“Estudei numa das melhores escolas de marketing do mundo.” Arrogância? Pelo contrário. Dimitrius Rogério de Oliveira, 45 anos, presidente da Atento no Brasil, está se referindo ao período da infância no qual ajudou o pai a vender frutas em uma feira livre na periferia de São Paulo. Aos 9 anos de idade, aprendeu que conquistar o cliente é uma arte que exige esforço, técnica e criatividade.
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Esses valiosos ensinamentos o levariam, em junho deste ano, ao comando de uma das maiores empresas do Brasil em número de funcionários diretos (85 mil). Especializada em customer experience management (é líder do segmento no país, com 28% de market share e faturamento de R$ 3,4 bilhões em 2017), a companhia registrou no ano passado impressionantes 2 bilhões de interações (por voz humana, bots e outras ferramentas) com os clientes das empresas que contratam seus serviços.
Dimitrius nos recebe em uma sala envidraçada com uma inspiradora vista para a zona sul paulistana (o amplo edifício de oito andares é todo ocupado pela empresa, assim como vários outros iguais a esse espalhados pelo país – em maior ou menor escala, a Atento está presente em 900 cidades brasileiras). Conta que esta é sua segunda passagem pela Atento, que nasceu em 1999 para atender às demandas da então recém-chegada Telefônica ao Brasil – a telecom espanhola precisava se comunicar com uma nova legião de usuários com toneladas de dúvidas, pedidos e reclamações, e não havia no Brasil nenhuma prestadora com o porte necessário para dar conta do desafio. (Essa relação umbilical perdurou até 2012, quando a Bain Capital comprou 100% do negócio; em 2014, um IPO pulverizou 35% das ações na Bolsa de Nova York.)
Engenheiro eletricista com MBA em marketing (desta vez na ESPM) e cursos de especialização focados em liderança (em São Paulo) e experiência do cliente (em Harvard), Dimitrius calcula que 20 dos seus 31 anos de “carteira assinada” foram dedicados à tecnologia. “Meu sonho era focar a carreira na área técnica, mas descobri que as coisas mais interessantes costumam acontecer lá fora, principalmente numa multinacional”, descreve. Então uniu o agradável (como desenvolvimento de softwares) ao útil (relacionamento com clientes). “Nossa equipe era responsável por toda a gestão de projetos de relacionamento com clientes, da customização à manutenção das plataformas, e também pelo marketing e pelas vendas de consultoria, de serviços, de soluções, de hardwares e softwares.” No extremo dessa cadeia fica o usuário das empresas que contratam os serviços da Atento.
“Há dois anos, fui convidado por amigos empreendedores para tocar um negócio que eles criaram, uma empresa nacional comprada por um fundo estrangeiro. Eles estavam adquirindo algumas empresas e me chamaram para ajudar a fazer a integração delas, com foco em automação, transformação digital, autoatendimento. Aceitei o desafio.” No primeiro semestre de 2018, recebeu outra proposta tentadora: voltar ao “antigo” endereço, mas agora responsável por toda a operação no Brasil e com a missão de atuar decisivamente no que chama de “modelo de transformação” da companhia.
A Telefônica segue sendo o principal cliente da Atento no Brasil, mas a ela se juntaram todos os grandes bancos e outros 130 clientes de vários setores, especialmente saúde, varejo e administração pública. “Nosso foco continua sendo olhar a cadeia de relação do consumidor com cada uma dessas marcas, cada uma com suas peculiaridades e necessidades”, diz o CEO. A diferença é que, cada vez mais, tecnologias como inteligência artificial e machine learning estão sendo incorporadas nesse diálogo.
Qualquer que seja o produto ou serviço, analisa o executivo, o consumidor está mudando seu modo de interação – cada vez mais, a tendência é resolver tudo rapidamente, em qualquer hora e lugar, de preferência pelo celular. Nesse cenário, um robô pode ser mais eficiente. “Essas novas tecnologias vão nos permitir entender melhor as necessidades de cada um e acelerar o processo de migração de um canal de voz humana para um não voz que seja mais rápido e eficiente.”
No meio de tantas ligações para os contact centers, algumas histórias curiosas ficaram famosas nos corredores da empresaMotivo de pânico para seus 60 mil colaboradores envolvidos na atividade de contact center? Dimitrius garante que não. “Mais da metade das interações ainda é feita por voz humana. A voz por bot é usada para contatos mais simples, de menor complexidade. E principalmente para o serviço ativo, quando nós é que contatamos o cliente.” Mas uma mudança na configuração do quadro de funcionários em um futuro não muito distante será inevitável – e mesmo desejável. O executivo garante, no entanto, que a principal mudança será na qualidade (e nem tanto na quantidade) dos colaboradores. “Contatos mais complexos, mais personalizados, continuarão sendo feitos por pessoas mais capacitadas. Os próprios clientes preferem assim.”
Na busca por máquinas mais inteligentes e outros avanços do tipo, são investidos de 4% a 5% dos R$ 3,4 bilhões citados no início desta reportagem. “Mas não nos preocupamos, por exemplo, em desenvolver o ‘motor’ de uma inteligência artificial – já tem um monte de gente fazendo isso (Google, IBM…). O que fazemos é construir a base que vai ajudar esse motor a se comportar da forma que a gente quer, de acordo com cada um dos nossos clientes.”
E no meio daqueles 2 bilhões de interações também já citados, alguns casos ficaram famosos nos corredores da Atento. “Tinha o cliente de um banco que ligava todo dia para falar com a mesma atendente. Mas imagine, com tanta gente, quase nunca a ligação caía com ela. Então ele desligava e ligava de novo, e de novo e de novo, até que calhasse de ela atender”, diverte-se Dimitrius. “Outro ligava de madrugada e ficava interagindo com a voz – só que era uma voz de robô, um atendimento eletrônico. Ele era apaixonado por um robô!”
Aproveitando o momento de bom humor, pergunto: “E onde seus pais se inspiraram para escolher seu nome?” Sempre sorrindo, ele responde: “Foi ideia do meu pai. Ele não teve muito acesso à escola, mas é muito curioso, um sábio. Gosta de ler sobre mitologia. Quando era jovem, ele topou com esse nome em um livro e achou bonito. Para mim foi um sofrimento, enfrentei bullying na infância. Mas hoje gosto.”