Enquanto o sistema público de saúde brasileiro sofre em muitas regiões ao enfrentar uma das piores epidemias de coronavírus do mundo, o setor privado está em meio a um inédito boom de negócios.
A corrida para consolidação de redes de hospitais a operadoras de plano de saúde, que está ocorrendo em meio à pandemia, reflete a expectativa de uma demanda ainda maior por serviços de saúde com o envelhecimento da população.
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Nos últimos meses, o setor teve o anúncio da maior fusão do país e um IPO que foi o maior em sete anos. Investidores interessados no segmento vão desde o fundo de private equity americano Carlyle Group Inc a fundos de venture capital e o magnata da construção civil Elie Horn, fundador da Cyrela.
“A população brasileira está envelhecendo rapidamente, o que significa um forte crescimento da demanda por serviços de saúde”, afirma o diretor executivo do Morgan Stanley, Cezar de Faria. “Considerando as restrições orçamentárias, é muito pouco provável que o governo consiga suprir essa demanda.”
Em 2060, a população brasileira acima de 65 anos representará 25,5% do total, acima dos 10% de hoje.
Investidores e executivos de bancos também dizem que há muito espaço para aumentar a eficiência de hospitais privados.
A operadora de hospitais Rede D’Or São Luiz SA fez o maior IPO dos últimos sete anos em dezembro, e as empresas de plano de saúde Hapvida SA e Notre Dame Intermedica SA discutem a criação de uma companhia que pode ter valor de mercado acima de R$ 100 bilhões.
O fundo de private equity brasileiro IG4 criou uma companhia só para cuidar da área de infraestrutura dos hospitais, do estacionamento às instalações, enxergando potencial de grandes mudanças no país.
Depois de vários negócios, a OPY Health, empresa do IG4, agora está fazendo uma colocação privada de ações de no mínimo 600 milhões de reais, com o objetivo de financiar a compra de mais seis hospitais, segundo uma fonte com conhecimento do assunto.
Os dois grandes negócios e a onda de compras planejada pela OPY mostra como a efervescência de fusões e aquisições e transações de mercado de capitais estão transformando o fragmentado setor de saúde privado brasileiro, que movimenta anualmente R$ 197 bilhões.
A pandemia não está entre as razões para a efervescência dos negócios entre empresas de saúde, mas indiretamente ajuda a aumentar os investimentos privados no sistema público.
Em Manaus, com o sistema em colapso devido à pandemia, um dos hospitais com menor mortalidade e menores problemas no suprimento de oxigênio foi o Delphina Aziz, cuja estrutura é de propriedade da OPY Health (o hospital atende exclusivamente ao SUS). Entre os seis hospitais que a OPY pretende adquirir, um é de atendimento público.
Mais de 9,8 milhões de brasileiros já foram infectados pelo vírus, com mais de 239 mil mortes até domingo.
A regulação brasileira também é irregular, impondo limites de preços apenas nos planos de saúde individuais e não nos de empresas, e isso contribui para as altas margens no setor.
SINAIS VITAIS
As ações da Rede D’Or, cujo IPO em dezembro abriu a temporada de grandes negócios no setor de saúde, estão sendo negociadas hoje a 68 vezes seu Ebitda, medida de lucro operacional, muito acima do múltiplo de nove vezes Ebitda da rede de hospitais americana HCA Healthcare Inc, que é muito maior que a Rede D´Or.
Hapvida e Intermedica também estão sendo negociadas a quase 30 vezes Ebitda.
Os altos preços comparativos das empresas brasileiras, entretanto, não assustam os investidores. O Carlyle e o investidor estatal de Singapura GIC praticamente não venderam participações na Rede D´Or no IPO, esperando que a valorização continue.
“O boom do setor de saúde está só começando”, diz Hans Lin, co-chefe da área de banco de investimento do Bank of America no Brasil. Ofertas de ações e rodadas de financiamento privado devem ajudar a impulsionar fusões e aquisições, afirma.
O setor ainda é fragmentado: os cinco maiores provedores de planos de saúde têm juntos apenas 33% do mercado, comparado com 68% nos Estados Unidos, segundo o Morgan Stanley.
Além dos negócios entre hospitais gerais, analistas veem também movimentos de consolidação em negócios especializados como clínicas de oncologia e hospitais oftalmológicos.
Algumas startups estão baseando seu modelo de negócio em reduzir a inflação médica, que chegou a 11,5% no ano passado, mais que o dobro da inflação geral, segundo a consultoria Mercer Marsh.
A startup de exames diagnósticos Labi, por exemplo, está levantando recursos numa série B e explora o nicho de exames de sangue e vacinas a 10% do custo das marcas mais premium, como o Fleury SA.
BOM PROGNÓSTICO
Ao menos oito empresas brasileiras de saúde estão planejando IPOs este ano, como as redes de hospitais Care, Mater Dei e Kora Saúde, que pretendem seguir o exemplo da Rede D’Or.
Também haverá IPOs de empresas farmacêuticas, como o Teuto, que pretende levantar no mínimo R$ 1 bilhão, e a fabricante de suprimentos médicos Viveo, que espera levantar R$ 1,5 bilhão.
As startups do segmento também estão levantando mais recursos. A Conexa, provedora de serviços de telemedicina, recebeu investimentos do fundo General Atlantic e está buscando uma nova rodada de investimentos de R$ 100 milhões para expansão orgânica e aquisições. Durante a pandemia, a demanda por consultas a distância disparou, e o número de atendimentos da Conexa pulou de 50 para 15 mil ao dia.
“Os conselhos de medicina autorizaram serviços previamente proibidos por causa da Covid, e isso acabou fortalecendo muito nosso negócio”, diz Guilherme Weigert, CEO da Conexa. (Com Reuters)
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