Entrou em vigor hoje (6) mais uma redução do preço médio da gasolina (4,3%) e do diesel (4,4%) nas refinarias, por determinação da Petrobras.
O novo ajuste nos preços é atribuído à baixa nas cotações internacionais do petróleo. Desde o início do ano, a commodity teve uma desvalorização perto de 17% (WTI e Brent), devido aos temores de queda na demanda pela propagação do coronavírus no mundo.
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Trata-se da quarta vez em que a Petrobras corta os preços neste ano. Na semana passada, a estatal havia informado redução de 3% no diesel e na gasolina.
Mas o repasse dos ajustes de preço nas refinarias para o consumidor final nos postos, no entanto, não é imediato e depende de fatores como consumo de estoques, impostos, margens de distribuição e revenda e mistura de biocombustíveis.
O tema tem sido uma preocupação do presidente Jair Bolsonaro, que sofre pressão de caminhoneiros, um importante grupo de seu eleitorado. Ontem, ele desafiou governadores a abrirem mão da alíquota do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre os combustíveis.
“Eu zero o federal se eles zerarem o ICMS. Está feito o desafio aqui, agora. Eu zero o federal hoje, eles zeram o ICMS. Se topar, eu aceito”, afirmou o presidente aos jornalistas ao sair do Palácio da Alvorada.
Alguns governadores se manifestaram com indignação sobre a declaração. João Doria (PSDB), governador de São Paulo, afirmou que o presidente não trata o assunto com responsabilidade, mas sim com “bravatas”, e disse que deveria haver um entendimento, além de afirmar que o presidente jamais convidou os governantes para discutir o tema.
“Se o presidente está tão entusiasmado, tão motivado, ele que faça o primeiro gesto, elimine os impostos sobre os combustíveis, e aí sim os governadores vão avaliar o tema do ICMS”, afirmou Doria a jornalistas.
A arrecadação do governo federal com PIS/Cofins e Cide sobre combustíveis chegou a um total de R$ 27,402 bilhões em 2019, fonte de receita que a União renunciaria caso zerasse esses impostos. Foram R$ 24,604 bilhões arrecadados somente com PIS/Cofins e R$ 2,798 bilhões com a Cide, em dado corrigido pela inflação.
Segundo especialistas, uma eventual perda desta arrecadação seria prejudicial ao país do ponto de vista fiscal, uma vez que a economia ainda se recupera de maneira lenta e o governo registra seguidos déficits primários, ou seja, resultados negativos de receitas e despesas. Em 2019, as contas do governo central acumularam rombo de R$ 95 bilhões.
Já o ICMS é o responsável pela maior parte da arrecadação dos Estados. Embora o balanço da arrecadação do imposto em 2019 ainda não esteja fechado, as secretarias estaduais da Fazenda apontam em cerca de 20% o peso dos combustíveis nesta arrecadação.
Para o bolso do consumidor, segundo levantamento da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e Lubrificantes (Fecombustíveis), o ICMS representa de 25% a 34% do valor cobrado pelo litro da gasolina nas bombas dos postos. O PIS/Cofins tem um valor fixo de R$ 0,7925 por litro, e a Cide custa R$ 0,1 por litro.
“Não é possível conceder benefícios fiscais sem estudo. Toda vez que isso ocorre em algum setor, o Estado acaba tributando mais outros setores”, explica André Felix Ricotta de Oliveira, presidente da comissão de Direito Tributário da OAB – Pinheiros. “Além disso, toda vez que um governante abre mão de receitas sem fundamentação, pode ter que responder pela Lei de Responsabilidade Fiscal”, completa.
Oliveira faz menção à lei promulgada em 2000 com o intuito de disciplinar a utilização dos recursos públicos para que Estados, municípios e a União controlem gastos e respeitem a capacidade de arrecadação por meio dos tributos.
Na opinião de Marcel Solimeo, economista da Associação Comercial de São Paulo, o presidente tenta mostrar para a população que a responsabilidade pelo preço alto do combustível não é só do governo federal.
“Na verdade, as alíquotas do ICMS sobre o combustível, na maioria dos Estados, são muito altas. Mas, para o próprio governo federal, a arrecadação sobre combustíveis também é elevada. Nem o governo federal, nem os estados têm condições financeiras de zerar algo neste momento. É mais uma forma de tentar dividir o ônus”, afirma.
Solimeo destaca ainda que combustíveis e energia são os itens que mais pesam na arrecadação da maioria dos Estados. “Não só as alíquotas são altas, como não há dificuldade para esta cobrança por se tratarem de itens essenciais.”
Para o economista, o ideal seria reduzir gradativamente as alíquotas e, antes disso, cortar gastos públicos. “Eles têm de trabalhar na outra parte. Se não cortar gastos, tudo isso é utopia. Se reduzir imposto e não cortar gasto, isso vai virar inflação, dívida ou calote”, afirma Solimeo.
Outra preocupação de participantes do mercado em relação ao desgaste entre o Planalto e Estados é para a aprovação das reformas esperadas para 2020.
Em uma análise feita com exclusividade à Forbes, a RB Capital lembrou que ainda são recentes os problemas do governo na articulação política, como em 2019, ao tratar de assuntos importantes como a Reforma da Previdência.“Isso teve um custo, a tramitação atrasou. O resultado foi uma demora maior para aprovar uma reforma importante em um país em recuperação econômica, mesmo que lenta e gradual.”
Segundo a RB Capital, o recado que fica para o mercado é que a relação entre o Planalto e os governadores está se desgastando às vésperas do início da tramitação no Congresso de duas reformas importantes para o país: a tributária e a administrativa.
“Com a maioria dos Estados em crise fiscal, dificilmente veremos os governadores abrindo mão de uma receita importante. A dependência dos combustíveis supera 30% da arrecadação de alguns deles. Ou mesmo a equipe econômica do governo, que teve uma arrecadação relevante com os impostos sobre combustíveis, em um cenário no qual as contas públicas seguem longe de apresentar um superávit fiscal”, ressalta a RB Capital.
Luiz Carvalho, analista de petróleo e gás e responsável pelo time de equity research do UBS Brasil, chama a atenção para o impacto técnico de uma eventual renúncia total às alíquotas sobre combustíveis. “Se isso acontecesse, a gente estaria criando um incentivo muito grande ao consumo de combustíveis fósseis e, do ponto de vista ambiental, isso não faz muito sentido.”
Carvalho diz que o ideal seriam alíquotas de impostos condizentes com a realidade. “Não pode o Rio de Janeiro cobrar 30% de ICMS em cima do combustível e ter outro Estado cobrando 15%. Por que o Rio de Janeiro pode cobrar muito mais, e o carioca pagar um combustível muito mais caro? Está previsto na Constituição Federal que os Estados tenham autonomia em relação à aplicação de impostos estaduais, mas isso é contraproducente para o país”, explica.
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