O Grand Prix de Mônaco da Fórmula 1 é um dos espetáculos mais impressionantes do esporte, mas talvez a sua maior conquista seja tudo aquilo que acontece antes de as luzes se apagarem.
Com menos de 2,5 quilômetros quadrados, Mônaco é menor do que o Central Park, em Nova York, e não apenas é o lar de 38 mil moradores, como atrai mais de 200 mil turistas durante a prova de F1, que transforma o local em uma pista de corrida. Receber um evento como esse em um espaço tão confinado com uma densidade populacional tão alta não é tarefa fácil.
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“É um desafio. Acredite em mim, é um desafio real, dado o aperto de nossas ruas e a falta de espaço que temos em Mônaco e nos arredores”, disse o príncipe Albert, governante do país, durante uma entrevista. Ele esteve imerso em corridas de automóveis toda a sua vida graças à decisão de sua família sobre o país, lar da corrida mais famosa da F1.
O Grand Prix, que passou a ser realizado no país em 1929, antecede a criação do próprio campeonato de Fórmula 1 em 21 anos. Organizado pelo Automóvel Clube de Mônaco (ACM), tem uma logística de impressionar. Seis semanas antes da corrida, realizada no final de maio, o ACM precisa lidar com 1,2 mil toneladas de materiais para a montagem das arquibancadas, 1 mil toneladas para as garagens do pit stop e 33 quilômetros de muros. Os materiais chegam por trens e mais de 500 trailers, e uma equipe de 50 engenheiros é escalada para instalar tudo. E isso é só o começo. “Tenho muito orgulho não só do Automobile Club, mas de todos os serviços governamentais que trabalham com ele”, diz o príncipe Albert.
Segundo a “ESPN”, o Automóvel Clube conta com um efetivo de 600 comissários, 500 seguranças, 400 voluntários e 40 médicos. Ao todo, a corrida envolve mais de 3 mil pessoas responsáveis por todo tipo de serviço estatal, de policiais e bombeiros a engenheiros civis, urbanistas e profissionais de limpeza. O ACM coordena essa multidão, cujo trabalho não termina quando a corrida começa.
A consequência de sediar uma prova realizada em um circuito de rua é que, quanto mais os caminhos estiverem bloqueados, maior será o incômodo para os moradores e empresas locais. Isso significa que o ACM tem apenas duas semanas para desmontar toda a infraestrutura. Além disso, depois de cada treino é preciso abrir as vias para permitir o tráfego normal de veículos e pedestres.
“Eu nunca tinha pensado em sediar uma prova como essa e optar por não abrir as ruas depois da corrida até conversar com o ministro de Singapura, em uma época em que ele estava pensando em realizar um Grand Prix por lá, e descobrir que era assim que ele estava pensando”, conta o príncipe. “Nunca me ocorreu que era um problema abrir as barreiras ao tráfego normal. Me parece uma operação muito simples, mas eu percebi que não era bem assim quando alguém no país asiático me disse que, por lá, essa era uma estratégia muito complicada, e que eles não podiam – e não queriam – fazer dessa maneira. Foi então que me dei conta de que não somos ruins nisso.”
E não foi a única vez. O príncipe Albert diz que, ao longo de todos esses anos, o ex-chefe da Fórmula 1, Bernie Ecclestone, e a Federação Internacional de Automobilismo (FIA) pediram numerosas extensões para a pista e que, apesar das restrições de espaço em Mônaco, a ACM nunca se recusou a implementá-las.
“Nunca dissemos à FIA, Bernie ou qualquer um dos oficiais da F1 que não poderíamos fazer alguma coisa quando eles nos aconselhavam a melhorar a pista”, diz Albert “Nossa resposta sempre foi que iríamos investigar e, felizmente, todas as mudanças propostas estavam ao nosso alcance.”
Albert lembra que houve uma nova configuração da pista no início da década de 1970 em volta da piscina e do porto, mudanças no chicane (desvio artificial do caminho) e ampliação da curta distância fora do túnel. “Tudo isso além do fato de termos reformado algumas vezes a pista inteira. Em um ano, fazíamos uma parte dela e, em outro, finalizávamos o trabalho. Fomos capazes de responder a cada um dos desafios. Tentamos manter, é claro, um nível de qualidade em tudo que estivesse dentro ou ao redor da pista para torná-la mais segura e flexível para a montagem e desmontagem.”
Mas a maior mudança poderia estar logo depois da esquina.
Há tanta falta de espaço em Mônaco que foi preciso expandir em direção ao mar. Um projeto de € 2 bilhões (US$ 2,3 bilhões) está em andamento para recuperar terras do Mediterrâneo e, até 2025, o país terá 6.100 metros quadrados a mais. Essa extensão ficará antes da entrada do famoso túnel, e o príncipe Albert diz que o trajeto poderia ser desviado para aproveitar o novo espaço.
“Sempre olhamos para novas possibilidades de extensão da pista e, neste momento, estamos trabalhando em uma ampliação da terra. Não há planos, nem nada acertado ainda, mas é algo que está na nossa cabeça – tanto do pessoal do Automóvel Clube quanto do governo. Não estou dizendo que isso acontecerá com certeza, mas, em algum momento, vamos nos juntar e pensar em como podemos não apenas melhorá-la, mas torná-la mais excitante, e – quem sabe? – até mudar um pouco o trajeto”, diz o príncipe, completando que o projeto da extensão inclui algumas áreas privadas e jardins, mas que pode haver espaço para acomodar pelos menos um pequeno prolongamento da pista.
Atualizar o circuito com frequência manteve Mônaco à frente, apesar de ser um dos locais mais antigos de todo o campeonato. O príncipe Albert diz que não pode nem imaginar o país fora do calendário da F1.
“É uma parte da história do esporte, e eu não consigo pensar em uma temporada de Fórmula 1 sem o Grand Prix de Mônaco”, diz. “Todos os nossos parceiros da F1 dizem que este é um local onde eles não pensam duas vezes antes de trazer seus clientes. Isso deve significar alguma coisa. As pessoas enxergam essa experiência como algo exclusivo.”
E que traz retornos significativos. O Príncipe Albert diz que o Grand Prix ainda é o evento mais importante de Mônaco, com um grande impacto para a população, não apenas em termos econômicos. “É um excelente veículo promocional para Mônaco”, explica. “Pela minha experiência pessoal – e eu tenho ouvido isso de vários amigos – não é todo mundo que sabe onde Mônaco fica. Mas, quando o Grand Prix ou o nome da minha mãe são mencionados, as pessoas mostram que conhecem as referências”, diz o filho da falecida atriz de Hollywood Grace Kelly.
E continua: “Eu não tenho a chance de fazer isso muitas ultimamente, mas eu amava acordar cedo e observar os carros entrando nos boxes, a configuração de tudo aquilo, a tensão aumentando, lentamente mas com segurança. É tudo excitação e tensão, aquele tipo de atmosfera que envolve algo importante prestes a acontecer. É possível sentir o pulso. E não é preciso estar nos boxes para perceber isso.”
Não há como esconder o amor do Príncipe Albert pelas corridas, algo que não acontece apenas por causa do seu papel como chefe de Mônaco. Torna-se óbvio que ele é mais do que apenas um fã casual quando vemos como ele se divertiu em cada uma das corridas que aconteceram por lá ao longo da história. Sua maior dificuldade é escolher o seu Grand Prix favorito. “Eu teria que nomear vários. Não posso deixar de mencionar pelo menos uma das vitórias de Graham Hill, nos velhos tempos, uma das três vitórias de Jackie Stewart e, como não falar de Ayrton Senna, Alain Prost e Michael Schumacher?”, pergunta.
“Infelizmente, eu não estava em Mônaco para o Grand Prix de 1970, quando Jack Brabham perdeu a corrida na última curva. Eu assisti à corrida, mas eu estava fora. Mas me lembro do final da prova de 1982, quando Patrese venceu, mas a liderança mudou de mãos três vezes na última volta, com vários incidentes. Um final dramático como esse fica na memória das pessoas.”
Momentos assim ajudaram a manter o Grand Prix de Mônaco na pole position e, com um apaixonado pela Fórmula 1 como Príncipe Albert no comando, o país certamente está no caminho certo para continuar fazendo história no esporte.