O brasileiro tem, geralmente, simpatia de sobra e dentes de menos. São 16 milhões de cidadãos totalmente desdentados, o equivalente a 11% da população, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde divulgada recentemente pelo IBGE. Embora essa proporção tenha caído nos últimos anos, a questão ainda está longe de ser resolvida. Quem sofre desse mal tem baixa autoestima, por vergonha de sorrir e pela comunicação prejudicada, além dos problemas que desenvolve de mastigação e estômago.
Como negócio, no entanto, essa é uma oportunidade única, dado que o Brasil é o segundo maior mercado de implantes dentários do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Esse foi o ponto de partida que transformou o dentista paranaense Geninho Thomé, 63 anos, nascido na pequena Santa Helena, no oeste do estado, em um dos nomes mais surpreendentes da lista de bilionários de Forbes Brasil, um ranking habitado por grandes sobrenomes e ramos bem distantes da odontologia.
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Com uma fortuna estimada em R$ 1,23 bilhão, o mestre e doutor em implantodontia nasceu em uma família de agricultores com 12 filhos. Como décimo irmão e caçula entre os homens, foi carinhosamente batizado de Geninho. Desde criança, ele e seus irmãos foram incentivados a cuidar bem da saúde. Ainda muito jovem, mudou-se para a capital, Curitiba, já que uma de suas irmãs, Lourdes, que era religiosa vicentina e bioquímica no Hospital Nossa Senhora das Graças, entendia que era importante ter acesso a um ensino de melhor qualidade.
“Acredito que fui um pouco influenciado pela irmã Lourdes e por um amigo que já cursava a faculdade de odontologia.
E, também, pela vontade que eu tinha de contribuir para melhorar a qualidade de vida das pessoas por meio da saúde bucal”, recorda. Em 1979, formou-se em odontologia pela Universidade Federal de Santa Catarina e, posteriormente, especializou-se em periodontia e em implantodontia. Em 1990, nascia o embrião do negócio que viria a transformá-lo em uma referência no assunto. Thomé passou a desenvolver artesanalmente modelos de implantes em titânio para testes em cães.
Foi assim que, em 1993, a Neodent foi oficialmente registrada. Ele fundou a empresa com a ajuda da ex-mulher, a também dentista Clemilda de Paula Thomé, com o intuito de difundir a implantodontia no Brasil e torná-la mais acessível aos brasileiros. “A condição socioeconômica da época era desfavorável. Quando fundamos a Neodent, cada implante custava de R$ 500 a R$ 1 mil e era importado. Atualmente, graças a uma alta produção industrial, os implantes são vendidos por R$ 116, em média. Dessa forma, contribuímos para mudar essa realidade.”
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Thomé garante que jamais abriu mão da qualidade. “Sempre investimos em tecnologia, aprimoramento contínuo e em ensino, dando formação a muitos dos nossos clientes. Hoje, temos uma escola de pós-graduação e recebemos alunos de todas partes, difundindo a técnica no Brasil e no mundo”, conta. Foi assim, a partir da entrega de implantes dentários, soluções protéticas, orientações técnicas e instrumentais cirúrgicos ao mercado odontológico, que a Neodent se tornou líder da categoria no país.
Com sede em Curitiba, a companhia conta com 22 unidades no Brasil, quatro no exterior e vive um processo de expansão internacional. O começo foi de muita determinação. Nos primeiros três anos do projeto, o dentista revela que investia praticamente tudo que ganhava no negócio. Chegou também o difícil momento em que ele decidiu abandonar a clínica para se dedicar ao ensino, pesquisa e desenvolvimento em tempo integral, tornando-se um dentista que desenvolvia produtos para dentistas.
Ao longo dos 22 anos da Neodent, seu faturamento aumentou exponencialmente até a companhia transformar-se na quarta maior empresa do segmento no mundo e na líder do mercado de implantes dentários da América Latina. Com uma planta industrial em Curitiba, considerada uma das maiores e modernas do mundo, ela atua na concepção, desenvolvimento e fabricação de implantes e componentes protéticos, negócio que registrou um faturamento de cerca de R$ 258 milhões em 2014. A expectativa para este ano é vender por volta de 1 milhão de implantes.
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O negócio evoluiu tanto que chegou a atrair olhares internacionais. Foi assim que, em 2012, Thomé e Clemilda venderam 49% da empresa para a suíça Straumann, líder global em implantes dentários, dentística restauradora e regeneradora, com presença em mais de 70 países. O valor do negócio foi fechado por R$ 549 milhões. Em abril deste ano, os suíços arremataram os 51% restantes do negócio por R$ 680 milhões.
“Eu precisava consolidar a expansão internacional da Neodent e recebi muitas propostas de investidores que não agregariam tecnologia, pois não eram empresas do ramo. Depois de um longo e minucioso processo de análise, optamos pela Straumann, que certamente garantirá a posição de vanguarda da nossa marca no mercado”, diz Thomé.
Desfazer-se do negócio não foi fácil, embora o fundador continue como presidente científico e presidente do conselho de administração da Neodent. “Confesso que não foi uma decisão muito fácil. Não foi a venda de um bem material, mas de uma instituição composta por seres humanos, companheiros leais de muitos anos.” E acrescenta: “O longo processo de negociação e a reputação da Straumann contribuíram para que eu tivesse a certeza de que a venda foi a melhor opção”.
A vida, garante o dentista, não mudou muito após ele entrar para o seleto ranking de bilionários brasileiros. “Ainda trabalho bastante e a minha rotina não foi alterada substancialmente. Mas agora tenho mais tempo para me dedicar à família e aos outros negócios.” Thomé diz viver um momento especial ao lado da esposa, Fernanda, e de seu pequeno Geninho Filho, com poucos meses de vida. “Pretendo desfrutar ainda mais tempo na companhia deles, viajar bastante e me dedicar ao golfe e a algumas boas pescarias oceânicas.”
Aposentar-se não é uma possibilidade, uma vez que o empresário garante não imaginar sua vida sem trabalho. “Sou empreendedor por natureza e os novos desafios sempre me fascinaram.” Hoje, além de suas funções na Neodent, Thomé é sócio da Construtora e Incorporadora Pasqualotto & GT, especializada em edifícios de luxo na região de Balneário Camboriú, no litoral catarinense. A empresa investe R$ 200 milhões na aquisição de áreas estratégicas para lançamentos imobiliários nos próximos dez anos.
Dentre os empreendimentos em andamento, destaque para Yachthouse Residence Club, que leva a assinatura do renomado estúdio de design italiano Pininfarina e prevê a construção de duas torres de 78 andares, na Marina Tedesco, em Balneário Camboriú. “Serão os edifícios mais altos do Brasil”, garante. O projeto já é chamado na região de “O Jurerê Internacional dos Prédios”, em alusão ao badalado balneário de Florianópolis. Para se ter ideia, o jogador Neymar já assegurou seu apartamento lá.
Mas isso não é tudo. Há 11 anos, ele criou ainda a Neoortho, empresa que fabrica próteses ortopédicas e produtos para osteossíntese (procedimento cirúrgico para juntar fragmentos ósseos). Recentemente, a companhia inaugurou uma unidade fabril nos Estados Unidos, mais especificamente em Fort Myers (Flórida), para atender ao mercado externo. Com um portfólio de mais de 7 mil itens, o negócio vive uma fase de plena expansão, a partir de soluções que prometem facilitar as práticas médicas e dar mais segurança e bem-estar aos pacientes.
Geninho Thomé não para e nem quer.
“A única maneira de obter sucesso duradouro é por meio do trabalho árduo e ético, de muita dedicação e da qualificação permanente. Vale ressaltar que ninguém consegue quase nada sozinho. É indispensável ter o apoio da família, dos amigos e de colaboradores leais”, prega.