avançam por plagas selvagens no extremo norte do ecossistema de Yellowstone.
Liderados por guias naturalistas especializados, seguem rastros de animais, com grandes chances de ver lobos-cinzentos, além de ursos, bisões, cervos e alces. O safári acontece em carro 4×4, preparado para enfrentar neve com conforto – ou a pé em alguns trechos. O almoço é sempre servido em um lugar de rara beleza cênica.
Passeios de carro de meio dia a partir do hotel, no entanto, também rendem excelentes encontros com a fauna local – como o descrito na abertura desta reportagem. Não perca ainda caminhar de snowshoes (apetrecho colocado na bota de trekking para terrenos cobertos por muita neve) próximo às margens dos lagos Jackson, Leigh e Jenny vendo os picos de Grand Teton refletidos na superfície plácida.
Mas, voltando ao jantar e às dicas infalíveis de Keven, listo aqui uma entrada e dois pratos principais que dificilmente esquecerei na vida (e olha que minha memória não está lá essas coisas): Wagyu Beef Tartare, Dry Aged Bone-in Bison NY e o carro-chefe do cardápio, o Wagyu Trio Experience (85 gramas de carne japonesa, 141 de norte-americana e 85 de australiana) – amei perdidamente todas, mas, se tiver que apontar uma predileta, fico com a japonesa.
Pela manhã, no café, o Westbank Grill se transforma em um lugar banhado por luz natural e vira um ponto de vista privilegiado da montanha Rendezvous, com seus 3.185 metros (a base está a 1.924 metros), no Jackson Hole Mountain Resort. Hora de encarar a prática do esporte mais procurado da região: o esqui – mesmo que eu não o pratique há mais de 15 anos.
Aí, de novo, antes de falar da qualidade da pista para iniciantes (as pistas pretas, para experts, têm fama internacional), é preciso aplaudir a qualidade do professor particular que me acompanhou de manhã e à tarde: Jason Gregory, norte-americano de Denver, de 40 anos de vida e seis de experiência como instrutor. De tão sereno e atencioso, acredito que Jason tenha sido um monge em vidas passadas. Além de passar muita tranquilidade, ele deu dicas preciosas para, por exemplo, melhorar o traçado das curvas – falou para corrigir a posição do dedão do pé!, e impressionante como deu resultado. O prazer dessa prática esportiva em Jackson Hole, logo atrás do Four Seasons, é potencializado pela beleza do visual – chega a ser difícil lembrar do dedão com uma paisagem tão linda ao redor.
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A pausa para o almoço acontece no Handle Bar, onde fritas e cervejas locais fazem o trio perfeito com o Double Down Smash Burger – queijo americano, picles caseiros e molho secreto (tentei experimentar outra coisa na segunda vez que fui lá, mas não resisti ao repeteco do Smash Burger). Combinação não menos perfeita é aproveitar a piscina outdoor aquecida após divertidas descidas na montanha, bem como se entregar aos tratamentos oferecidos nas 16 salas do spa – também reconhecido pelo Forbes Travel Guide como o melhor de Wyoming.
Os quatro dias em Jackson Hole passam em uma toada quase mágica – seja pela vida selvagem com os picos nevados de Teton, seja pelo conforto extremo da suíte do Four Seasons decorada com belíssimos quadros. Sob uma neve em câmera lenta, a caminho do aeroporto, cruzo com a estátua de David Edward Jackson (1788-1837), ou Davey Jackson, o comerciante de peles pioneiro nessa região nos idos de 1820, domando um cavalo furioso, com o corpo todo esticado, sem largar o chapéu. Parece que ele acena, agradece a visita e convida para uma próxima vez – e não tenha dúvidas de que quero voltar, Jackson. Mal saí e já tenho saudades. Espero revê-lo em breve.
Reportagem publicada na edição 118 da revista, disponível nos aplicativos na App Store e na Play Store e também no site da Forbes.