Eles sempre foram associados a rapazes e moças de pouca idade; no entanto, daqui para a frente as empresas que os fabricam irão atrás de consumidores de outras faixas etárias. Remetem à ideia de baladas e festas, mas, de agora em diante, a ordem para muitos é ligá-los a esportes e às exigências de ânimo e vigor para o trabalho. Algumas coisas, é verdade, não vão mudar no mercado brasileiro de energéticos: em torno dessas bebidas, gravitam investimentos maciços, vendas formidáveis e patrocínios a artistas e esportistas. Tudo isso permanece. O restante, não. Sem abandonar os consumidores antigos, as empresas estão atrás de novos clientes.
FORBES Brasil teve acesso a um relatório inédito sobre o setor de bebidas energéticas no país feito pela agência de pesquisas de mercado Mintel. A autora do estudo, Naira Sato, é analista sênior das categorias de alimentação e bebida da companhia. E a partir dos dados por ela compilados e das tendências detectadas, percebe-se que esta indústria está alerta e preocupada em reinventar-se.
Em se tratando de valores, o mercado de bebidas energéticas no Brasil há muito deixou a adolescência; ele é, hoje, assunto de gente grande. Jovens que saem à noite para se divertir podem ser (ainda) seu grande público consumidor, mas isso está mudando, sob o impulso de políticas das próprias empresas.
A Red Bull é o primeiro nome que vem à mente quando se fala do produto. A companhia (criada em 1987 pelo austríaco Dietrich Mateschitz, inspirado em uma bebida tradicional tailandesa chamada Krating Daeng) há anos afirma querer erguer sua primeira planta industrial no Brasil. Em 2013, a empresa liderou no país o mercado de bebidas energéticas. A Red Bull opera em solo brasileiro desde 1999, e se destaca por seus patrocínios: ela apoia mais de 25 atletas em diferentes modalidades, com destaque para o surf e o skate.
Mateschitz é um homem excêntrico; da sede da companhia em Salzburgo, na Áustria, ele a controla com rigor em todo o planeta e não permite que ninguém que não ele próprio fale em nome da empresa. No Brasil, ela apoia também um clube de futebol que leva seu nome – o Red Bull Futebol e Entretenimento Ltda., também conhecido como Red Bull Brasil. A equipe de Campinas (SP) atualmente disputa a Série A2 do campeonato paulista. Em 2015, ela jogará na Série A do torneio.
Esse é um mercado, no Brasil, relativamente pulverizado. Há muitos energéticos que são produzidos e vendidos em pequena escala, ou só em alguns estados do país. Mas há nele, também, players de porte mundial lutando por consumidores. A Coca-Cola, por exemplo, vende por aqui o Burn, energético da empresa presente em boa parte do mundo. “Somos a segunda maior marca desse mercado no Brasil”, conta Renato Fukuhara, diretor de marketing para energy drink da companhia. “Vemos o campo dos energéticos no país se expandindo. Até 2010 ele alcançava 19% da população; em 2013, chegou a 32%. O consumo de energéticos per capita no Brasil já atinge hoje pouco mais de meio litro da bebida por habitante ao ano.” Recentemente, a empresa reposicionou o Burn no mercado nacional e modificou sua fórmula, para agradar mais ao paladar local. Tendo aportado no Brasil em 2001, o Burn foi lançado mundialmente apenas um ano antes, na Olimpíada de 2000, em Sydney, na Austrália.
Como se trata de um produto tradicionalmente associado à juventude, não surpreende que alguns dos líderes desse setor tenham nascido como microempresas nas mãos de pequenos empreendedores e só depois chamado a atenção de alguma grande companhia. Foi o caso do Ecco!, marca da Brasil Kirin. “A marca Ecco! surgiu em 2007, em Florianópolis, como o energético de algumas das casas noturnas mais badaladas da cidade”, conta Silvia Almeida de Andrade, diretora de produtos não alcoólicos da empresa. “Em 2013, a Brasil Kirin firmou contrato de parceria com os donos da marca para produção e comercialização exclusiva do energético. A categoria é uma das que mais crescem no Brasil, mas ainda estamos muito distantes do padrão de compra dos países mais desenvolvidos, tanto em volume médio quanto nas ocasiões nas quais a bebida é ingerida”, observa ela.
É verdade; mas, justamente, esta é uma das grandes novidades apontadas pelo estudo da Mintel: as empresas do setor parecem ter descoberto que precisam expandir os horizontes de consumo do energético brasileiro. Não deixarão de lado seus consumidores tradicionais, claro, mas agora querem também ver as bebidas nas mãos de esportistas e executivos em busca de ânimo e durante o dia.
É o caso, por exemplo, daquela que pode ser considerada uma autêntica startup do mundo dos energéticos nacional: a Brasil Mate, pequena empresa de Florianópolis (a cidade parece ser um celeiro de marcas para o setor) fundada no ano passado por seis amigos formados em engenharia de automação pela Universidade Federal de Santa Catarina. Ela produz o Waker Energy Drink, feito a partir de guaraná misturado à erva-mate tradicional do Sul do país. E que não foi pensado para ser consumido em baladas, frisa o CEO da Brasil Mate, Francisco Bezerra: “Nossa bebida é para o público que se preocupa com uma vida saudável. Por isso tem pouquíssimas calorias. Queremos fornecer energia para que as pessoas cumpram com mais disposição as tarefas de seu dia a dia”. A empresa prevê atingir, em 2015, um faturamento de R$ 2,5 milhões. O design das garrafas do produto é simples, e suas cores são claras. “O uso de logomarcas ‘nervosas’, rotulagem predominantemente negra, em latas grandes e chamativas, afasta muitos consumidores”, adverte Bezerra.
Outra empresa brasileira (mas de muito maior porte) a atuar no setor é o Grupo Petrópolis. A companhia fluminense lançou em 2009 o TNT; atualmente, a bebida está presente em 22 estados brasileiros e também é vendida na Alemanha, Espanha e, curiosamente, no Iraque. “O mercado brasileiro tem muito potencial de crescimento”, afirma Eliana Cassandre, gerente de propaganda do Petrópolis. “O consumidor vai descobrir que um energético pode ser consumido em outras situações diárias, durante os estudos, o trabalho ou a malhação. E nisso o investimento em novos sabores terá papel fundamental”, diz ela. “O lançamento que fizemos do TNT Maçã Verde é um primeiro passo nesse rumo. Nos EUA, algumas marcas de energéticos vêm com dezenas de sabores.”
O Grupo Petrópolis, por sinal, fez com o TNT o mais ousado (e um dos mais caros) lances de marketing do setor brasileiro de energéticos: desde 2013 o produto é um dos patrocinadores da Scuderia Ferrari de Fórmula 1. A partir de um contrato de três anos, renovável por mais duas temporadas, a marca ganhou a divulgação gerada pela alta exposição mundial que a competição tem em todo o planeta. Embora a empresa não revele quanto está gastando para associar seu nome ao da Ferrari, estima-se que o Grupo Petrópolis deva estar pagando aos italianos perto de 5 milhões de euros/ano.
Outra gigante que atua por aqui como item é a Ambev. É dela o energético Fusion, lançado no início de 2011. “Esse mercado continua crescendo, com uma tendência forte para o uso de embalagens de consumo coletivo”, ressalta Jaqueline Barsi, gerente de marketing da bebida na empresa. “Por essa razão, acabamos de lançar uma embalagem premium do Fusion, com design inovador e que comporta 1 litro da bebida. Enxergamos também a oportunidade de aumentar as vendas do produto para faixas etárias mais elevadas, que se identificam com os benefícios que um energético pode trazer”, revela ela.
E eis aí uma segunda novidade observada por Nara em seu estudo: as bebidas energéticas, cada vez mais, estão sendo compradas por pessoas de meia-idade. “É importante ressaltar aos brasileiros que os energéticos não são somente para jovens e para serem consumidos em festas e baladas; as empresas precisam atrair um público mais amplo”, defende a pesquisadora da Mintel. Fora do Brasil, tal diversificação é bastante praticada: no Japão, por exemplo, há o Ukon No Chikara, um energético que atenua os efeitos gerados no organismo por uma bebedeira. Já nos EUA é vendido o Healthy Mama, bebida do tipo especialmente composta para gestantes e que combate enjoos. E na Polônia existe o Power Fresh, um energético que promete proteger os dentes e acabar com o mau hálito de seus consumidores.
A Globalbev, empresa mineira de bebidas que vende por aqui o Flying Horse, é mais uma grande player desse setor. “Flying Horse é uma marca alemã, e foi o primeiro energético a chegar ao Brasil, em 1996. Nessa época o produto era importado. A partir de 2004 assumimos a gestão da marca em território nacional e passamos a fabricar localmente e a distribuir a bebida. Já atuávamos nesse mercado; a Globalbev foi a primeira empresa a produzir energéticos no Brasil, com as marcas Extra Power e On Line, no ano 2000”, conta Renata Barreto, diretora de marketing da Globalbev.
“O setor nacional de energéticos cresce ano a ano com a chegada de novos consumidores, em especial vindos da classe C, que antigamente não tinha acesso ao produto por ser ele de alto valor agregado”, continua ela. “Recentemente, esse mercado vem sofrendo profundas mudanças no país, com a entrada das embalagens tipo PET. A partir daí, muitas empresas regionais que antes não entravam na disputa das bebidas energéticas lançaram seus produtos, e hoje existe uma guerra de preços no setor.” E Renata pontua: “O mercado brasileiro ainda está muito voltado à noite, diferente do americano, onde os consumidores bebem o produto também durante o dia. Já o mercado asiático é mais focado em energéticos tipo tônicos, sem gás e com embalagens de vidro”.
Nessa mesma linha, Silvia de Andrade, da Brasil Kirin, mostra-se otimista acerca do setor. “A partir do momento em que o energético for mais bem percebido como uma bebida de alto valor e que pode fazer parte da vida das pessoas a qualquer hora que elas precisem de mais energia, naturalmente a categoria passará a ser encarada com outros olhos, sendo mais bem compreendida. Esse dia está bem perto de chegar”, finaliza ela