Considerado uma das principais vozes em educação online no mundo, o empreendedor Salman Khan quer avançar o debate sobre tecnologia como forma de democratizar a educação durante e depois da pandemia do novo coronavírus.
O norte-americano de 44 anos é o líder da organização sem fins lucrativos Khan Academy, maior escola virtual do mundo com uma base global de mais de 100 milhões de alunos, com conteúdo gratuito para as disciplinas de matemática, ciências e português, além de cursos livres com parceiros como Disney e Pixar. A Khan está no Brasil desde 2013, atuando por meio de parcerias com Secretarias de Educação e tem mais de 4,3 milhões de usuários no país.
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Khan deixou sua vida anterior em que era gestor de hedge funds em 2009 para fundar a organização que leva seu nome, depois de experiências bem sucedidas em ajudar seus primos com o dever de casa de matemática com vídeos no YouTube. Os vídeos com linguagem simples e didática atraíram a atenção de milhares de usuários no mundo todo. O empreendedor, que sempre quis fazer a diferença, percebeu que poderia ajudar a resolver um dos grandes problemas da humanidade.
“Quando investigamos as causas de problemas como desigualdade socioeconômica ou de gênero, na maioria das vezes isso se deve ao fato de que as pessoas não estão atingindo seu potencial na vida – e a educação é o grande amplificador para o potencial humano”, diz Khan, em entrevista à Forbes.
O problema da exclusão digital
Apesar de sua organização ter tido um aumento no número de usuários de quase 300% em acessos desde o início da pandemia, Khan diz preferir a educação presencial de qualidade ao ensino remoto. Refletindo sobre os desafios da crise sanitária, o empreendedor descreve a situação atual, de educação totalmente à distância, como algo longe do ideal para a maioria dos estudantes.
“Muita coisa que acontece na escola não ocorre virtualmente”, observa Khan. “São aprendizados implícitos ao currículo, como colaboração em equipe, formação de vínculos, como lidar com conflito e adversidades, além da possibilidade de ter conversas não planejadas, ler as expressões faciais. Isso tudo importa muito.”
Por outro lado, existem as competências essenciais aprendidas na escola, como aperfeiçoamento da capacidade de interpretação de texto ou operações matemáticas básicas. Segundo Khan, estas podem ser aprendidas online, mas é preciso engajamento por parte dos alunos.
“Temos visto professores fazendo coisas muito interessantes no Google Meet ou Zoom para tornar a experiência com os alunos o mais interativa possível. O lado negativo é quando isso não ocorre”, aponta Khan, referindo-se à aulas em que o professor expõe conteúdos online por longos períodos de tempo em aulas assíncronas, sem a participação dos alunos.
Existem outras nuances que podem tornar o aprendizado online ainda mais complexo. Segundo Khan, a atual conjuntura na educação à distância imposta pela Covid-19 criou uma dicotomia: enquanto crianças mais abastadas têm uma experiência que deixa a desejar, mas ainda assim conseguem seguir estudando, a realidade não é a mesma entre estudantes na base da pirâmide.
“Existem muitas comunidades de baixa renda que não têm acesso a computadores ou à internet. O abismo digital é um grande problema, que faz com que estudantes de baixa renda não consigam se engajar [nas aulas online]”, ressalta o empreendedor. “Isso vai afetar uma boa parte das crianças em idade escolar, e muitas já estão ficando para trás.”
No entanto, Khan aponta para uma possível mudança no horizonte. “Nunca vi tanta energia sendo direcionada para a resolução do problema de conectividade quanto estamos vendo agora. Espero que, por causa da Covid, governos, organizações sociais e corporações façam um real esforço conjunto para preencher esta lacuna.”
O futuro da educação
Apesar dos atuais percalços relacionados ao ensino online, Khan acredita que a resposta para atravessar a pandemia e depois da crise ter sido superada é a educação híbrida. “A combinação dos modelos online e presencial será muito poderosa pós-Covid. Crianças que ficam doentes podem continuar a acompanhar as aulas, ter acesso a ensino que, fisicamente, seria inviável.”
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“A noção de ensino não deveria ser restrita ao espaço e tempo. O que importa é o domínio do assunto em questão”, aponta Khan, que acredita que o sistema tradicional de ensino expõe informação demais a estudantes, que acabam aprendendo muito pouco.
A personalização do ensino online através de ferramentas como análise de dados e machine learning proposta pela Khan Academy é apresentada pelo especialista uma das formas de reinventar a educação. “Ao personalizar a experiência de aprendizagem, cada estudante pode progredir de acordo com seu tempo e ritmo, e identificar as lacunas à medida em que surgem.”
Ainda sobre as possibilidades oferecidas pelas tecnologias para avançar o ensino online, Khan prevê que algoritmos deverão ajudar no engajamento de alunos. Além disso, o empreendedor menciona outras áreas de oportunidade habilitadas por tecnologia, como grupos online de estudo.
“Penso em como conectar o ensino online com reais oportunidades: por exemplo, se um jovem domina certa área por ter ensinado outras pessoas, isso demonstra que a pessoa tem empatia e boas habilidades de comunicação”, aponta Khan. “Imagino que tanto universidades quanto empresas irão se interessar por isso.”
“A fronteira em que se permite que pessoas aprendam, e então retribuam ensinando outras, é muito interessante. A habilidade de ensinar se torna a credencial mais valiosa, mais até do que um diploma de ensino médio, ou universitário”, aponta.
Com esta visão em mente e o lifelong learning (aprendizado constante ao longo da vida) em alta, Khan prevê que mudanças ainda mais profundas em educação devem acontecer na próxima década:
“Teremos caminhos alternativos que poderão ser trilhados em paralelo à universidade, ou no lugar dela. As pessoas poderão experimentar, aprender o que precisam e retornar para o mercado de trabalho, além de ter várias formas de demonstrar para empregadores que estão prontas.”
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