Resumo:
- O aplicativo de aprendizado de idiomas, criado pelo “gênio” da informática, Luis von Ahn, conectou os milhões de usuários, de Bill Gates a Khloe Kardashian e Jack Dorsey, e até refugiados sírios na Turquia;
- O Duolingo já oferece um total de 36 idiomas e, por conta da versão básica (gratuita e com anúncios) tem quase 30 milhões de usuários mensais ativos;
- Segundo Von Ahn, a receita do aplicativo vai subir para US$ 86 milhões em 2019 e US$ 160 milhões em 2020, à medida que mais usuários assinam e pagam pelo aplicativo premium, com mais recursos.
“Implore por sua vida em espanhol”, exige Duo, uma coruja verde. O meme que circula no Twitter estrela o mascote do Duolingo, o popular aplicativo de aprendizado de idiomas, baixado por mais de 300 milhões de pessoas em todo o mundo. Embora o meme seja uma piada, o aplicativo real é bastante insistente.
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Negligencie sua aula de espanhol diária e um alerta de celular será gerado automaticamente no mesmo horário em que você usou o aplicativo no dia anterior. Duo aparece em sua tela como um emoji, incomodando você para acompanhar seus exercícios.
Milhões de usuários obedecem aos comandos do Duo. Criado há sete anos pelo “gênio” da informática da MacArthur Foundation, Luis von Ahn, de 40 anos, o Duolingo conectou todos, de Bill Gates a Khloe Kardashian e Jack Dorsey, e até refugiados sírios na Turquia.
“O momento em que me senti mais orgulhoso foi quando percebi: ‘Uau, o homem mais rico do mundo está usando o mesmo sistema que as pessoas nas posições mais baixas da escala econômica”, diz Von Ahn. “Isso é para mim realmente especial e muito grande.”
Duolingo ainda tem muito espaço para continuar a crescer. Mais de dois bilhões de pessoas em todo o mundo estão estudando uma língua estrangeira e, cada vez mais, estão fazendo isso on-line. O mercado digital de aprendizado de idiomas gera US$ 6 bilhões em receita, e esse número deve subir para US$ 8,7 bilhões até 2025. No entanto, é um segmento altamente fragmentado, com dezenas de players espalhados pelo mundo, que está implorando por um líder.
Von Ahn certamente sabe como atuar em grande escala. Quando era um estudante de 21 anos, ele deu ao mundo o CAPTCHA, mais conhecido por bilhões de usuários da internet como aquelas letras chatas que você tem que transcrever para provar que não é um robô. Mais tarde, ele vendeu duas invenções para o Google, ganhando mais de US$ 20 milhões.
Ele ostenta uma Lamborghini e um Tesla Model S, mas, fora isso, leva uma vida modesta, permanecendo na casa de seis quartos que comprou com sua ex-mulher no bairro Point Breeze, em Pittsburgh (Pensilvânia), perto dos escritórios da Duolingo. “Eu poderia ter ido para a Guatemala para morar em uma vila, mas não queria”, diz ele. Em vez disso, ele se envolveu na criação do aplicativo de ensino mais baixado do mundo.
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O Duolingo já oferece mais idiomas do que seus concorrentes, com um total de 36, de acordo com a última contagem. Estão inclusas línguas pouco faladas como havaiano, navajo e gaélico, além da língua fictícia High Valyrian do blockbuster da HBO, “Game of Thrones” (há 1,2 milhão de usuários estudando este idioma). No mesmo estilo da Wikipédia, a Duolingo recruta voluntários para ajudar a criar seus cursos mais complexos.
Sete anos após o seu lançamento, o aplicativo tem quase 30 milhões de usuários mensais ativos, de acordo com seus próprios números. Capitalistas de risco investiram US$ 108 milhões, ampliando a valoração do Duolingo para US$ 700 milhões em 2017, US$ 150 milhões a mais do que a capitalização de mercado do Rosetta Stone, seu programa rival, com 27 anos de capital aberto.
Além de ensinar mais idiomas (o Rosetta Stone oferece 25), o Duolingo atrai usuários porque sua versão básica sustentada por anúncios é gratuita, em comparação com os US$ 120 anuais que o Rosetta Stone cobra de seus 500.000 assinantes. Outro concorrente, o Babbel, com sede em Berlim, diz que sua receita de US$ 115 milhões vêm da taxa de assinatura de US$ 85 por ano que cobra de mais de um milhão de assinantes.
Apenas 1,75% dos usuários do Duolingo pagam por sua versão livre de anúncios (US$ 84 por ano), mas como a base é grande, a receita atingiu US$ 36
milhões no ano passado. Von Ahn diz que esse número vai subir para US$ 86 milhões em 2019 e US$ 160 milhões em 2020, à medida que mais usuários assinam e pagam pelo aplicativo premium, que terá novos recursos. A contagem de funcionários aumentará de 170 para 200 até o final do ano.
A sede do Duolingo, que fica em uma loja de móveis reformada em East Liberty, um bairro elegante não muito longe do escritório da Google em Pittsburgh, deve se expandir para o segundo andar. A empresa ainda não dá lucros, mas Von Ahn diz que alcançará o fluxo de caixa positivo neste ano e está planejando um IPO até 2021.
Ele gosta de dizer que o dinheiro que perde mantendo o aplicativo gratuito é equivalente ao custo dos orçamentos de marketing inchados de seus rivais. Von Ahn também se vangloria de que os usuários são menos propensos a sair do Duolingo do que dos concorrentes. “Nossa retenção é comparável aos jogos”, diz ele.
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A comparação é apropriada uma vez que o Duolingo fideliza os usuários com truques de gamificação, como pontos, baús de tesouro e “streaks” (uma espécie de recompensa oferecida por completar uma série de tarefas) para incentivar o uso contínuo. As lições de três minutos do aplicativo são projetadas com uma interface simples, por exemplo, em um exercício típico, a frase “Eu como pão” aparece acima de sete palavras que surgem rapidamente. Arraste as palavras para uma linha, clique em “verificar”, e “Você está correto” aparece na parte inferior da tela com um sinal sonoro satisfatório. Os fãs costumam tuitar sobre frases engraçadas geradas pelo software, como “estou vendendo minha sogra por um euro”.
O Duolingo recebeu críticas negativas de escritores que experimentam o aplicativo e não aprendem muito. Mas Von Ahn promete apenas levar os usuários a um nível entre iniciante avançado e intermediário inicial. “Uma parte significativa de nossos usuários o utiliza porque é divertido e não é uma perda total de tempo”, diz o criador do app.
Ele está estudando de 15 a 20 minutos de francês todos os dias desde novembro, e quando lhe pedem para descrever o que fez no fim de semana anterior, ele diz: “Je fais du sport. Je suis mange avec mes amis. Je suis boire du bière en un bar”, desconcertando os tempos verbais. (Tradução a grosso modo: Eu pratico esportes, eu estou como com meus amigos. Eu estou bebo cerveja em um bar.)
Bob Meese, o diretor de receita do Duolingo, de 42 anos, estuda o Duolingo Spanish há mais de seis meses. Em resposta à pergunta “Hablas español?” Ele congela e diz: “Você poderia repetir isso?”
História de vida
Von Ahn aprendeu inglês à moda antiga na American School, na Cidade da Guatemala. Sua mãe, uma médica que o teve aos 42 e era solteira, criou-o por conta própria (seu sobrenome vem da família alemã de seu pai). Ele se destacou em matemática e, aos 12 anos, queria ser professor.
Mais tarde, foi aos Estados Unidos para fazer faculdade e pós-graduação, ganhou um diploma de bacharelado em matemática na Duke e um de PhD em ciência da computação na Carnegie Mellon (CMU), onde estudou com Manuel Blum, vencedor do Turing Award em 1995, conhecido como Prêmio Nobel da computação.
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Juntos, eles criaram o CAPTCHA, um projeto acadêmico que foi entregue de graça. Enquanto ainda era estudante de pós-graduação, Von Ahn criou uma ferramenta que usava crowdsourcing para identificar arquivos de imagem e foi vendida para a Google em 2004 por uma quantia não revelada. “Eu realmente não precisava me preocupar com dinheiro depois disso”, diz ele.
Pouco depois ter seu PhD em 2005, recebeu uma ligação inesperada. Bill Gates queria que ele liderasse uma equipe no laboratório de pesquisa da Microsoft e, para isso, o manteve ao telefone durante uma hora e meia. Mas Von Ahn recusou.
Em vez disso, ele conseguiu um emprego como professor de ciência da computação na CMU. Três semanas depois, a MacArthur Foundation lhe pagou uma quantia de “gênio” de US$ 500 mil por seu trabalho pioneiro em segurança de computadores e crowdsourcing.
Ele usou os fundos para criar uma segunda versão do CAPTCHA chamada reCAPTCHA. As palavras rabiscadas exibidas eram tiradas de livros e jornais antigos que os scanners não conseguiam ler e para digitalizar grandes quantidades de texto, bilhões de pessoas se voluntariaram. Em 2009, a Google comprou a reCAPTCHA por mais de US$ 25 milhões (Von Ahn deteve mais de 50%), e ele passou os dois anos seguintes como funcionário da multinacional, em licença da CMU.
Quando retornou à CMU em 2011, juntou-se ao estudante suíço Severin Hacker (sim, é isso mesmo) para se concentrarem em uma ideia que os dois ponderavam enquanto Von Ahn estava na Google, uma ferramenta gratuita de aprendizado digital de idiomas. Von Ahn e Hacker nomearam seu empreendimento Duolingo porque queriam que ele servisse duas funções. O aplicativo ensinaria idiomas para usuários gratuitamente e também dependeria deles para fazer traduções.
Primeiro, o Duolingo encontraria clientes que precisassem de textos traduzidos. Depois, a multidão de usuários que estudavam inglês no Duolingo iria traduzir as passagens em inglês para a sua língua nativa e se uma quantidade suficiente deles trabalhassem nas mesmas passagens, as traduções apresentariam um bom resultado.
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Arrecadar dinheiro foi fácil. “Ficamos muito impressionados com o que ele havia feito no passado e com ele pessoalmente”, diz Brad Burnham, membro do conselho da Duolingo e sócio da Union Square Ventures, o primeiro investidor da empresa. “Nós realmente não tentamos modelar o negócio.”
Para criar os cursos iniciais, Hacker e Von Ahn leram uma pilha de livros sobre ensino de idiomas, incluindo espanhol para leigos, e construíram cursos básicos para falantes de inglês aprenderem espanhol e alemão. Eles pesquisaram as 3.000 palavras mais usadas em cada idioma, traduziram-nas para o inglês e utilizaram-nas para compor sentenças simples. Desse modo, escreveram um algoritmo que apresentava lições que incluíam prompts para tradução de sentenças e que estimulavam o treino da escuta, escrita e conversação.
“Não queríamos que as lições fossem feitas à mão”, diz Von Ahn. O software poderia ser programado para responder aos usuários, direcionando-os de volta para lições mais fáceis se cometessem erros. Logo no início, eles adicionaram elementos divertidos como a pontuação e a coruja Duo.
O Duolingo foi lançado em 2012 e, a partir de então, o aplicativo começou a pegar. Mas apenas dois clientes, CNN e Buzzfeed, assinaram contrato para serviços de tradução. “Era como uma máquina de Rube Goldberg [que executa uma tarefa muito simples de modo bem complicado]”, diz Von Ahn, porque as traduções exigiam muitos passos para chegar ao produto final.
Em 2014, ele abandonou o negócio de tradução e, nos três anos seguintes, a empresa não teve receita. Mas depois de arrecadar US$ 38 milhões em dinheiro de capital de risco, Von Ahn tinha mais do que suficiente para continuar trabalhando. Assim, contratou linguistas e pesquisadores de aquisição de segunda língua que adicionaram instruções extras, como dicas de gramática e tabelas de conjugação.
Von Ahn diz que afastou os investidores quando se lançou àqueles que achava que seriam os melhores parceiros. Ashton Kutcher, Tim Ferriss e os poderosos da Kleiner Perkins e da CapitalG (antiga Google Capital) são todos apoiadores do Duolingo. Em 2017, ele introduziu anúncios da Google e do Facebook, seguidos por assinaturas sem anúncios. Desse modo, a Duolingo terminou o ano com receita de US$ 13 milhões.
Enquanto isso, a popularidade do Duolingo crescia, e novos idiomas estavam sendo adicionados rapidamente. Com base em seu histórico de crowdsourcing, Von Ahn desenvolveu um sistema para avaliar falantes nativos voluntários que contribuem com palavras e frases do vocabulário a fim de construir novos cursos.
Em 2016, a Duolingo começou a trabalhar em outro potencial gerador de receita, o Teste de Inglês Duolingo (DET), para competir com o TOEFL (teste de inglês como língua estrangeira), o exame de proficiência dominante em inglês para estudantes estrangeiros que desejam se matricular em universidades americanas. Pertencente à organização sem fins lucrativos Educational Testing Service, o TOEFL custa US$ 215 e exige que os alunos passem três horas em um local de testes supervisionado.
Von Ahn teve sua própria experiência angustiante no TOEFL em 1995. Todos os assentos na Cidade da Guatemala estavam lotados, então, ele teve que viajar para San Salvador. “El Salvador era uma zona de guerra”, diz ele. “Eu gastei $ 1.200 para fazer o teste. Foi louco.”
O Teste de Inglês do Duolingo (DET) custa US$ 49, dura 45 minutos ou menos e pode ser acessado remotamente, desde que o computador do aluno tenha um microfone e uma câmera em funcionamento para evitar fraudes. Mais de 180 escolas, incluindo Yale, Columbia e Duke, já o aceitam como substituto do TOEFL.
Todavia, o DET pode estar fazendo um grave desserviço aos estudantes estrangeiros, diz Elvis Wagner, professor da Temple University, cuja área de especialização é a avaliação em segunda língua. Em 2015, ele foi co-autor de um artigo na “Language Assessment Quarterly” que diz: “O DET parece totalmente inadequado como medida de proficiência acadêmica em inglês de um candidato ou para fins de admissão de alto risco em universidades”. Ele diz que lamentava chegar a essa conclusão, porque o teste aumenta a acessibilidade aos alunos. “Mas não há praticamente nenhuma compreensão envolvida e nenhuma produção de linguagem”, diz ele.
O teste melhorou desde então, diz Von Ahn. Agora inclui perguntas abertas que os alunos devem responder por escrito e um novo prompt de fala que requer compreensão. Mas uma seção parece ter sido inspirada pelos quebra-cabeças que os competidores do programa de TV “Wheel of Fortune” (Roda da Fortuna) resolvem ao preencher as letras que faltam em uma passagem escrita. Em outra seção, os alunos devem distinguir palavras inglesas falsas como “groose” de palavras reais como “skate”. Nenhum dos exercícios parece exigir proficiência em inglês em nível universitário.
Os contadores de Von Ahn que pontuam no DET são “altamente correlacionados” com as pontuações do TOEFL, e “isso é tudo o que importa”. Sua equipe comparou resultados de 2.300 alunos que fizeram os dois testes e descobriram que aqueles que se saíram bem no DET estavam propensos a adquirir pontuações altas no TOEFL. Mas o diretor executivo do TOEFL, Srikant Gopal, diz que a correlação não faz sentido porque o DET tem apenas “exercícios rudimentares que têm pouca semelhança com o modo como o inglês é realmente usado em ambientes acadêmicos”. No entanto, Von Ahn espera que o teste responda por 20% da receita até 2021.
Para além do teste, Von Ahn diz que está apenas começando na empreitada de realizar a promessa do Duolingo. O próximo passo: adicionar mais lições desafiadoras aos cursos. “Nós queremos levar as pessoas a um nível em que possam conseguir um emprego, até um que pague bem, por causa de um idioma que aprenderam no Duolingo”, ele diz.
Contudo, Diane Larsen-Freeman, linguista da Universidade de Michigan, considerada uma das maiores especialistas em aquisição de segunda língua do país, diz que a maioria dos alunos não consegue ir muito longe sem conversar com outros seres humanos. “A conexão interpessoal é realmente fundamental para qualquer tipo de aprendizado de idiomas”, diz ela.
Von Ahn não discute. Há dois anos, a Duolingo criou um site onde os usuários podem organizar eventos em cafés e restaurantes, para que os alunos possam praticar com outras pessoas. Mas, com 28 milhões de usuários espalhados por 180 países, a lista atual de 2.000 eventos por mês, com uma média de dez participantes, atinge uma fração minúscula de alunos.
O especialista em informática não se perturba, apontando para o efeito de bola de neve da popularidade do aplicativo até hoje: “Continuaremos com os idiomas até que a maioria das pessoas no mundo que está tentando aprender uma língua esteja usando um de nossos produtos”.
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