Ao refletir sobre o tumultuado ano de 2020, pode-se ter certeza que muitos acontecimentos do ano passado terão impactos duradouros pelos próximos anos em muitos setores, inclusive os de privacidade, segurança e proteção de dados.
Veja as cinco questões mais impactantes relacionadas à privacidade para ficar de olho neste ano:
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Flexibilidade legal
É uma percepção comum de que regimes autoritários fizeram mais do que os libertários no durante a pandemia, por terem maior controle sob seus cidadãos. De qualquer forma, por uma questão de necessidade, um maior controle sobre cidadãos por parte dos estados tornou-se um fenômeno global, frente aos lockdowns, testagens e monitoramento de contatos.
No início da pandemia, havia uma grande onda de incerteza no Reino Unido e na Europa sobre como seria o equilíbrio entre direitos individuais e interesses sociais e os sistemas regulatórios de proteção de dados que foram adotados (e defendidos). A expansão do Estado ao espaço privado foi uma surpresa, mas não foi algo equivocado.
Enquanto ainda estamos no meio da pandemia e as vacinas ainda são incertas, talvez ainda seja cedo para julgar se vivenciamos uma redefinição permanente da relação entre estado e cidadão. Mas temos certeza de uma coisa: privacidade, proteção de dados e outros direitos fundamentais vão continuar na mira do interesse público de saúde e existe grande flexibilidade na lei para que isso ocorra muito rapidamente. Antes da pandemia, essa situação era entendida como ameaça nacional para a segurança pública, mas não para a saúde pública.
Outra lição da pandemia foi o fato de especialistas em privacidade firmarem parcerias com a indústria da tecnologia para minimizar riscos de privacidade pelo desenvolvimento de uma abordagem descentralizada de contatar aplicativos de monitoramento. Isso prova que a abordagem de responsabilidade de privacidade para desenvolvimento tecnológico é totalmente tangível e quando há os incentivos certo, deve ser repetida.
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Globalização: acontecimentos inesperados
Durante o verão, o Tribunal de Justiça da União Europeia dissolveu o Escudo de Proteção da Privacidade UE-EUA, declarando-o inválido em lei por não oferecer proteção suficiente nos Estados Unidos para dados pessoais vindos da União Europeia. O julgamento confirmou que pode existir um longo caminho entre uma questão de privacidade e suas consequências jurídicas, levando em conta que os problemas estruturais eram como uma vigilância em massa, como foi revelado por Edward Snowden em 2013. Também ressaltou uma tensão entre os interesses do mundo real da globalização, ou seja, a necessidade de mover dados pessoais pelo mundo, e os ideais locais de parte dele, como os conceitos da UE de proteção de dados consagrados na legislação. Esta tensão é uma questão central na UE, que é representada pela Comissão Europeia e pelo Conselho, com uma postura “realpolitik”, e pelo Tribunal de Justiça, que é limitado pelo quadro legislativo.
Há uma pequena margem de manobra entre esses pilares, porque o Tribunal de Justiça se recusou a eliminar uma medida alternativa para mover dados da UE para os Estados Unidos, nas chamadas “Cláusulas Contratuais Padrão”. Enquanto esta opção ainda for válida, podemos ter certeza de que a visão pragmática do mundo continuará em crescimento, mantendo a globalização viva, a qual provavelmente será representada por reguladores nacionais e tribunais que farão de tudo para evitar barreiras comerciais.
As chances do Reino Unido conseguir uma decisão de adequação
O clímax das negociações do acordo comercial do Brexit entre o Reino Unido e a União Europeia foi como uma novela em seus dias finais. As partes concorrentes trabalharam duro para chegar ao resultado inevitável do compromisso e mantiveram a impressão de uma vilania exagerada. O acordo comercial repetiu a abordagem de transferências internacionais que se seguiram após o julgamento do Escudo de Proteção da Privacidade, com a “realpolitik” vencendo e a globalização tendo continuado em funcionamento. O acordo comercial prevê uma decisão de adequação temporária ao Reino Unido pelos próximos seis meses, com ambas as partes comprometidas em tornar a situação permanente. A União Europeia terá dificuldade em reverter essa situação.
Possíveis conflitos entre o comprometimento do Reino Unido em relação ao modo de proteção de dados da União Europeia continuam incertos. Sempre existirão ativistas de privacidade com motivação suficiente para buscar ações legais para infrações, mas com as transferências da UE aos Estados Unidos, essa é uma boa aposta de que o consenso continuará favorável a essa transações de dados.
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Regime de sanções financeiras entrando no ritmo
O GDPR não atendeu às expectativas de multas regulatórias em larga escala de até 4% do faturamento anual mundial, mas isso nunca foi uma ocorrência comum. Ainda assim, parece existir um ritmo após a imposição de uma série de multas pesadas no último trimestre de 2020 (a Suécia impôs uma multa de SEK 30 milhões em dezembro; a Itália, de € 12,25 milhões em novembro; a Alemanha, de € 34 milhões e multas de £ 20 milhões e £ 18 milhões no Reino Unido em outubro), mas nenhuma superou aquela imposta na França em 2019.
As multas parecem proporcionar um sistema que é bom o suficiente para permitir que os reguladores publiquem estatísticas confiáveis sobre resultados, ao mesmo tempo que recolhe manchetes positivas, mas que representam ameaça para a maioria das organizações que violam a lei. Ao longo do ano, veremos multas na faixa de € / £ 15-35 milhões, mas a maioria ficará abaixo de € / £ 1 milhão, o que significa que o conflito em relação ao quantum das multas não será comum.
Reconhecimento facial automatizado como aumento de algoritmos de consciência
No início de 2020, acontecimentos no setor de reconhecimento facial automatizado desencadearam preocupação em relação à privacidade e igualdade e existiram rumores sobre o banimento da tecnologia. O litígio no Reino Unido em 2020 teve potencial de apontar esse resultado e mesmo com a decisão do Tribunal de declarar ilegal o julgamento da tecnologia por uma força policial, uma porta sobre assunto ainda foi deixada aberta.
Isso aconteceu porque a ilegalidade do julgamento resultou na frouxidão da política e na estrutura de avaliação de risco que se aplicava a ela, ao invés de uma fraqueza fundamental dentro da base jurídica que a sustenta. Os problemas no julgamento são aqueles que podem ser remediados no futuro.
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Os sinais do litígio estão sendo captados e oferecem equilíbrio aos pedidos de proibições. A tecnologia veio para ficar. No entanto, se o movimento em relação à privacidade continuar, talvez possamos ter a esperança de que mais preocupações a respeito serão abordadas com o tempo.
Há espaço para isso, já que um subproduto inesperado da pandemia no Reino Unido foi a “percepção do algoritmo“. O Reino Unido teve de cancelar exames de abandono escolar do verão passado devido às medidas de lockdown, e utilizou dados obtidos por um novo algoritmo. As percepções sobre a injustiça do algoritmo levaram a protestos generalizados e a uma inversão da política governamental. Este episódio impulsionou o conceito de algoritmo e tomada de decisão automatizada para a consciência de massa, onde permanecerá com consequências para o futuro das tecnologias.
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